Entre os mais influentes da web em Goiás pelo 14º ano seguido. Confira nossos prêmios.

Envie sua sugestão de pauta, foto e vídeo
62 9.9850 - 6351

Sobre o Colunista

Nádia  Junqueira
Nádia Junqueira

Nádia Junqueira é jornalista e mestre em Filosofia Política (UFG). / njunqueiraribeiro@gmail.com

Ora, pois!

"Goiânia é pequena para mim"

Então qual é o seu tamanho? | 15.04.12 - 01:40
Não sei quantas vezes vocês já ouviram por aí “Goiânia é pequena para mim”. Ou quantas vezes você mesmo já disse isso. Eu mesma já o fiz e sei como se deu isso. Eu me lembro, bem criança, num almoço de domingo, sentada no mesmo lugar à mesa que me sento hoje em que posso bem ver o céu por entre os coqueiros do quintal. Na época era um pé de goiaba. E eu via um avião passando. Eu pensei que queria viajar muito. Que queria conhecer muitas coisas. Era um pensamento de criança. Essas coisas foram evoluindo para lugares, culturas, pessoas, vidas, histórias.

E aí que essa vontade nunca saiu de mim. Assim como fui crescendo, vivendo a música e as experiências profissionais que ela me trouxe com o tempo. Aos 11 anos vestia uma camisola para apresentar o solo infantil no Musical das Águas do coro adulto da PUC-Goiás, Vozes e Cores. Eu representava uma criança num sonho e cantava “Arca de Noé”, de Vinícius de Moraes.

Participei desse musical até os 16 e segui com participação em sexteto, gravação de CD, de curta-metragem. Idade delicada, em que tudo parece acontecer e o mundo dar as caras. Os estudos iam bem e com eles a vontade de estudar fora, a música se tornando coisa séria e a vontade de conhecer muita coisa continuava. Minha camisola foi ficando pequena. E eu achava que meus sonhos para Goiânia também. É nessa hora que a gente solta a ingrata frase: “Goiânia é pequena para mim”.  

No ano seguinte fui para a Nova Zelândia. Mas faculdades fiz aqui. Saí ano passado para outro intercâmbio. Voltei. Quero sair de novo. Mas hoje avalio com muita ingratidão e injustiça soltar essa frase, seguida de críticas, “Goiânia é pequena para mim”. Recomendo, aconselho (a quem tem oportunidade) uma, duas, mil vezes a experencia de viver fora de Goiânia. Profissionalmente. Pessoalmente. Para aprender mais. Para viver mais. Se todo ponto de vista é visto de um ponto, que se conheçam muitos pontos. Goiânia é um delicioso ninho, quentinho e confortável. E até passar perrengues fora daqui te faz melhor.  

Mas o que anda me incomodando ouvir é que essa vontade seja porque Goiânia é pequena para você. E seguem inúmeros discursos descendo o cacete na cidade, no povo daqui. Grande é São Paulo, Rio de Janeiro, Londres ou Nova Iorque, nesse caso. Sinceramente? Alguém que passa sua vida toda em uma dessas cidades, para mim, não é maior que alguém que vive a vida toda em Goiânia. A grandeza está em reconhecer outras cidades, outras vidas, outras possibilidades. Ou em fazer alguma coisa pelo lugar que você escolheu em chamar de seu.

Mas vou explicar por que vos falo hoje disso. Quinta-feira saí correndo da aula que terminou mais cedo, às 21h45, para ir ao show de Marcel Powell (filho de Baden) no Teatro Sesi, caminho de volta para casa do Câmpus. Cheguei uma hora atrasada, consegui assistir a 40 minutos de show. Suficiente para me arrancar lágrimas e me fazer dormir mais feliz. O teatro estava com muitas cadeiras vazias. E, cá entre nós, nem paguei para entrar (pagaria R$ 10). Deixaram-me entrar sem pagar dado meu atraso.

Sempre que assisto a alguma coisa muito boa culturalmente em Goiânia, saio incomodada com as cadeiras vazias. Não tanto pelas cadeiras vazias, porque sei como não é fácil divulgar esses eventos entre uma população sem certos hábitos. Mas pensando naqueles que dizem “Goiânia é pequena para mim, porque eu adoro teatro e música e Goiânia não tem cultura. Não oferece nada”. E, geralmente, esse reclamão é aquele que deixa R$ 100 na balada. Mas acha caro pagar R$ 20 para ver Marcel Powell. E então você que é grande demais para essa cidade? Cadê sua grandeza, amigo? Qual seu tamanho?

A indignação segue quando penso naqueles que, para mim, são grandes e estão em Goiânia. Quem fica por aqui são aqueles pequenos? São os losers? É um leque muito grande de motivos que faz as pessoas ficarem por aqui. De fato, alguns não têm a mínima vontade em tentar conhecer outra coisa. Outras têm medo de sair desse ninho quentinho para se lançarem às dificuldades. Já uns ficam pela qualidade de vida e custo de vida (ainda) baixo perante outras capitais. Outros motivos são uma namorada, família, amigos. E ainda aqueles que, admiro muito, podem estar em qualquer outro lugar e ficam aqui para fazer Goiânia crescer.

