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Fabrícia  Hamu
Fabrícia Hamu

Jornalista formada pela UFG e mestre em Relações Internacionais pela Université de Liège (Bélgica) / fabriciahamu@hotmail.com

Inspiração

Me serve, vadia!

Sobre a educação da classe média | 03.10.13 - 12:48

Goiânia - Como acontece todos os dias, hoje cedo fui tirar o lixo. Ao me ver com as duas sacolinhas – uma do lixo orgânico e outra do reciclável –, a vizinha de apartamento me olhou como se eu fosse uma aberração da natureza e me deu uma bronca: “Cruzes, você se dá a esse trabalho? Temos faxineira no prédio para isso, sabia?!” 
 
Chocada com a falta de noção alheia, não consegui dizer nada. Uma senhora que presenciou a cena, me chamou no canto e confidenciou: “Minha filha, você não viu nada. Tem gente que, além de não separar o lixo, ainda faz questão de misturar absorvente íntimo e papel higiênico com as latinhas de alumínio”. 
 
Pois é, isso acontece. Para minha total perplexidade e indignação, isso ainda acontece. Existe uma ala da classe média brasileira que não se conforma. Como não dá conta de ser rica e pagar um séquito para servi-la, nem tem coragem de assumir que é pobre e precisa se virar sozinha, quer dar uma metida à besta. 
 
E lá se vai a tal classe média recalcada passear no shopping. Come, se lambuza e deixa a bandeja em cima da mesa. Afinal, se levantarem e colocarem o utensílio no lugar certo, do quê as moças da limpeza vão viver, não é mesmo? Falta de educação também é trabalho social, gente!
 
Depois de se refestelar na praça de alimentação, é hora de levar os pimpolhos para darem uma volta no shopping e deixar que emporcalhem o chão com suas embalagens de doces. E fazer como uma mãe que vi esses dias fez: “Deixe o papel aí mesmo no chão sujo, meu filho. Depois as faxineiras limpam”.
 
No salão de beleza, se comportam como um cliente que vi recentemente. O homem chegou para fazer as unhas com o pé fedendo e sujo, muito sujo. Não, ele não era um lavrador sem tempo para cuidar da higiene pessoal. É só mais um classe média recalcado, que pensa que a manicure também tem de dar banho nele de brinde.  
 
Ao chegar em casa, fazem como o cliente da diarista que me atende: aparam os pentelhos por todas as partes do banheiro e deixam a camisinha suja em cima da cama. Qual o problema em ter o estômago revirado ao ver tudo isso? Ela deveria era se sentir honrada por ter a oportunidade de trabalhar pra ele! 
 
Sim, eu sei que vão buscar explicações antropológicas para o fato – Gilberto Freyre, com seu brilhante “Casa-Grande e Senzala” está aí para nos fazer entender como essa boçalidade toda começou –, que vão tentar amansar meu coração, dizendo que muita gente não teve acesso às normas básicas de educação... Mas quer saber? Pouco me importa a origem. Quero é ver quando essa palhaçada toda vai terminar. 
 
Minha gente, vamos cair na real, pelo amor de Deus! Se você precisa trabalhar para viver, você é pobre! Não interessa se o IBGE, na classificação de renda mensal dele, disse que você é classe média. Você é pobre e ponto, porque rico que é rico, não precisa trabalhar para viver. 
 
Pare de se comportar como um sheik árabe, como a Beyoncé, como o Abílio Diniz. Você não é um multimilionário, nem uma celebridade, nem um empresário poderosíssimo, que têm 15 pessoas atrás deles todo o tempo, monitorando batimentos cardíacos, sede e fome... Você é “brasileiro, de estatura mediana”, pobre. Pare de ser metido à besta. 
 
Ano passado, a personagem de Débora Falabella fez o público delirar, em Avenida Brasil, gritando para a personagem de Adriana Esteves: “Me serve, vadia!”. Depois de todas as maldades, enfim Carminha estava pagando pelo mal que fez. Só que você não é atriz nem ator de novela. Sai desse universo paralelo que você criou e volta pra Terra, criatura. O mundo não está aí para te servir.
 
Enquanto acharmos normal ser folgados e mal educados, vamos continuar criando esses monstrinhos, que quando crescem colocam fogo em mendigos para quebrar o tédio, metem uma bala na cabeça de quem os desagradou no trânsito, pensam que têm direito a tudo pelo simples fato de terem nascido. 
 
Enquanto não aprendermos a tratar as pessoas com respeito, não pararmos de abusar do outro, de delegarmos o que é responsabilidade pessoal nossa para quem se mostra mais vulnerável, podemos crescer como potência econômica, mas não como gente.

