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Victor Brecheret é um dos destaques | 13.05.21 - 14:19
Brecheret e alto-relevo do Jockey de SP (Foto: Livro Sandra Brecheret) Carla Lacerda
São Paulo - Andar pelo Jockey Club de São Paulo é viajar pela história. E não, isto não é uma metáfora. Quem já atravessou o pórtico hoje restaurado e adentrou no maior complexo arquitetônico em estilo Art Déco do mundo, que ocupa uma área de 600 mil metros quadrados, sabe que nenhum recurso de linguagem conseguiria descrever a grandiosidade do local. Para os apaixonados por arte, há um motivo a mais para visitar o Hipódromo de Cidade Jardim, sede do clube inaugurada em 1941: as esculturas de Victor Brecheret, um dos ícones do Modernismo brasileiro de 1922.
Fachada do Jockey Club de São Paulo / (Foto: Fundação Escultor Victor Brecheret)
Segundo Wolney Unes, engenheiro da Organização Social Elysium Sociedade Cultural e responsável pela revitalização do Jockey Club, iniciada no ano passado, mais de 30 obras de Brecheret, entre painéis, fontes, altos e baixo-relevo, podem ser conferidas no espaço. Mesmo durante a pandemia do novo coronavírus, visitas foram abertas ao público, com todos os protocolos de segurança sanitária implantados.
As esculturas do ítalo-brasileiro no clube, como as incorporadas aos prédios da arquibancada social e do antigo vestuário de jockeys, são tombadas pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo (Condephaat). E não é para menos. Nas palavras da professora da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO) e doutoranda em Performances Culturais pela Universidade Federal de Goiás (UFG), Nancy de Melo, a proeminência de Brecheret pode ser percebida na forma como sua obra também dialoga com outros campos da arte, como a literatura.
Professora da PUC Goiás Nancy de Melo: Brecheret inspirou modernistas como Mário de Andrade / (Foto: Jota Júnior)
“Da mesma maneira que o Abaporu, da Tarsila do Amaral, inspirou Oswald de Andrade a escrever o Manifesto Antropofágico, a escultura Cabeça de Cristo, do Brecheret, inspirou Mário de Andrade com Pauliceia Desvairada”, compara Nancy. Ela lembra que os modernistas romperam com a tradição europeia no mercado e na academia, a fim de consolidar uma expressão nacional no mundo das artes.
História
Nascido em 1894 – há controvérsias sobre o mês e local; alguns afirmam que em São Paulo, outros em Farnesi, na Itália -, Victor Brecheret iniciou sua formação artística em 1912, com estudos em desenho, modelagem e entalhe em madeira no Liceu de Artes e Ofícios da capital paulista.
De 1913 a 1919, viajou a estudo para Roma, onde foi aluno do escultor Arturo Dazzi (1881-1966). Foi influenciado por mestres renascentistas, pelo impressionista Rodin e por Mestrovic. Retornou a São Paulo em 1919, com ideias de uma escultura moderna, e instalou seu ateliê no Palácio das Indústrias, em sala cedida por Ramos de Azevedo.
Em 1921, com bolsa do governo de São Paulo, viajou a Paris para estudar. Apesar de não estar no Brasil durante a Semana de Arte Moderna de 1922, 12 esculturas suas estiveram presentes na mostra.
Brecheret alternou sua estada entre França e Brasil até 1936. Foi premiado, em 1925, no Salão da Sociedade dos Artistas Franceses. Em 1936, ele iniciou a execução do Monumento às Bandeiras, cujo anteprojeto data de 1920, obra inaugurada em 1953 na Praça Armando Salles de Oliveira, em São Paulo.
Cabeça de Cristo / (Foto: Livro Notícias de Brecheret - Sandra Brecheret)
A geometrização das formas é uma característica marcante na produção do ítalo-brasileiro a partir de 1923. É possível notar em alguns de seus projetos, após seu retorno ao Brasil, a assimilação de temas e características formais relacionadas às culturas indígenas.
Brecheret participou ainda das 25ª e 26ª Bienais de Veneza (1952 e 1950), e das 1ª, 3ª e 4ª Bienais de São Paulo. Na Bienal de 1951, recebeu o prêmio de Melhor Escultor Nacional.
Capa da revista do Jockey de SP / (Foto: Livro Notícias de Brecheret - Sandra Brecheret)
Art Déco
Também não dá para passar pelo Jockey Club de São Paulo sem se deslumbrar com os traços da arquitetura Art Déco. Originado na França, na década de 1920, o estilo foi difundido em todo o mundo e ficou conhecido a partir dos famosos arranha-céus de Nova York. A tendência simbolizou a modernidade da época, unindo atributos ecléticos à racionalidade da arquitetura.
Decorativo, internacional, industrial, moderno e cosmopolita são algumas das características dessa escola. Cada uma delas foi aplicada tanto em objetos cotidianos, quanto em grandes construções, compondo um estilo único e universal ao mesmo tempo.
O gênero arquitetônico desenvolveu particularidades em seus elementos em cada local construído. Seja por meio da forte geometrização, da ênfase na riqueza dos detalhes ou da inspiração do desenho industrial (streamline). Além disso, inovou materiais e técnicas de construção, destacando revestimentos, caixilharias, vãos e alturas, como é possível ver no projeto do Jockey Club.
Wolney Unes aponta o complexo de Art Déco no Jockey de SP como o maior do mundo em área de ocupação. Os 600 mil metros quadrados do espaço, o equivalente a dez parques agropecuários de Goiânia, são sete vezes maior do que o segundo colocado, o complexo Rockefeller Center, em Nova York.
Reforma
A partir de 1946, após o sucesso de público e associados no empreendimento, decidiu-se pela ampliação das instalações do clube. O arquiteto francês Henri Sajous foi o encarregado da obra e ao longo de 12 anos não só ampliou, como remodelou fachada e interiores dos edifícios. O francês deu todos os tons de glamour, requinte e sofisticação ao novo edifício.
O partido de Sajous foi a vertente neoclássica do Art Déco, especialmente inspirada no Palais Chaillot parisiense. As aproximações estilísticas são encontradas em elementos construtivos como as pilastras, os grandes caixilhos de ferro, o frontão encurvado e as figuras escultóricas.
Sandra Brecheret / (Foto: Arquivo Pessoal)
Talvez o que nem todos saibam é sobre a amizade entre Sajous e Brecheret. E como a equipe do jornal A Redação descobriu essa ligação? "Conversando" com a própria história. Filha de Brecheret, Sandra Brecheret Pellegrini mora ainda em São Paulo e nos contou que o pai foi convidado pelo francês para ornar a nova sede do Jockey. Na década de 1940, para facilitar o trabalho, o ítalo-brasileiro chegou a montar um ateliê no local, na pista do hipódromo. "Recordo-me de, criança, ir para o Jockey brincar enquanto papai estava no ateliê ", pontua Sandra.
Para ela, uma das principais obras deixadas pelo pai modernista no clube é o painel com as 3 Graças, disposto na sala onde são realizadas as apostas. "Fiquei muito feliz de saber que o Jockey passa por esse restauro. O legado desse espaço, que recebeu tanto a elite paulistana e brasileira, é histórico porque o clube faz parte da própria história de São Paulo", ressalta.
O escultor Victor Brecheret e sua filha Sandra na década de 1950 / (Foto: Arquivo Pessoal)