Nesse grupo, pensando rápido, me vêm algumas pessoas em mente. Rodrigo Kaverna, meu amigo e colega de música, que tem talento de sobra para estar onde quiser. E está aqui, dando oficinas de coco e maracatu na garagem de casa todo fim de semana para gente de toda idade e tipo. Por quê? Acredita que pode compartilhar seu conhecimento e fazer a cidade crescer culturalmente.

Fabrício Nobre e Décio Coutinho são outros em que penso. Reconhecidos nacionalmente pela competência e talentos, poderiam estar trabalhando em qualquer canto do Brasil (mundo, até). E estão por aqui ralando para fazer desse canto nosso mais rico culturalmente. E há tantas outras pessoas, penso na Flávia Cruvinel, que toca o Música no Câmpus, no Maneco Maracá, do Circo Lahetô, Danilo Alencar, do Arte e Fatos, nos artistas da Quasar e por aí segue.

Para além da cultura, penso nos meus professores de filosofia. Vez em quando penso no privilégio que tenho deles estarem aqui, enquanto poderiam estar em qualquer canto do Brasil ensinando tanta coisa importante. Penso então nos arquitetos, jornalistas, engenheiros, médicos, empresários e tantos outros profissionais que ajudam essa capital a crescer. Naqueles que se organizam num sábado de manhã para ir às ruas e não tolerar os abusos políticos pelos quais passamos. Eles são pequenos para Goiânia? Se são grandes, que saiam daqui?

Que pensemos então em nossa grandeza. Em que consiste? Qual seu tamanho? O que você quer ser? Sair de Goiânia: legítimo, necessário, importante. Para quem quer, precisa, se arrisca, tem vontade, coragem. Mas não diga que é porque a cidade que te gerou é pequena para você. Pense nos grandes que ficaram para que essa sua cidade um dia seja “grande o suficiente” para outras gerações. Pense que é você quem dita seu caminho. Pense que você pode ser pequeno e ordinário até na Big Apple. Pense que um londrino pode sentir a capital da rainha pequena para si. Ele pode se realizar em uma cidade do interior do Nordeste brasileiro. Não é o tamanho da cidade. É o tamanho do sonho.      

Comentários

Clique aqui para comentar
Nome: E-mail: Mensagem:
  • 21.10.2012 07:48 Alicia Huberman

    Não concordo e acho pretensioso questionar o tamanho dos outros apenas porque eles reclamam de Goiânia. Goiânia precisa sim ampliar muito a oferta cultural e ideológica que oferece, e isto é o que a torna pequena para muitas pessoas. Eu costumava ir a todos os eventos artísticos da cidade antes de mudar-me de país, mas você há de convir que a cultura ainda é muito limitada por aí. Ter uma apresentação musical por semana não sgnifica que existem opções, há gostos e necessidades diferentes, e a produção cultural aina é baixíssima em Goiás, e os incentivos também, e você deve saber disto muito bem. Você pode até gostar dessa cidade, mas colocar a culpa em quem reclama não contribui ao processo de analisar a realidade do lugar, identificar suas deficiências, e almejar ou propor mudanças. Além do que, ninguém é ogrigado a gostar do lugar onde nasceu, lugares também tem personalidades, e nem sempre o perfil da pessoa que nasceu neste espaço coincide com esta personalidade. E ainda bem que existem leis migratórias permitindo a movimentação (infelizmente ainda com muitas limitações). O que quero dizer é que, quem não gosta de Goiânia não é um estúpido por isto; e quem gosta de Goiânia não precisa não enxergar as deficiências da cidade.

  • 07.05.2012 10:37 Andyra Menezes

    Adorei o texto... muito bem escrito e nos faz valorizar a nossa terra. Eu sou super, hiper, master bairrista e amo minha cidade Goiânia. Parabéns!

  • 24.04.2012 04:43 João Carlos

    Wolney me apresentou Leon Tolstoi e sua máxima: "se queres ser universal, canta tua terra". Amei seu texto.

  • 21.04.2012 01:25 Paulo S. Pereira

    Conjugo, literalmente , com todo o exposto e já disse, falo e falarei a mesma coisa: só os miúdos não tem condições de crescer e tem medo de ir lá fora adquirir mais conhecimentos e bagagens cultural, e voltar para engrandecer a lindíssima e amada Goiânia..

  • 20.04.2012 12:25 Consuelo

    Fantástico o texto. Parabéns!

  • 19.04.2012 06:46 Juliana

    Excelente texto, Nadia. Parabens. Faz mesmo refletir e me encheu de ideias que adoraria compartilhar contigo. Beijos de uma expatriada, J.

