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PRECARIZAÇÃO

Estudo da UFG aponta "uberização" no mercado de trabalho de personal trainer

Transformações no mercado foram analisadas | 09.09.25 - 11:32 Estudo da UFG aponta "uberização" no mercado de trabalho de personal trainer Pesquisa da UFG aponta uberização no mercado de trabalho de personal trainer (foto: reprodução X)
A Redação

Goiânia
- Um estudo do Programa de Pós-Graduação em Educação Física da Universidade Federal de Goiás (UFG) analisou as transformações na indústria do fitness desde os anos 2000 e identificou impactos significativos na atuação dos profissionais da área. A pesquisa mostra como o trabalho dos personal trainers e professores de Educação Física vem sendo reconfigurado por tendências ligadas à precarização e à chamada uberização do setor. Confira
 
A pesquisa aponta para um aumento do trabalho precário e liberal no segmento, personificado na figura do personal trainer. Em contraste, há uma diminuição no número de professores assalariados em academias, influenciada por diversos fatores, incluindo o surgimento de empresas de baixo custo (low-cost). As tecnologias de informação e comunicação também têm impactado significativamente a indústria e o trabalho docente. Essas transformações na indústria do fitness estão ancoradas em mudanças econômicas e sociais mais amplas no mundo do trabalho.
 
A ideia de pesquisar o mercado de trabalho na Educação Física surgiu da própria experiência da pesquisadora Nathália Costa Melo e Silva, que atuava como personal trainer ao iniciar o mestrado. "Inicialmente, a proposta era relacionar o trabalho do personal trainer com a saúde mental. No entanto, optou-se por focar nas transformações do trabalho e na precarização, considerando a complexidade dos temas e o curto período do mestrado, com as questões de saúde mental vindo de forma intrínseca", explica.
 
Segundo a pesquisadora, existiam estudos críticos mais antigos sobre o tema, do início dos anos 2000 e 2010, mas a literatura mais recente sobre o personal trainer tendia a ser "romantizada", apresentando o trabalho de forma excessivamente positiva e lucrativa, sem abordar as dificuldades e a precarização. Assim, o objetivo foi atualizar esse campo de pesquisa e trazer um contexto histórico das transformações até a era digital.
 
Coleta de dados
Para realizar o estudo, foi conduzida uma pesquisa de campo de natureza qualitativa, fundamentada na Sociologia do Trabalho e em pesquisas anteriores sobre o trabalho no fitness. A coleta de dados envolveu a análise documental de materiais encontrados on-line, como revistas e reportagens. O principal método de coleta de dados primários foram entrevistas semiestruturadas realizadas em três grupos focais, compostos por professores de Educação Física que atuam no segmento fitness.
 
Os grupos foram formados por professores que entraram no mercado em períodos cronológicos distintos: um grupo com professores que iniciaram nos anos 2000, outro com aqueles que começaram nos anos 2010, e um terceiro com os que ingressaram nos anos 2020. Ela explica que a metodologia de grupo focal, mesmo realizada virtualmente durante a pandemia de covid-19, foi escolhida por favorecer a construção coletiva do conhecimento e investigar pensamentos e sentimentos dos participantes.
 
Mercado nos últimos 25 anos
As transformações observadas no trabalho dos professores de Educação Física no fitness refletem mudanças mais amplas no mundo do trabalho sob o capitalismo contemporâneo. O estudo relaciona essas mudanças à passagem do fordismo para a acumulação flexível impulsionada pelo neoliberalismo, onde o trabalho formal perde espaço para formas autônomas e terceirizadas.
 
Fenômenos como a "pejotização" e a "uberização" do trabalho, destacados pela pesquisa, não são exclusivos do fitness, mas manifestações de uma lógica de flexibilização e precarização que afeta diversos setores de serviços.
 
Essa lógica, segundo autores referenciados por Nathália, representa um retrocesso dos direitos trabalhistas, disfarçado pelo discurso do empreendedorismo, em que o trabalhador assume riscos e custos que antes eram do empregador. "Percebemos na pesquisa que a preferência pelo trabalho autônomo de personal trainer entre os professores mais jovens, em contraste com a valorização do trabalho formal pelos mais antigos, está ligada ao contexto econômico e às ideologias de mercado de cada época", afirma Nathália.
 
Para a pesquisadora, o segmento fitness representa um campo com grande demanda profissional, sendo fundamental compreender suas particularidades de forma atualizada. "A análise das tendências, que ainda estão em andamento, é crucial para que a categoria profissional possa se posicionar e buscar melhores condições de trabalho", ressalta.
 
Previdência
A perspectiva dos participantes da pesquisa sobre a questão da previdência social diverge significativamente entre os diferentes grupos etários e de tempo de atuação profissional. Professores que iniciaram suas carreiras no fitness nos anos 2000 demonstraram uma preocupação clara com a necessidade de um emprego fixo e a contribuição para o INSS pensando na aposentadoria.
 
Segundo Nathália, essa visão é fruto de uma visão de época: esses profissionais foram formados antes do neoliberalismo, em um momento em que o mercado era mais "keinesianista", ou seja, o Estado ainda era visto como um grande interventor, levando alguns a considerar o trabalho assalariado em academias como um "segundo plano" para garantir o futuro.
 
Em contraste, os professores mais jovens, que entraram no mercado a partir de 2010, já numa perspectiva neoliberalista, apresentaram uma menor preocupação com a formalidade laboral e a aposentadoria. "A maioria deles não contribui para o INSS, focando mais nos ganhos imediatos do trabalho autônomo como personal trainer. Embora reconheçam um 'prazo de validade' da carreira, suas alternativas pensadas a longo prazo tendem a ser o empreendedorismo ou a especialização, em vez do retorno ao trabalho formal com garantias previdenciárias", explica.
 
Essa falta de preocupação com a previdência entre os mais jovens, segundo a pesquisadora, reflete o contexto econômico e o estímulo ao trabalho liberal no período em que ingressaram no mercado, evidenciando uma desconexão entre a ideologia do empreendedorismo e a preparação para contingências como acidentes ou a idade avançada: "eles abraçam a ideologia do empreendedorismo e chegam a ter 'pavor do CLT' (Consolidação das Leis do Trabalho), mas essa mentalidade não parece estar acompanhada de um planejamento financeiro ou previdenciário. Eles focam no dinheiro que 'entra e gastam', e a falta de contribuição para o INSS significa que não estão preparados para contingências como acidentes ou a incapacidade de trabalhar na velhice, que o INSS teoricamente cobriria".
 
Nathália exemplifica com o fato de que essa categoria é uma grande usuária de motocicletas, veículo que está associado mais frequentemente a acidentes. Mesmo assim não há uma preocupação com uma possível incapacidade no trabalho.

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