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Othaniel Alcântara
Othaniel Alcântara

Othaniel Alcântara é professor de Música da Universidade Federal de Goiás (UFG) e pesquisador integrado ao CESEM (Centro de Estudos de Sociologia e Estética Musical), vinculado à Universidade Nova de Lisboa. othaniel.alcantara@gmail.com / othaniel.alcantara@gmail.com

Música clássica

Políticas culturais

Uma reflexão sobre os direitos culturais | 23.10.14 - 22:01
 
 
Goiânia - Os Direitos Culturais encontram-se devidamente normatizados na Constituição Federal de 1988. De acordo com o artigo 215 é de competência do Estado (entenda-se aqui: União, Estados, Distrito Federal e Municípios) garantir a todos os cidadãos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes de cultura nacional.  Para tanto, o Estado deve apoiar e incentivar a valorização e a difusão das diversas manifestações culturais. Neste texto, vou priorizar o debate sobre as políticas públicas federais.
 
Parece que morosidade no processo de regulamentação dos direitos culturais, previstos na Constituição, provocou certa descrença por parte da sociedade civil. E, para piorar, a atual lei federal de incentivo à cultura, a Lei Rouanet promulgada em 1991, sempre foi duramente criticada pelas distorções em sua interpretação como a falta de transparência no processo de escolha dos projetos, a concentração de recursos nas regiões Sul e Sudeste, além da equivocada ideia de que a produção cultural resume-se ao entretenimento.
 
Nesse diapasão, jogando com as regras em vigor, as grandes empresas utilizam-se do mecenato como forma de promoção, associando suas marcas aos nomes mais conhecidos do cenário cultural brasileiro e até internacional; artistas que, em tese, não precisariam deste apoio para tocar seus projetos. Um exemplo conhecido é o da primeira turnê do Cirque du Soleil com seus caros ingressos, em terras brasileiras. Outro caso muito falado recentemente na mídia foi o da cantora Claudia Leite que conseguiu autorização do Ministério da Cultura para captar quase R$ 6 milhões para uma turnê de 12 shows pelo Brasil. 

Entramos, então, em uma discussão delicada. Afinal,  a lei tem que ser igual para todos, famosos ou não? Nesse cenário, o que fazer com aqueles artistas que não passaram pelas “peneiras” dos departamentos de marketing das grandes empresas? Dos grupos de cultura popular ou da produção independente distantes dos grandes meios de comunicação e que caminham longe dos circuitos comerciais?
 
Recentemente, lendo uma matéria publicada em um jornal de grande circulação da capital goiana, fiquei preocupado com alguns questionamentos feitos por produtores e artistas. Vou deixar aqui alguns deles para reflexão. Existe realmente o comprometimento dos governos federal, estaduais e municipais em cumprir o que estabelece a nossa Constituição? A cultura é respeitada como merece ou é considerada como área periférica da sociedade? Além da distribuição de recursos públicos para os projetos da área cultural, existem políticas públicas (e não políticas de governo) de longo prazo?
 
Mais especificamente no âmbito federal, podemos dizer que algumas medidas mais eficazes foram tomadas nas gestões de Gilberto Gil e Juca Ferreira à frente do Ministério da Cultura (MinC), entre os anos de 2003 e 2011, como os Pontos de Cultura ou a ideia do Vale Cultura. Mas a principal delas foi a reestruturação do Conselho Nacional de Cultura em 2005, responsável, desde então, pela articulação dos debates entre sociedade civil e as três esferas de governo, com vistas à elaboração de políticas culturais setoriais.
 
Assim, finalmente em 2010, nasceu o Plano Nacional de Cultura (PNC), previsto no § 3º do citado artigo 215 da Constituição de 1988 que, segundo o MinC, é um conjunto de diretrizes que devem orientar o poder público na formulação de políticas culturais com o objetivo de garantir preservação da diversidade cultural existente no Brasil. É um modelo de gestão cultural, um pouco parecido com do atual SUS, envolve a organização de um sistema nacional atrelado a sistemas estaduais e municipais, com recursos orçamentários via emenda constitucional. A título de curiosidade, o Estado de Goiás não estava entre os seis Estados (Acre, Rondônia, Ceará, Paraíba, Bahia e Rio Grande do Sul) agraciados com o primeiro repasse, que aconteceu este ano.