Se sujou, limpe. Se tirou do lugar, arrume. Se estragou, conserte. Sua mãe não te ensinou isso em casa? Fique tranquilo, a vida vai ter dar umas aulinhas. 
 

Comentários

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  • 03.02.2015 13:33 Marco Aurélio Teles

    Concordo plenamente com suas palavras, hoje as pessoas acham que ser sem educação e chique. E discordo da Ingrid I Ritter, pois no seu texto fica claro que quem é rico de verdade não precisa trabalhar, em momento algum você diz que eles não trabalham. Há uma diferença enorme entre você não precisar trabalhar e você não trabalhar. Ótimo texto.

  • 06.01.2015 22:36 João Alceu Julio Ribeiro

    Gostei. Pronto, falei!

  • 20.11.2014 07:58 Ingrid I Ritter

    Adorei seu texto, apenas não concordo com "quem é rico não precisa trabalhar", como se administrar a riqueza fosse apenas apertar um botão mágico. Sou da opinião de que, quem é rico, pobre, vivo, tem que trabalhar... culturalmente o Brasil carrega uma mentalidade que trabalhar é ruim, quase tortura, ô povo preguiçoso!Ficar a toa é um sonho!

  • 02.10.2014 10:40 Morgana da Silva Costa

    Saudades dos seus textos. Volta por favor

  • 18.07.2014 03:15 Fernanda Gusmão

    Reclamo disso toda dia, principalmente quando vou ao cinema. É um abaurdo! Você é resposável pelo seu próprio lixo!

  • 24.04.2014 16:36 Manoel Eloy

    Perfeita como sempre!

  • 25.02.2014 15:09 Fabrício Mariano

    Parabéns pela forma sincera, contundente e honesta, é uma pena que muitas pessoas tratam seus próprios lixos (soberba, autocorrupção e ignorância) como se fossem sacolas recicladas sem ao menos verificar o que tem dentro. E temos muito mais detalhes de nós mesmos.

  • 11.02.2014 12:46 Paula Pimenta Felix Curado

    Fabricia, Impossível deixar de notar a lucidez e percepção antropológica do seu artigo. Lamento que, talvez, os destinatários certos não tenham acesso ao seu texto (o ideal seria imprimi-lo e distribui-lo por aí). Parabéns.

  • 29.12.2013 22:24 gabriela

    Que texto mais lugar comum...Que pena que para criticar, as pessoas se apeguem aos clichês. Vc tornou uma crítica que poderia ser válida em um relato infantil, uma visão de novela global. PArabéns.

  • 20.12.2013 08:47 Rogério Bernardes

    Excelente e verdadeiro artigo. Parabéns à jornalista Fabrícia Hamu.

  • 14.12.2013 20:42 Mônica Barros

    Oi, Fabrícia, parou por que? Porque parou? Saudades dos seus textos!

  • 27.10.2013 13:40 César

    Muito bom. Muito bom mesmo. As "aulinhas" da vida são duras. Abraço.

  • 16.10.2013 17:38 MATRONIA SALVADOR DE PAULA

    CONCORDO COM TUDO QUE VOCÊ ESCREVEU NO SEU TEXTO. EM CASA RECICLAMOS TODO O NOSSO LIXO EM RESPEITO ÀS PESSOAS E PRINCIPALMENTE AO MUNDO, AO MEIO AMBIENTE. NO SHOOPING TAMBÉM CARREGO O MEU LIXO, NÃO O DEIXO NA MESA, PORQUE AS FAXINEIRAS, BEM COM OS GARIS, ESTÃO LÁ PARA MANTER O AMBIENTE LIMPO E NÃO PARA LIMPAR A SUJEIRA QUE FIZEMOS. PARABÉNS, ESPERO QUE UMA GRANDE MAIORIA TENHA LIDO SEU TEXTO, INTERIORIZOU PARA COLOCAR EM PRÁTICA PARA COM AS PESSOAS E PARA COM MUNDO.

  • 09.10.2013 17:35 José de Arimatea

    Gostei mesmo foi do comentário da Amanda. E todos os outros aqui que NUNCA fizeram nada disso que atirem a primeira pedra.

  • 07.10.2013 11:05 Lucielle M. Bernardes Peixoto

    Mais uma vez, Fabrícia, mandou muitíssimo bem. Tenho aversão a gente mesquinha, a esses comportamentos descritos em seu artigo. Não suporto a ideia de pessoas pensarem que são superiores as outras. Parabéns! Grande abraço

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