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Pablo Kossa
Pablo Kossa

Jornalista, produtor cultural e mestre em Comunicação pela UFG / pablokossa@bol.com.br

O Blog

Tempo de polêmicas menores

Inacreditável que bobagens tenham tanto espaço | 11.04.14 - 17:23

Goiânia - Relutei ao máximo, mas é impossível deixar passar batido essa história do professor de filosofia do Distrito Federal que colocou Valesca Popozuda como grande pensadora em prova aplicada aos alunos do Ensino Médio. Não achei relevante. Mas os desdobramentos do caso me impelem a escrever sobre o assunto.

A verdade é que vivemos tempos das polêmicas bobas, das tretas efêmeras. Todo dia temos que nos indignar com algo, compartilhar um absurdo nas redes sociais, assinar um abaixo assinado para salvar alguma coisa. E nos sentirmos seres humanos melhores por isso. Na boa, rebelde de Facebook é tão perigoso quanto mosca sem asa. Não é uma assinatura no Avaaz que vai resolver o Brasil. Revolução alguma será curtida, comentada ou compartilhada.

O Twitter se vangloria de seu papel na Primavera Árabe. Para a empresa, é ótimo poder ostentar isso. Mesmo que não seja inteiramente verdadeiro. Pode até ter ajudado, mas definitivamente não foi decisivo. As pessoas fariam o que fizeram pelas condições objetivas a que estavam submetidas e que não suportavam mais. Não foi por conta de uma corporação que ganha dinheiro quando compartilhamos com nossos seguidores a foto de nossos filhos fazendo peraltices que aquelas pessoas se tocaram que não dava mais. Soa ingênuo colocar tanta responsabilidade na construção de um movimento social nos sites de relacionamento.

Nesse vale tudo do mundo virtual, o assunto groselha ganha peso que não lhe é devido. Quando tínhamos menos veículos de comunicação, o filtro que selecionava o que era publicado ou ia ao ar era mais rígido. Os tais gatekeepers que estudamos em Teorias da Comunicação. Com a proliferação de locais sedentos por qualquer novidade mínima para chamar de furo seu na internet, isso ficou mais maleável. Além disso, as redes sociais ainda amplificaram mais esse desespero do novo pelo novo. Mesmo que esse novo não tenha tanta relevância assim. Ou, como o caso do professor e a Valesca Popozuda, sem relevância alguma.

Percebo avanços com o advento da internet, é evidente. Mas não a considero panaceia alguma. Os pontos cruciais de seu, digamos, dark side é que as pessoas se tornaram mais rasas, superficiais e sem capacidade de concentração. E isso, naturalmente, leva ao reforço dos preconceitos e estereótipos. O senso comum elevado à enésima potência. 

Quer conhecer o antro do senso comum? Desça a barra de rolagem de sua página inicial no Facebook por um minuto. E seja bem-vindo ao Inferno de Dante!

Pesquisas e mais pesquisas indicam que as pessoas não terminam textos que começam a ler na internet. Já mudam de página, mudam de post, mudam de conversa. Um percentual baixíssimo dos que começaram a ler esse texto chegaram até aqui. Isso é muito grande para elas, elas desejam tudo em até 140 caracteres. E se possível com um vídeo ou foto piada curta de um macaco pedalando para ficar mais palatável. 

Minha brilhante colega aqui de A Redação Anapaula de Castro Meirelles pensa diferente. Ela realmente acredita que a internet tem poder real de mudar as coisas. Odeio pensar diferente, pois sei que sou mais burro e velho e ela deve estar certa. Mas não consigo enxergar a coisa de forma tão otimista. O que ela pejorativamente chama de velha mídia tem pontos que ainda não foram superados. Um maior rigor ao checar fatos, uma preocupação maior com a linguagem, mais aprofundamento, alguns limites. A internet liberou tudo, até mesmo porrada nas partes íntimas. Não consigo ver nisso uma vantagem.