E a classe artística? Ela é participativa? Algumas vezes sim, como nas manifestações relacionadas ao atraso do repasse de verbas do último Edital do Fundo Estadual de Cultura. No dia 14/10/2014, estive presente no 1º Fórum Setorial de Música, promovido pela Secretaria Municipal de Cultura. A pauta era exatamente a adesão (voluntária) do Município de Goiânia ao PNC. Esse processo envolve, além de mudanças na atual legislação, a elaboração de um plano de cultura a ser aplicado por um período de 10 anos. Para a minha surpresa, ou não, pouco mais de dez artistas estavam presentes no evento.

 

Comentários

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  • 11.12.2014 23:26 Manuela Marques Ribeiro

    Adorei!!! Parabéns!

  • 04.12.2014 16:56 Naira Nunes

    Ótimo texto Prof. Othaniel! Muito esclarecedor e interessante.

  • 17.11.2014 14:33 Paula Ungarelli

    Por mais que tenha sido um texto com mais descrições, citações e relatos, cumpriu o papel de esclrecer certos pontos voltados para a cultura que muitos não tem conhecimento ou acesso. Além de servir de denuncia contra mais um descaso e falta de fiscalização do governo. Também mostrou o comum de uma sociedade que reclama de não ter auxilio, mas que tambem não comparece no momento de cobrança desse. Parabéns professor, por colocar a cara a tapa ao discutir assuntos tão complicados e polêmicos.

  • 27.10.2014 01:21 Victor Hugo Vieira Cantuária

    Muito boa a crítica prof. Othaniel! Nós do Teatro, passamos pela mesma situação anualmente, e acredito que várias outras áreas artísticas também são afetadas. Deixo aqui também a minha revolta.

  • 25.10.2014 08:06 Euler de Amorim Junior

    Muito bom, caro Prof. Othaniel. Tudo que diz respeito à cultura deve ser revivido a cada instante. Parabéns pelo artigo. Abraços, Euler.

  • 24.10.2014 18:58 Fabricio Oliveira

    É né! Cultura subsidiada pelo governo? Não acho que isso seja sequer chamado de cultura. Novamente inversões de valores, coisas que nos acostumamos e nos corrompemos! A se tivéssemos a coragem de bancarmos a verdade, e estimulássemos a tal liberdade, talvez chegaríamos próximos do que seria uma Cultura.

  • 24.10.2014 16:12 Júlio César

    Não entendo esse sentimento de abandono que tem o brasileiro, quando não vê o Estado em todas as áreas. Dostoievsky recebeu dinheiro estatal pra escrever suas grandes obras? Bach submetia suas cantatas a projetos de lei? Sócrates esperou dinheiro do governo grego pra desenvolver um projeto filosófico que seria mais tarde um dos tripés do ocidente? Se um compositor tem uma ideia para uma peça, só a fará se receber dinheiro do governo ou da iniciativa privada? Enquanto continuarmos confundindo alta cultura com "projetos culturais" promovidos pelo dinheiro do público, teremos todo esse pessoal do show business mamando nas tetas do governo sem fazer nada de relevante. Qualquer arte é uma profissão liberal, e não um ofício. Por séculos a fio, profissionais liberais receberam "honorários". E honorário não é um salário. É um pagamento onde se reconhece a honra de determinada profissão. A palavra profissão tem a mesma raiz que a palavra "professar". Certa vez uma professora de canto da UFG, muito acertadamente, disse: "o canto lírico é um sacerdócio". Ela está certíssima. Se não deixarmos de pedir mais governo sempre que temos problemas sociais, nunca nos livraremos dos problemas que são, por natureza, governamentais.

  • 24.10.2014 13:43 Larissa Mundim

    Pois é, meu caro... na reunião do Fórum Setorial de Literatura o quórum também foi pequeno, cerca de 20 pessoas, mas conseguimos reunir um grupo compromissado com a elaboração de pré-propostas para a Conferência Municipal de Cultura. Fizemos um bom trabalho. Nos interessa é a formulação de um Plano Municipal de Cultura coerente e atual. #tamojunto

  • 24.10.2014 12:47 Jonatan Emanuel Guilharde González

    Exelente texto! é bom que se faça conhecido entre as pessoas que se interessam no assunto mas não convivem na academia com esses assuntos!

  • 24.10.2014 11:05 Reinaldo Soares Rodrigues

    Bom texto! Só achei que faltou um pouco mais de uma opinião sua a respeito, por mais que indiretamente você a tenha deixado clara! Abraço!

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Othaniel Alcântara é professor de Música da Universidade Federal de Goiás (UFG) e pesquisador integrado ao CESEM (Centro de Estudos de Sociologia e Estética Musical), vinculado à Universidade Nova de Lisboa. othaniel.alcantara@gmail.com / othaniel.alcantara@gmail.com

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