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Marcos César Gonçalves

Vagas para deficientes

Na Segurança Pública, discriminação é maior | 30.10.12 - 10:53

Goiânia - Apesar de já ter havido uma notável evolução, a descriminação a deficientes físicos é um sério problema que persiste em nossa sociedade, e, o que é pior, na própria Administração Pública.
 
Infelizmente, esta é uma realidade presente na Administração Pública brasileira, uma vez que, não raro, os candidatos deficientes são excluídos dos cargos públicos, seja porque a Administração declara que o candidato não é deficiente, seja por apresentar a justificativa de que a deficiência existente não permite que o interessado execute as atribuições do cargo em disputa.
 
Tal comportamento demonstra que a Administração, que deveria disponibilizar meios para melhor agregar e incluir o deficiente na sociedade, faz, muitas vezes, exatamente o oposto, ou seja, adota silenciosamente a abominável prática da discriminação.
 
Mesmo que de modo superficial é importante realçar a diferença entre deficiência e incapacidade. Deficiente é a pessoa que possui alguma inferioridade, segundo padrões mundialmente aceitos, a qual dificulta sua integração social. Em outras palavras, é toda perda ou anormalidade de uma estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica que gere limitação para o desempenho de certas atividades, dentro do padrão considerado normal para o ser humano.
 
Já a incapacidade corresponde à falta (resultante de uma deficiência) de condições mínimas para exercer uma atividade da forma necessária ou dentro dos limites considerados normais para o ser humano. Enfim, invalidez dificulta e incapacidade impossibilita.
 
Assim, fica claro que nem todo o deficiente é incapaz. Há hipóteses em que a pessoa, apesar de ostentar deficiência, detém capacidade (plena ou parcial) para exercer determinada função pública – mesmo que, para tanto, necessite empreender um esforço diferenciado.
 
Naturalmente, nos casos em que a deficiência impossibilitar a pessoa de exercer determinada função pública (“incapacidade”), a Administração não pode ser obrigada a admitir essa pessoa em seus quadros.
 
No entanto, nos casos em que a limitação imposta pela deficiência é apenas parcial, é legitimo e necessário que se exija da administração uma proteção diferenciada ao deficiente.
 
A Constituição Federal não define o quantitativo exato de vagas para deficientes, mas o Decreto Federal 3298/99, que regulamenta a Lei Federal 7853/89, impõe a reserva de, no mínimo, 5% (cinco por cento) das vagas disponibilizadas no certame para deficientes. Caso a aplicação desse percentual resulte em um número fracionado (5,5 vagas, por exemplo), a Administração deverá disponibilizar vagas que correspondam o primeiro número inteiro subseqüente (6 vagas, no exemplo dado).
 
Tendo em conta que esta lei e seu decreto regulamentar tratam de matéria de obrigação nacional, ou seja, de aplicação em todo país, todos os entes federativos (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) devem cumprir, ao menos, esta mínima porcentagem estabelecida. Ressalta-se que vários entes ultrapassam este quantitativo mínimo - a União, por exemplo, reserva até 20% (vinte por cento) das vagas para deficientes.
 
Mas, mesmo existindo esta determinação legal e constitucional, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios insistem em discriminar os deficientes. Tal realidade é facilmente constatada nos concursos para preenchimento de cargos públicos, principalmente, na área de segurança pública, porquanto a regra é declarar que deficiente não pode ocupar cargo nesta área sob o langoroso argumento de que os candidatos devem possuir plenas e perfeitas condições físicas e mentais.
 
O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) pronunciou-se sobre este específico caso, quando da análise do concurso da Polícia Federal para Minas Gerais, dispondo que as atribuições afetas aos cargos de Delegado, Escrivão, Perito e Agente de Polícia são incompatíveis com qualquer deficiência.
 
Sustentou esta tese com o argumento de que todos os ocupantes desses cargos se submetem a situações de conflito armado que demandam o pleno domínio dos sentidos e das funções motoras e intelectuais, no intuito de defender não só a sua vida, mas, também, a de seus parceiros e dos cidadãos, sendo que, ademais, têm o dever legal de agir e prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito.
 
Com base nesses argumentos, o TRF1 declarou que é incabível a reserva de vagas para portadores de deficiência nos concursos públicos para preenchimento de vagas na área de segurança pública.
 
Contudo, o Supremo Tribunal Federal, ao julgar o recurso extraordinário interposto nesse mesmo processo (RE 676.335, Relatora: Min. Carmem Lúcia), decidiu que tal posicionamento destoa do entendimento do Supremo, determinando, então, a reserva de vaga para deficiente no referido concurso.
 
Fruto deste julgado, o Ministério Público Federal (MPU) protocolizou reclamação (Rcl 14145) no Supremo Tribunal Federal requerendo a suspensão dos recentes concursos públicos para os cargos de escrivão de polícia, perito criminal e delegado, todos da Polícia Federal, até que sejam retificados os editais, a fim de que neles conste a reserva de vagas às pessoas com deficiência.
 
O Ministro Ayres Brito, Presidente do Supremo Tribunal Federal, em 03 de agosto de 2012, deferiu liminar nesta reclamação determinando a suspensão dos editais do concurso, tendo por base o julgamento anteriormente mencionado.
 
Deste modo, a percepção momentânea da Suprema Corte brasileira é a de que o direito a reserva de vagas para deficientes, garantia constitucional, deve abranger todo e qualquer concurso público, incluindo, por certo, os cargos na área de segurança pública, tais como os de delegado, escrivão, agente, perito de polícia.
 
Reputamos que é digno de elogios o posicionamento adotado pelo STF, eis que prestigia a proteção conferida pela Constituição Federal aos deficientes e está de acordo com o entendimento de que a Administração deve promover a integração dos deficientes ao mercado de trabalho, inclusive no âmbito público.
 
Marcos César Gonçalves, advogado atuante na área de concursos públicos e sócio do escritório GMPR - Gonçalves, Macedo, Paiva & Rassi Advogados, e professor de direito administrativo

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