É claro que não vivíamos o paraíso anteriormente e erros grotescos com reputações destruídas de forma definitiva aconteciam. Mas o Éden não veio com o mundo www. Arregaçar a honra de alguém hoje é mais comum. A pulverização proporcionou isso. Pergunte a qualquer garota que teve fotos íntimas compartilhadas para entender do que estou falando. Namorados magoados não conseguiriam espaço para publicar fotos da ex pelada nos jornais, não teriam lugar nas emissoras de televisão para veicular os vídeos sexuais. Agora a possibilidade está somente a dois cliques do mau caráter.

No final de tudo, quem deu show (de novo) foi Valesca Popozuda. Eu adoro essa mulher. Para mim, ela é a Simone de Beauvoir atualizada, uma radicalização do feminismo - sou dona do meu corpo, dou para quem quiser e ninguém tem nada com isso. Para quem criticou o professor por usar o trecho de sua música em uma prova, além de provavelmente ter muito tempo livre para ficar na groselha de internet, foi preconceituoso sim com o funk carioca. Valesca me ensinou como lidar com gente desse tipo, para o recalque passar longe: beijinho no ombro. 


Comentários

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  • 16.04.2014 20:17 Tatiana lemos

    Muito bom!

  • 12.04.2014 19:01 Anapaula de Castro Meirelles

    Grande Pablo! Você é incrível. Gosto do seu olhar sobre o assunto. Sou uma otimista crônica e sim a internet tem o poder de mudar as coisas. O sociólogo polonês Zygmunt Bauman chama de “modernidade líquida” o tempo em que vivemos, de permanentes incertezas e mudanças. “Líquidos mudam de forma muito rapidamente, sob a menor pressão”, ele diz, e daí podemos relacionar sua tese a um mundo de relacionamentos instáveis, celebridades instantâneas, paranoia por um ideal de beleza inexistente, consumismo, esfacelamento da política como meio de se viver em sociedade e sua substituição pelo individualismo.Qualquer semelhança com o momento atual do Brasil não é mera coincidência. Lembro todos os dias de Bauman no meu passeio pela velha mídia, todas as manhãs. Em páginas e páginas de informações, em cada manchete, há ali uma certeza cravada, uma sentença proferida, quase uma ordem imposta contra a qual não pode haver argumentos. E um interesse único, como um coro partidário travestido de noticioso. A pauta é praticamente a mesma em todos, assim como a forma de se enxergarem os fatos. Um desperdício de trabalho e matéria-prima, que poderiam ser canalizados para a tão necessária construção de entendimentos coletivos em vez do velho samba de uma nota só. A velha mídia não entende de Bauman e talvez por isso os jovens líquidos não entendam a velha mídia. O mundo dos jornalões é um mundo sólido, tão duro quanto o concreto, inacessível para a interação, antidialético, monocromático e tão velho quanto um dogma, contra o qual não há argumentos: ou se acredita, ou está excomungado. Em plena era da comunicação, quem se incumbiu da tarefa de informar durante décadas e construiu impérios impressos, radiofônicos e televisivos hoje está incomunicável, fechado em si mesmo, falando para o espelho e ainda se achando dono da verdade. Aquele laser verde na cara do Tramontina, ao vivo na Globo, é apenas um lampejo desses novos tempos: o império midiático se fecha numa bolha de vidro, mas a multidão lá fora já descobriu como atravessar a redoma. O que será do Brasil de amanhã ninguém sabe. As previsões são tão líquidas e efervescentes que quase chegam a se tornar gasosas. E é mais provável que a velha mídia se dilua no esgoto do que acerte as previsões ditatoriais de suas manchetes cheias de maus interesses. Um beijo com o meu carinho e admiração.

