Estreia hoje em Goiânia o documentário Raul Seixas – O Início, o Fim e o Meio. Se você tiver o mínimo interesse por cultura pop brasileira, já tem programa para esse final de semana. E não seja mané deixando para depois, pois filmes assim não ficam muito tempo em cartaz. Não seja mané como eu fui, que perdi a sessão de convidados que rolou ontem no Lumière do Bougainville. Vacilo, mas totalmente justificável. Quem é pai como eu sabe como o sorriso de uma filhota de um aninho, depois de um dia cheio de trabalho, convence a não sair de casa. Crianças dessa idade tem argumentos de alta eficácia para pais babões. Mas não vou deixar chegar segunda-feira sem ter ido ao cinema ver a obra.
Raul foi importantíssimo para minha formação pessoal. Desde criança até hoje, me impressiona o poder da obra do cara. Não sou desses que seguem modinhas cool, hipsters ou qualquer que seja a nova denominação para caracterizar esses seres modernetes. Gente que despreza qualquer coisa que tenha leve odor popular. Eu não. Pelo contrário, acho genial quem consegue chegar na massa mantendo um discurso estético tão ousado quanto Raul. Se ele tem fã chato, paciência. Os Beatles também têm. E fã chato não invalida a obra de ninguém.
Meus pais ouviam muito Raul. Fui influenciado por esse ambiente e virei fã do cara. Me lembro do show que ele fez aqui em Goiânia junto de Marcelo Nova, penúltimo de sua carreira antes de seu óbito. Eu tinha dez anos de idade e minha mãe, prudente, não quis me levar ao Ginásio Rio Vermelho. Depois, assisti ele tocando músicas do Panela do Diabo no Domingão do Faustão também ao lado de Nova. Raul estava claramente debilitado. Seu organismo não suportou as quantidades homéricas de álcool e drogas ingeridas anos afora. A conta chegou e o baiano a pagou precocemente aos 44 anos.
A obra de Raul tem níveis de compreensão tão amplos que consegue sensibilizar pessoas de todas as faixas etárias, culturais e econômicas. Um senhor com a cabeça branca e uma criança são fãs de Raul. Um extremo intelectual e um fã de Big Brother são fãs de Raul. O cara mais rico de Goiânia e o mendigo viciado em crack das imediações da Rodoviária são fãs de Raul. Suas músicas têm o poder de dizer algo ao coração de cada um desses, uma amplitude como poucos compositores no Brasil possuem. Acredito que só Roberto Carlos e Renato Russo estariam nesse pódio junto de Raul.
O filme de Walter Carvalho oferece a chance de recolocar o artista no foco, possibilitando uma reavaliação do legado do Raul. Bobo de quem acha que o barbudo era só um hippie sujo de rodinha de violão. Quem pensa assim, nunca se atentou na profundidade das letras de Raul, em especial na sua parceria com Paulo Coelho. Assim como não percebeu no acento pós-tropicalista na musicalidade de Raul, na mistura brutal de rock n' roll com gêneros brasileiros. Embora Raul negue seu vínculo com a linha evolutiva da música popular brasileira, ele está muito bem colocado ali, entendendo a tradição da música nordestina, reconhecendo o apelo do brega e deixando tudo isso fluir com a energia orgiástica do rock.
Não tem jeito, sempre quando eu penso na relevância do trabalho do maculo beleza, encho os pulmões e grito com hálito ébrio: “TOCA RAUL!!!”.
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