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Unidade está localizada no Setor Oeste | 07.06.24 - 10:37
Foto: Rodrigo Obeid/A Redação
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Carolina Pessoni
Goiânia - Um sonho de um médico se mantém vivo há 56 anos no Setor Oeste, região central de Goiânia. O que começou como uma pequena clínica se transformou na maior unidade de saúde especializada em pacientes queimados de Goiás, o Pronto Socorro para Queimaduras (PSQ), mais conhecido como Hospital de Queimaduras.
Localizado na Rua 5, em frente à antiga Praça da Cirrose, o PSQ nasceu do desejo do médico Nelson Piccolo de oferecer um tratamento adequado para essas pessoas. "Meu pai foi um gênio. Ele tinha uma paixão por queimaduras desde quando morava em Marília (São Paulo)", conta a filha e também médica Mônica Piccolo.
A família se mudou para Goiânia em 1965 a convite da cunhada de Nelson para trabalhar em um hospital e logo o profissional quis montar um serviço para tratamento de queimaduras na unidade. Como o desejo não pôde ser concretizado, abriu uma pequena clínica na Rua 24, no Centro, com a mesma finalidade.
Pronto Socorro para Queimaduras em 1968 (Foto: Reprodução)
Em 1º de abril de 1968, Nelson Piccolo inaugurou o Pronto Socorro para Queimaduras, que se mantém aberto 24 horas por dia, desde então. "O sonho foi erguido ao lado da minha mãe, Emília Sarto Piccolo, que era administradora e sempre foi seu braço direito", orgulha-se Mônica.
Inaugurado com 10 leitos e equipe de 20 funcionários, a previsão da época era atender entre 100 e 150 pacientes por ano. Quase 60 anos depois, esse número se aproxima de 15 mil novos pacientes a cada ano.
Desde seu início, o hospital caracteriza-se por uma visão progressista, desenvolvendo tecnologia própria e buscando novos tipos de tratamento, como explica a médica. "Meu pai foi um visionário, porque uniu uma equipe multidisciplinar com profissionais de enfermagem, fisioterapia, nutrição, fonoaudiologia, psicologia, terapia ocupacional e assistência social, e criou uma rotina para tratamento do paciente queimado. O foco era totalmente centrado no paciente e na evolução do tratamento".
O amor dos pioneiros pelo tema encontrou continuidade. Na década de 1980, os três filhos do casal - Mônica, Nelson e Thereza - se formaram em Medicina e passaram a atuar junto com o pai.
Mônica Piccolo é a mais velha dos três filhos que seguiram o caminho do pai no atendimento a pacientes queimados (Foto: Divulgação)
Neste mesmo período, Nelson Picolo fundou um instituto com ênfase na cirurgia plástica - principalmente a reconstrutora - fisioterapia e dermatologia. "Tive o privilégio de trabalhar com meu pai por oito anos. Ele faleceu em 1988 e aí então fui fazer minhas residências", conta Monica.
Procedimentos que atualmente são considerados simples no tratamento deste tipo de ferida só foram reconhecidos por meio do trabalho pioneiro de Nelson Piccolo. Além disso, como o número de pacientes do pronto-socorro era muito grande, a unidade de saúde passou a fazer campanhas de prevenção de queimaduras, aumentando, também, o seu caráter educacional.
O Pronto Socorro para Queimaduras trata o paciente agudo até a cicatrização das feridas. Atualmente, 70% dos atendimentos são feitos pelo SUS e o restante, por meio de convênios.
Em 1998 o trabalho de Nelson Piccolo foi reconhecido pela Sociedade Internacional de Queimaduras (ISBI) com a entrega do Prêmio Tanner-Vandeput-Boswick. "Meus irmãos receberam o prêmio em um congresso internacional como uma aclamação pelo tratamento de mais de 300 mil pacientes queimados", lembra a médica.
Nelson Piccolo e Emília Sarto Piccolo na época da fundação do PSQ (Foto: Reprodução)
Outro reconhecimento internacional veio da Associação Americana de Queimadura, com a entrega da Comenda Everett Idirs Evans. "O trabalho do meu pai foi realmente pioneiros. Profissionais de várias partes do mundo vinham ver o serviço que ele fazia aqui desde 1968".
Com o valor do prêmio entregue pelo Simpósio Internacional de Biologia (ISBI) - 100 mil dólares - foi criado o Núcleo de Proteção aos Queimados (NPQ). Logo de início, o Núcleo proporcionou mais de 300 cirurgias reparadoras a pacientes de queimaduras.
