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Luciana Maciel

Amor compartilhado

| 07.08.15 - 18:18
A proximidade de datas comemorativas é muito importante para nos fazer repensar fatos que passam despercebidos na vida cotidiana. Nesta ocasião, por que não aproveitar para analisar a figura paterna na sociedade moderna, sobretudo em seus aspectos legais? 
 
É inegável que as figuras familiares estão cada vez menos padronizadas e que a sociedade brasileira passa por um processo transformador, uma verdadeira mudança de paradigmas. Hoje, a maioria das famílias é composta por pais e mães que trabalham; há mais aceitação para o divórcio, bem como o processo tornou-se menos moroso ao dispensar a prévia separação judicial; casais não ficam juntos pela existência de filhos comuns. Esses são alguns fatores que mudaram os contornos estáticos das formações familiares, fazendo com que papéis de outrora não sejam mais absolutos na sociedade brasileira atual.
 
De forma inegável, esses novos papéis alteram também a forma dos pais se relacionarem com os filhos. Se até algumas décadas a figura materna era insubstituível na criação da prole e a figura paterna responsável pelo sustento, hoje, tais atividades devem ser realizadas em conjunto por ambos os pais.
 
Se quando as famílias ainda estão unidas, através do casamento ou mesmo da união estável, a busca de efetividade em ambos os papéis (de criação e sustento) já é difícil, a ruptura da união, ou mesmo a falta de um relacionamento duradouro anterior entre os pais, só intensifica a dificuldade e os desafios em compartilhar a paternidade. 
 
O Poder Judiciário tem sido palco de profundas transformações nos litígios familiares. Antes, era usual a guarda unilateral materna e direitos de visitas quinzenais aos pais, que ficavam responsáveis apenas pela manutenção financeira dos filhos. Hoje, muitos não se conformam com tal situação. Inúmeros processos foram apresentados ao Judiciário com o objetivo de ampliar a convivência paterno-filial, dar voz ativa ao pai, que mesmo detentor do poder familiar não podia de forma ativa participar das principais escolhas na vida de seus filhos, ou ter um contato efetivo e duradouro em períodos alheios ao regime de visitas, estático e padronizado.
 
Contudo, é importante perceber que o Judiciário é apenas a metade do caminho dessa transformação que começou efetivamente no seio da sociedade. Com a profissionalização da mulher e a modificação dos papéis vividos, houve necessidade da busca por mudanças na guarda dos filhos. Outros problemas endêmicos vividos cotidianamente por pais separados, como casos de alienação parental e pedidos de abandono afetivo, também possibilitaram o desejo de mudança. 
 
Diante disso, o legislativo tem buscado efetivar tais mudanças, tornando-as direitos e não mais conquistas provenientes de longos processos judiciais morosos e desgastantes. Como exemplo, temos a obrigatoriedade da guarda compartilhada, oriunda de lei sancionada em dezembro do ano passado. 
 
É necessário dizer que a escolha da guarda compartilhada não objetiva resguardar o direito do pai de ter o filho consigo, mas sim do filho de ter convivência com ambos os pais. Inúmeros estudos demonstram a necessidade dos menores, em fase de formação, de terem acesso a um duplo referencial. Nota-se que há, inclusive, uma mudança de nomenclatura, abandonando o antigo direito de visitas para reconhecer o direito de convivência. 
 
Atenta ao escopo de melhor interesse do menor, a lei da guarda compartilhada pretende, inclusive, responsabilizar aquele pai que ainda é alheio à formação do filho, pois, enquanto muitos lutam efetivamente para poder manter contato, outros relegam à mulher toda a responsabilidade na criação, tendo contato com o filho tão somente através do pagamento mensal e da declaração de imposto de renda. 
 
Como a legislação que obriga a escolha pela guarda compartilhada (com exceção para casos em que um dos pais manifeste desinteresse ou não tenha condições de exercê-la) é recente, ainda não há como dizer que ela está sendo efetivamente conquistada. Desde 2008, quando foi incluída pelo ordenamento jurídico a guarda compartilhada, o dissenso entre os pais era justificador da guarda unilateral, hoje, a lei veda essa possibilidade. 
 
Dessa forma, em guardas compartilhadas impostas, tornaram-se comuns processos ajuizados para decisões pontuais, como por exemplo a escolha da escola do filho, pois embora detentores de uma guarda compartilhada, alguns pais ainda não conseguem entrar em consenso sobre o melhor para a criança.
 
Talvez, nesse primeiro momento haverá realmente a jurisdicionalização de escolhas eminentemente particulares e privadas, mas irremediavelmente tal processo será passageiro. Além de dispendioso, o ajuizamento de ações muitas vezes não trará o alento esperado, pois não resolve efetivamente o problema vivido pelos pais ao analisar somente causas pontuais. 
 
É com satisfação que se vê no novo Código de Processo Civil, que entrará em vigor em março de 2016, a prevalência da mediação na resolução desse tipo de conflito, pois o que é realmente necessário para efetivação de uma guarda compartilhada é que esses pais aprendam a conviver e respeitar divergência de opiniões. 
A busca pela felicidade, enraizada na sociedade moderna, deu margem a mudanças legislativas que dão a todos o direito à liberdade. Mas toda liberdade traz atrelada a ela a igual carga de responsabilidade. E responsabilidade efetiva só se conquista com respeito aos demais.
 
Espera-se que, neste e nos próximos dias dos pais, esses tenham o prazer de estarem perto de seus filhos, não em virtude de uma ação judicial, mas por vontade. Que as mães reconheçam a importância disso, não apenas aos pais, mas aos próprios filhos. 




* Luciana Maciel é advogada especialista em Direito de Família

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