Esses dias li um texto que falava sobre o hábito agora em extinção: crianças brincando na rua. Ainda podemos ver essa prática em bairros periféricos de Goiânia ou nas cidades do interior. Mas não é mais majoritário. Uma pena. Tenho dó das crianças criadas com tablet na mão e assistindo campeonato europeu de futebol na televisão.
Sou velho e já posso usar a expressão “no meu tempo” ou “sou da época” sem maiores dilemas. Quando moleque, o pessoal se juntava para jogar golzinho na rua com tijolo marcando a trave e parando a bola para o carro passar. De noite, as mães saíam na rua gritando cada um pelo nome para tomar banho e jantar.
Não raro, alguém era colocado para dentro de casa a chineladas ou puxado pela orelha. Eram tempos anteriores à Lei da Palmada. Ninguém se assustava com isso. Ainda mais quando o cara estava com nota baixa no boletim ou tinha aprontado alguma em casa.
Os pais de hoje só deixarão seus filhos brincarem na rua se forem imprudentes ou gostarem das grandes emoções. Na idade de minha filha mais velha, eu já pegava ônibus sozinho para ir ao Flamboyant e passava por baixo da catraca para economizar o dinheiro da passagem com o cobrador fazendo cara feia. Andava o Centro de Goiânia inteiro olhando os sebos. Pergunte se eu deixo a primogênita fazer o mesmo? É elementar que sou um pai bundão. Ou prudente. Depende do referencial.
Andávamos o bairro inteiro procurando pipa que havia sido torada nas guerrinhas. Pique esconde era em cima das árvores da rua. Na adolescência, varávamos as madrugadas dos finais de semana na porta de casa conversando fiado e esperando as garotas mais velhas chegarem da balada – só para ver os amassos finais dentro dos carros que viravam o assunto da semana.
Sei que é nostalgia pura e que a diversão da molecada hoje é ficar no smartphone falando com os amigos o mesmo tanto de bobagem que falávamos presencialmente. O problema é que perder a rua não foi algo positivo. A crescente da violência urbana nos fez abdicar de um espaço de amadurecimento e aprendizado real. O tal dos muros e as grandes que nos protegem do nosso próprio mal, tal qual diz Humberto Gessinger.
Você acha que a gente aprendia sobre sexo na escola com aula de educação sexual? Que nada! Os mais velhos é que contavam para os mais novos como as coisas aconteciam. Tudo errado e cheio de mitos, é claro. De forma mais humana, menos timbre Discovery.
Como vivi por 30 anos no mesmo bairro, observei isso de perto. Os locais onde antes eram cheios de crianças e jovens, hoje são mais ermos que arquibancada em jogo do Goiânia.
A proliferação dos condomínios fechados é a prova cabal de que a rua foi perdida de vez por nossa incompetência enquanto sociedade. Vivemos trancados, criando nossos filhos como zumbis em frente ao celular, tablet, computador e televisão enquanto está um lindo dia de sol lá fora.
Seguindo essa toada, tenho até medo de pensar como serão criados nossos netos...