As imagens de Pacaraima (RR), que começaram a circular no fim de semana, são de uma tristeza quase sólida – parece ser possível tocá-la. Centenas de venezuelanos, em fila indiana, voltando para casa (que casa?), miseráveis, enquanto brasileiros entoam o Hino Nacional. Cena comparável às dos refugiados sírios sendo expulsos de países europeus.
A situação em Pacaraima é labiríntica. Definitivamente, o município não tem estrutura para receber os imigrantes do país vizinho. Ao mesmo tempo, a atitude de expulsá-los é desumana. Há muitos anos, a Venezuela tem sido corroída por seguidos governos populistas, irresponsáveis, personalistas.
O teatro socioeconômico lembra o da Alemanha no entreguerras: inflação estratosférica, desemprego pleno, produção sucateada, conflitos armados. Palco de desespero que leva pais e mães a enfrentarem uma dolorosa travessia em busca da sobrevivência de si mesmos e de seus filhos.
Pacaraima demole definitivamente o personagem do bom brasileiro, aquele que recebe a todos com braços abertos. Escancara ao mundo o que se vive silenciosamente no cotidiano de nossas cidades, onde são construídas fronteiras de concreto, colocada guarda armada e instaladas câmeras de segurança para separar aqueles que são bem-vindos ou não ao nosso convívio.
Nossos condomínios são micropacaraimas. Recebemos os “refugiados” que nos servem, cuidam dos nossos filhos e dos nossos jardins. Até chegar o dia em que eles se tornam um estorvo, uma ameaça à nossa bolha. Aí, os expulsamos, cantando em silêncio o hino da nossa vergonha, e voltamos à rotina do nosso trabalho e da missa aos domingos.