  • 18.04.2012 12:14 Bia Tahan

    pra mim não existe nada mais provinciano que essa história. Provinciano e chato ficar colocando a culpa na cidade, quando o recalque mora dentro de si. adorei. bjs

  • 17.04.2012 06:14 AlbinoJC

    Na verdade não mensuro Goiânia, pois não consigo uma métrica para fazer comparativos subjetivos. Vivi dois anos e meio em São Paulo, e inevitavelmente, ao voltar para Goiânia, fiz comparações o tempo todo, pois minha experiência trouxe referenciais fortes o bastante para notar o que antes não notava. Mas o que mais me incomoda mesmo é a falta de educação. Isso me entristece, aborrece a aporrinha sempre que saio pela cidade, seja ao sair para comprar um pão ou mesmo andar sem compromisso pela rua. É grosseria de todo tipo. No trânsito, no prédio, no estacionamento, no supermercado, na calçada. Gente ignorando o tempo todo as regras de conduta para a vida em sociedade. Isso, do início do dia ao final. Enfim, Goiânia tem tudo para ser uma cidade referência, mas acho que é querer demais pedir por mais educação, ou pedir "Olhe mais em volta e menos para o seu umbigo". É mais fácil receber uma resposta do tipo "Volta pra São Paulo" do que "Você está certo. Vou tentar melhorar". É uma injustiça julgar a cidade, quando na verdade a culpa é dos moradores. E não, não vou voltar para São Paulo. Talvez a passeio.

  • 17.04.2012 05:58 RODRIGO

    Oi Nádia, belo texo!! Sou um goiano nascido em minas e que há muito saí de Goiânia mas sempre com aquela vontade de voltar pra essa cidade que tanto gosto. Como você também já tive minha inquetação de sair de Goiânia e saí, conheci outros lugares, pessoas, culturas e recomendo isso a todo mundo que quer crescer pessoal e profissionalmente. Hoje a cada dia que passa crescce minha vontade de voltar pra essa terra porém nem sempre podemos. Mas uma das lembranças que nunca se vão daí é de um jingle antigo que dizia assim "Eu amo Goiânia! Goiânia me ama!", meio cafona eu sei, mas acho que sitetiza o sentimento de todos que já viveram aí.

  • 17.04.2012 05:46 Charles Alves

    Parabéns, Nádia. Lendo seu texto fiquei refletindo sobre minha realidade. Acho Goiânia imensa para mim. Porém, outro dia comentei no facebook: "São tantos projetos, tanta vontade de realizar coisas que Goiânia vai ficar pequena". Que essa seja a lógica. Que cada um busque o melhor para essa cidade, que o território não seja a medida para dizer se ela é ou não pequena. Mas que seja imensa pela representação do seu povo!

  • 17.04.2012 05:31 Elton

    Concordo plenamente com suas idéias, também morei fora, e valorizo muito nossa cidade maravilhosa. Parabéns!!!

  • 17.04.2012 05:29 Andrea Maria Peixoto Fael

    Nadia, cada dia, cada segundo da minha vida me orgulharei mais de vc. Obrigada linda e ccompetente menina que vi crescer e nao para nunca!

  • 17.04.2012 04:44 Leandro

    Nadia, Já morei fora do país e hoje resido na grande Rio de Janeiro, uma das cidades mais belas do mundo. Sai de Goiânia já com a certeza de que ela não era pequena. Mas depois de três anos longe daqui, a única grande coisa que vi é o vazio da saudade pela minha pequena goiânia: os meus pequenos enormes amigos, minhas minusculas lembranças na cidade, minha ínfima parcela pra deixar Goiania cada dia melhor.

  • 16.04.2012 10:06 KELI CRISTINA ALENCAR RAMOS

    Texto interessantíssimo. Me identifiquei demais. Mesmo não sendo goiana, sou uma paulistana que fui adotada por essa cidade. Muitas vezes reclamei dessa questão cultural em Gyn. Mas vc tem razão Nádia. Podemos ser grandes ou pequeninos em qualquer lugar, o que vale é o sonho. Muito obrigada por me fazer refletir. Um abraço.

  • 16.04.2012 05:44 Larissa Lessa

    Lindo o texto, Nádia! Sempre tive essa inquietação, essa vontade de ir para fora e experimentar novas culturas. Mas nunca me vi longe de Goiânia. E posso dizer? Depois dessa coluna, deu vontade de ficar aqui por mais tempo e ajudar a construir uma cidade melhor, como disse nossa querida Aline Mil.

« Anterior 1 2 Próxima »

Sobre o Colunista

Nádia  Junqueira
Nádia Junqueira

Nádia Junqueira é jornalista e mestre em Filosofia Política (UFG). / njunqueiraribeiro@gmail.com

Envie sua sugestão de pauta, foto e vídeo
62 9.9850 - 6351