Já fui uma pessoa com vergonha de tudo. Na pré-adolescência, naquele período em que você está hiper suscetível à opinião alheia, meu acanhamento era absurdo. Como contraponto radical, assim que a adolescência chegou e os primeiros fios de barba surgiram na cara, fiquei completamente despudorado. Acho que a enxurrada de hormônios descarregada no sangue teve esse efeito colateral. Se precisavam de alguém para fazer graça nas apresentações de trabalhos escolares, podiam contar comigo. Se fosse necessário pagar mico na frente do ginásio da escola lotado, meu nome era pronto.
Hoje, sou aquele típico “tiozão tô nos 30”. Ainda corre algum ímpeto rebelde nessas veias, só que o vigor já não é mais o mesmo. O fascínio maior dessa fase da vida se encontra na observação. Ficar mais de longe, de boa, sacando o constrangimento que as pessoas normalmente se submetem no dia a dia me atiça mais. E haja vergonha alheia ao nosso redor para ser cuidadosamente admirada. Senso de ridículo anda escasso na feira da vida. Nego acha de verdade que aquela situação vexatória que ele está vivendo é digna de reconhecimento social. Enquanto isso, eu estou ali no cantinho, de butuca, com um chope na mão, ávido por saber onde aquele constrangimento todo vai chegar.
Tão falso quanto sorriso de coluna de social são os aplausos que circundam quem vive o ridículo. Não sei se é por que o povo também é sem noção ou é vergonha de dar o toque, mas a idiotização é gigante. A coisa fica mais na cara quando estamos em ambientes com aquelas posturas que forçam algum tipo de intimidade, de descontração, de alegria. Tudo artificial, tudo de plástico, tudo sem vida.
Aí, quando alguém sai um pouquinho do tom, já ganha destaque. As pessoas estão acostumadas com o previsível, com o constrangimento programado. Basta Sílvio Santos falar “porra” em seu programa dominical, ou o atacante botafoguense Herrera se negar a participar da brincadeirinha bobinha de pedir música no Fantástico por ter feito três gols que o rebuliço é geral. Pisar minimamente fora do previsível é o suficiente para gerar desconforto.
As coisas estão tão invertidas que uma atitude corajosa e cidadã como a da Xuxa é completamente distorcida pelo sofrível entendimento do populacho. Nego acha que a apresentadora fez isso para se promover. Velho, na boa, nessa altura do campeonato a Xuxa não precisa de promoção. Quantas pessoas têm o currículo midiático tão farto em sucessos quanto ela no Brasil? Não dá mais de uma dezena. Logo, é só gente que o pai paga a internet sem fio e se acha celebridade de rede social para supor tal bobagem descabida. E marco mais um constrangimento alheio em meu caderninho mental de anotações.
Não ache que torço para que o espírito santo do bom senso desça à Terra e toque o coração de cada um dos sem noção. Não. Isso impediria minha diversão cotidiana. Deixa a galera falar a bobagem que quiser, deixa o povo com a tosquice que for. Eles cumprem uma função social importante. Além disso, não posso abdicar de minha terapia gratuita.