"O paciente é atendido no pronto socorro, mas aqueles mais graves precisam dar continuidade ao tratamento. Quando a pessoa não tem condições de pagar pela cirurgia, o NPQ encaminha para a rede pública ou programas de auxílio, porque existe uma carência muito grande de cirurgias reconstrutoras para quem não pode pagar por ela", lamenta Mônica.
De paciente a colaboradora
Uma história de dor e sofrimento foi transformada em luta dentro do Pronto Socorro para Queimaduras. Vítima de um crime de gênero em 1986, Cristina Lopes ressignificou uma tragédia que quase tirou sua vida em apoio a pacientes queimados.
Aos 20 anos, o então namorado ateou fogo em Cristina, quando ela ainda morava em Curitiba (PR). Internada na cidade e com a vida em risco, a família encontrou em Goiânia o tratamento adequado para as graves queimaduras que a educadora física tinha sofrido.
"Você imagina, em 1986 ninguém conhecia direito Goiânia, mas um médico, amigo da família disse que aqui tinha o tratamento que eu precisava para salvar minha vida", lembra Cristina.
Cristina Lopes foi paciente e, depois, fisioterapeuta do Pronto Socorro de Queimaduras (Foto: Divulgação)
Em estado gravíssimo e já desacreditada pelos médicos, Cristina veio para Goiânia e foi recebida na porta do Pronto Socorro para Queimaduras pelo próprio Nelson Piccolo. A sugestão do médico foi um procedimento inovador para a época, com incisão para retirar toda a queimadura e doação de pele para a paciente.
Com os tratamentos adequados, Cristina sobreviveu após um longo período de internação e diversos procedimentos cirúrgicos. "Fiquei mais de dois meses internada, depois passei a vir para Goiânia duas vezes por ano, o que era um conforto pra mim porque as pessoas me viram no leito de morte e quando me encontravam diziam que eu estava ótima", conta.
O trabalho com pacientes que passaram pela mesma situação foi incentivado por Nelson Piccolo. "Eu já era formada em Educação Física, então o doutor Nelson me incentivou a cursar Fisioterapia para montar um centro no hospital. No ano seguinte prestei o vestibular e comecei o curso" rememora Cristina.
Quando se formou, em 1991, voltou para Goiânia e Mônica Piccolo honrou o compromisso feito pelo pai, já falecido, como conta a fisioterapeuta. "Trabalhei no pronto socorro por 23 anos. Em uma época que não havia tão comumente o costume da interdisciplinaridade, eu fazia o papel de fisioterapeuta, mas também de assistência psicológica. Os pacientes me viam, conheciam minha história e encontravam forças para lutar também".
Atualmente, Cristina se define como uma "missionária da queimadura e da causa da mulher", atuando politicamente e em projetos que tratam desses temas. "Eu vivi na pele a queimadura, sei exatamente o que é isso e qual caminho trilhar para ficar menos pior".
Cristina ressalta o respeito que tem pela história construída por Nelson Piccolo e a família. "O Hospital de Queimaduras é pioneiro, uma referência para o Brasil e o mundo nesta área. Foram visionários, verdadeiras almas enviadas para cumprir essa missão de acolher pacientes e desenvolver pesquisas e métodos de tratamento. É uma construção familiar dedicada à queimadura", sublinha.
Nelson Piccolo dedicou sua vida ao trabalho com vítimas de queimaduras (Foto: Reprodução)
E a observação da ex-paciente e ex-colaboradora tem sentido. A dedicação dos fundadores à causa dos pacientes queimados se desdobrou não só nos filhos, mas também nos netos e hoje quatro dos sete descendentes também estão envolvidos na causa.
O orgulho pelo trabalho realizado é característico nas falas e memórias de Mônica. "Meus pais foram muito fortes e nos iluminaram a continuar nesta batalha nesta área, em que você vê a diferença na vida das pessoas. Essa luz eles conseguiram passar para os filhos e que transmitimos para mais da metade dos netos. Esperamos trabalhar ainda por muitos anos", diz, emocionada.
A localização do PSQ é outro ponto ressaltado pela médica. "Eu acho importantíssimo estarmos nessa região, porque é o lugar conde começamos, tem toda uma história. A gente meio que 'brotou' por acaso ali, com tratamento para um paciente que é muito excluído, proporcionando o melhor tipo de atendimento para todos os tipos de pessoas, principalmente as que tem menos recursos financeiros, em um setor considerado hoje de alta sociedade", arremata.
Infelizmente não atendem pelo sus, levei minha filha lá me mandaram pro cais de Campinas e depois fui jogada literalmente no hugol, nisso minha filha já tá sendo debridada a 15 dias sem sucesso! Enfim!