  • 12.04.2014 11:31 Thiago Pena

    Olá, Pablo. Concordo com a colega que afirma que "a internet tem poder real de mudar as coisas". Se, em alguns casos, não é o motivo fundamental, é o gatilho, cuja ausência significaria a não eclosão desse ou daquele fato. Todavia, na contramão da utilidade e da relevância de conteúdo, o que eu vejo (como semi-leigo em comunicação social rs), é que o conteúdo "groselha" e as polêmicas bobas são responsáveis por gigantesca parte da audiência. De fato, acho que poucos se preocupam em buscar conteúdo de qualidade MESMO, de modo a crescerem intelectualmente (intelectual em sentido amplo, observe-se). É muito prazeroso pra essa turma toda ver vídeos bobos no youtube, trocar vídeos no whatssapp, brincar de snapchat, postar a hora da almoço no facebook ou mesmo, no instagram, os vários pesos no supino da academia. Friso: nada contra quem faz isso, mas quando isso passa a ser seu único hobby ou a parte principal do seu dia, de fato as coisas não vão bem. O fato, Pablo - e aqui reitero que gostei do texto - é que a internet seria uma arma muito mais poderosa não pela sua própria atuação direta como veículo de insatisfação ou consternação. Mas, se a mesma fosse utilizada de forma mais eficaz, seria uma excelente fonte de conhecimento, através do qual as pessoas formariam opiniões e fortaleceriam seus valores. Afinal, basta pensar em quantos abrem um bom livro e quantos acessam a internet a todo momento em busca de conteúdo que causa prazer de 3 minutos e nada acrescenta. Falando por mim, busco, na maioria das vezes, na internet, conteúdo hábil a me acrescentar algo útil e que produza reflexão. É um excelente instrumento para se buscar instrução e, porque não, até mesmo erudição... Não quero de forma alguma parecer aqueles chatos pseudo-intelectuais. Só penso, como um normal qualquer, que num país sem muita erudição até mesmo no alto escalão, poderíamos vislumbrar na internet um bom modo de, a muito longo prazo, mudar essa realidade. Acho muito legal que seus textos sejam espaço pra discusssão de ideias e expressão de leitores, pois os "debates" modernos têm se mostrado cada vez mais vazios, prevalecendo, como temas principais, os vídeos do whatssapp, as fotos do "face" e as polêmicas baratas dos grandes portais e das redes sociais. A relevância anda sendo relegada e o bom conteúdo deixado de lado, infelizemente. Até!

  • 12.04.2014 10:38 Ana Carolina Castro

    Nem sempre concordo com você Pablo, mas este texto eu assino embaixo 100%. Excelente reflexão! Um abraço, meu caro.

  • 12.04.2014 08:38 Adriano Barreto

    Que lixo desnecessário. Bobo. No caso específico da Valesca a polêmica em cima da música foi idiota, mas todo o contexto em cima da polêmica gerou uma discussão necessária e importante. A prova disso é que a mídia toda está discutindo o assunto, o preconceito e você mesmo se rendeu ao assunto. Veja bem Pablo sua amiga colunista tem razão no que fala. O seu programa papo cabeça é uma nova ferramenta das novas conexões. Analise mais seu universo antes de falar essas lorotas.

  • 12.04.2014 07:19 Rony pereira

    Querido Pablo, ótimo texto. Também acho que as pessoas estão mais superficiais talvez por culpa das mídias populares que dão credito as noticias baratas como violência, polemicas bobas e fofoquinhas de famosos. Tudo groselha, como diária nosso grane pensador Pablo Kossa. Esse tipo de noticia é muito bem aceita em nossa sociedade porque é isso- a desgraceira- que o povão quer ver e ouvir. Mas enquanto as mídias não mudarem essa cultura de informação rasa bobinha as pessoas vão continuar assim, bobinhas também. Valeu queridão. Sou leitor de seus textos e ouvinte do papo cabeça. Um abraço.

  • 11.04.2014 19:42 jayles

    kkkkkkkkkk.vc como sempre arrasa sou sua fã incondicional. bjos Pablo.

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Jornalista, produtor cultural e mestre em Comunicação pela UFG / pablokossa@bol.com.br

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