Ah, os bons e velhos tempos! Como o mundo era um lugar bacana e suportável. As pessoas ainda sabiam o que era um legume de verdade, norte-americano só comia hambúrguer, a carne de verdade era nossa, os carros eram de metal e quadrados, a competição se limitava a ver quem conseguia ficar mais tempo sem piscar, e a tristeza era algo que só acontecia quando o sorvete caía no chão. E o McDonald's? Ah, o McDonald's! Entregava seu pedido em 10 segundos, sem frescura, sem tela sensível ao toque, sem “experiência do cliente”. Era só chegar, pedir e comer.
Então, em 1985, o apocalipse se abateu sobre nós. Um grupo de celebridades bem-intencionadas, quem sabe musicalmente questionáveis, se reuniu para gravar uma canção que prometia "curar o mundo". O que esse grupo realmente fez foi abrir as portas do inferno e tudo foi traduzido em uma tristeza existencial generalizada que nem Freud seria capaz de explicar.
A partir daquele momento, o eixo da terra mudou em 30 graus para a esquerda e a busca frenética pelo sucesso se tornou a nova religião. As pessoas começaram a se atropelar para chegar ao topo, pisando em quem quer que estivesse no caminho. A obesidade, antes uma mera possibilidade remota, transformou-se em uma epidemia global, com filas intermináveis em fast-foods e academias lotadas de gente tentando desesperadamente queimar as calorias extras.
Mas não para por aí. "We Are The World" também desencadeou uma série de outros males. A música mundial se tornou um festival de letras repetitivas e batidas eletrônicas, a moda se transformou em um desfile de roupas extravagantes e sem sentido, e a arte se rendeu ao minimalismo e à falta de criatividade. O desavisado Luciano Pavarotti, o maior tenor de todos os tempos, não suportou e morreu logo em seguida, em menos de 30 anos após cantar essa aberração, que tragédia.
As redes sociais foram criadas e se tornaram o palco perfeito para a exibição de vidas perfeitas e irreais, alimentando a inveja e a frustração. A cultura do cancelamento se espalhou como um incêndio, destruindo carreiras e reputações por causa de um único deslize. A polarização política se intensificou, dividindo o mundo em dois grupos irreconciliáveis.
Tudo culpa dessa maldita música. Se ao menos tivéssemos ouvido a canção em um toca-discos de vinil e a agulha tivesse riscado o disco, talvez o mundo ainda fosse um lugar suportável. Mas agora é tarde demais. O estrago está feito, precisamos de cursos de pós-graduação para entendermos tudo, principalmente para os temas ligados a convivência, respeito, identidade de gênero, DEI e pronomes.
P.S.: Se você ainda não percebeu, este texto é uma sátira. A música "We Are The World" não é a causa de todos os males do mundo.
Ralph Rangel é desenvolvedor de software, professor em cursos de MBA. Foi Superintendente na Secretaria de Educação e Cultura do Estado de Goiás. Foi Secretário Executivo na Secretaria de Inovação, Ciência e Tecnologia do Município de Goiânia