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Declieux Crispim
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Declieux Crispim é jornalista, cinéfilo inveterado, apreciador de música de qualidade e tudo o que se relaciona à arte. / declieuxcrispim@hotmail.com

Cine Qua Non

Um Limite Entre Nós

| 20.03.17 - 08:37 Um Limite Entre Nós (Foto: divulgação)
Goiânia - A luz que fecunda ao final de Um Limite Entre Nós (2016), dirigido e estrelado por Denzel Washington, é um momento sublime no cinema americano atual e remete à cena de Com um Pé no Céu (1941), a obra-prima de Irving Rapper, em que a noiva decide acompanhar o noivo em uma missão religiosa penosa no exato instante em que um homem acende a iluminação da rua, preenchendo belamente uma das cenas mais memoráveis da história. No longa recente, a luz natural dos raios solares brilha intensamente após o toque trôpego da corneta de Gabe (Mykelti Williamson), o irmão deficiente mental de Troy (Denzel Washington), e prenuncia um novo tempo na vida familiar de seus personagens.
 
Macular a imagem de um filme por seu teor teatral como ocorreu com esta fita é desconhecer a própria gênese do cinema e os mestres que se enveredaram por este caminho. Não é demérito a um longa possuir características que remontam ao teatro, de Uma Rua Chamada Pecado (1951), de Elia Kazan, até A Pele de Vênus (2013), de Roman Polanski, outros relevantes nomes da sétima arte como Manoel de Oliveira, Jacques Rivette e Woody Allen passearam por esta nobre vertente, referências que alicerçam tal afirmação. 
 
A obra em questão é uma adaptação da peça Fences (1983), de August Wilson. Ela se passa durante a década de 50 e versa sobre a história do coletor de lixo Troy (Denzel Washington), ex-presidiário e ex-jogador de beisebol, na Pittsburgh dos anos 1950 e narra sua conturbada relação familiar. Troy é um sujeito extremamente ranzinza, que não demonstra suas emoções. À certa altura, ele diz a Cory, seu filho caçula, que não tem obrigação algum de gostar dele, que não há lei que o obrigue a nutrir tal sentimento, mas cuja obrigação é a de contribuir com alimentação e disponibilizar um teto para abrigá-lo. Ele ainda possui um filho músico, fruto de um relacionamento anterior.
 
As cicatrizes emotivas impregnadas em Troy se deve à sua conturbada trajetória de vida. Sua carência afetiva está intimamente ligada a frustrações por não ter se tornado jogador profissional de beisebol devido à restrição perpetrada sobre os negros durante sua juventude, apesar de seu reconhecido talento, e por se acabrunhar devido ao seu ofício. As palavras proferidas por ele, no seio familiar, são ásperas e carregadas de violência implícita, o que denota não uma incomunicabilidade presente, mas uma dureza impactante em cada entonação e gestos. Como contraponto à instabilidade emocional do marido, Rose é serena e possuidora de um perfil conciliatório. Para Troy, Rose é o que há de melhor em sua vida e é com ela os poucos momentos em que um sorriso brota em sua face. 
 
Há uma cena fortíssima em que Troy rompe suas relações com Cory e a violência desabrocha de modo inevitável. O filho se torna, contra sua vontade, o espelho de seu pai. A tensão é predominante durante toda a projeção. Não há espaço para um respiro sequer. A sintonia do elenco aliada ao brilhante texto originário da peça referida afere uma dramaticidade singular resultando em um belíssimo melodrama, que navega no limiar entre a sobriedade dramática e a pieguice sem extrapolar as fronteiras que as cercam.
 

Comentários

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  • 10.04.2017 14:33 Daniela

    Que texto bem escrito! Adorei! Excelente como sempre! Parabéns!

  • 20.03.2017 15:34 Jackelline de Castro

    Excelentes atuações, diálogos marcantes e emoções à flor da pele. O filme realmente é muito bom de se ver e seu texto foi bem a fundo... parabéns!

  • 20.03.2017 12:33 Flávia

    Excelente como sempre, parabéns! Quero assistir!

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Declieux Crispim é jornalista, cinéfilo inveterado, apreciador de música de qualidade e tudo o que se relaciona à arte. / declieuxcrispim@hotmail.com

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