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Carlos Stuart Coronel Palma Júnior

Não é só o Donald que é pateta...

| 26.08.16 - 13:58

Vejam vocês que ironia na política não é um fenômeno exclusivamente tupiniquim.
 
Em artigo publicado no início deste mês - mais precisamente no dia 5 - , no The New York Times, a articulista Jackie Calmes aponta que a candidatura de Donald Trump pelo Partido Republicano já causa transformações de percepção de eleitores e, sobretudo, dos dirigentes acerca do pensamento econômico que dirige o partido, independente do resultado das eleições.
 
Tradicionalmente, o Partido Republicano abraça bandeiras do pensamento econômico conservador, que o aproximam da agenda das grandes empresas como, por exemplo, a desregulamentação dos mercados e redução de impostos de modo desproporcionalmente favorável a milionários e grandes corporações.
 
O sucesso de Trump com os trabalhadores de classe média, em especial com “White Nacionalists” (nacionalistas “brancos”) começa a desestabilizar o cânon Republicano da ortodoxia.
 
No mesmo sentido, Paul Krugman, em artigo publicado em 12/08 no mesmo jornal (Pieces of Silver) vai além, e destaca que o apoio à Donald Trump é um “acordo com diabo”, no qual ultraconservadores aceitam as posições preconceituosas e xenófobas de Trump em troca do apoio irrestrito à sua agenda de redução de impostos para super-ricos, como a supressão de imposto sobre heranças.
 
Esse posicionamento causa crescente resistência dentro do próprio partido. Pensadores conservadores reformistas do Partido Republicano, chamados de “Reformcons”, procuram adotar agendas mais favoráveis aos trabalhadores, como reforma no acesso à educação superior, caríssima e cada vez mais inacessível ao trabalhador médio. O Partido, por um lado, começa a também refluir a respeito de cortes adicionais a impostos para corporações e milionários, por outro, passa a defender isenções e créditos fiscais para trabalhadores com renda mais modesta.
 
Trump é a resposta eloquente dos eleitores republicanos ao Partido, apontando um afastamento do programa político desgastado, que guia o Partido desde a “Era Reagan”, a qual pregava que o aumento do lucro das corporações geraria mais riqueza e empregos para toda sociedade. Entretanto, os efeitos dessa política, com a Globalização, foram bem outros. O lucro das corporações nos Estados Unidos levou ao “outsourcing”, deslocamento de postos de trabalho da economia americana para o México e, sobretudo, para a China, achatando e estagnando ainda mais salários médios e eliminando empregos de trabalhadores/eleitores americanos.

Assim, o Partido Republicano reavalia as suas entranhas após o furacão do fenômeno Trump. O tradicional liberalismo enraizado na cultura americana é aquele trazido a bordo do “May Flower”, os peregrinos puritanos em busca de liberdade, que se resume no desejo do americano médio de um Estado que não atrapalhe os negócios, sobretudo do “Joe Doe” (expressão dos americanos que equivale ao nosso “João das Couves”), o que significa, também, que esse mesmo Estado limite o poder desproporcional das grandes corporações, oligopólios e monopólios, em benefício da concorrência e do livre-mercado, para que os pequenos prosperem. Essa é a visão que os “Reformcons” desejam que seja resgatada por Republicanos.
 
Para nós, a lição é particularmente valiosa. No feroz embate entre coxinhas e mortadelas, o essencial quase sempre fica de lado. Até os Republicanos repensam as políticas e posicionamentos conservadores que, até então, eram consenso no Partido. O fato é que ninguém pode querer um Estado caro, desproporcionalmente grande, ineficiente, corrupto e “aparelhado” de apadrinhados, com gastos absurdos, destinados a garantia de privilégios, que consomem quase todo orçamento do Governo. Por outro lado, não devemos, tampouco, desejar um Estado mínimo, mas sim um que seja suficiente e, sobretudo, eficiente. Feito na medida para prestar serviços públicos de qualidade para garantia da cidadania. E, mais importante, como percebem agora os republicanos, essa conta não pode ficar só nas costas dos mais pobres.
 
Que os nossos políticos escutem e entendam - para nós, brasileiros, como para eles, americanos: a surpreendente conclusão pragmática dos Republicanos mostra que, depois da tempestade política causada por Trump, é preciso pensar no que é real e necessário para eleitores/cidadãos e para o adequado funcionamento da sociedade, para além de “esquerda” ou “direita”, ainda que a motivação, para eles, seja  salvar o próprio partido, conforme destaca Calmes.

*Carlos Stuart Coronel Palma Júnior é mestre em Direito Econômico pela Universidade de Liége e conselheiro econômico da Embaixada da Bélgica, no Brasil

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