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Nádia  Junqueira
Nádia Junqueira

Nádia Junqueira é jornalista e mestre em Filosofia Política (UFG). / njunqueiraribeiro@gmail.com

Ora, pois!

A pílula da felicidade

A vida que vai além de sorrisos no Instagram | 05.03.13 - 21:18
Goiânia - Vez em quando vêm aos meus ouvidos Chico ou Tom Zé. De um lado, a bailarina. Aquela pessoa que todo mundo gostaria de ser, mas ninguém é. Mas, pior, aquela pessoa que todo mundo tenta se mostrar como sendo, mas não é. Não tem problema na família, nem pereba, irmão zarolho, calcinha velha ou remela. Então me lembro de Tom Zé: a felicidade vai desabar sobre os homens. Acho, inclusive, que vamos nos sufocar com tanta felicidade! Ela vem de cima, de banda, por todos os lados. Afinal, a infelicidade é proibida.

Difícil acreditar que durante 365 dias no ano, por 24 horas, estaremos exalando felicidade. Tudo estará em ordem. Nenhum problema nos afligirá. Mas a ordem é essa: ser feliz! Quem não quer ser feliz? Quem não está tentando ser feliz? Quem não busca felicidade? Mas ledo engano acreditar que só de alegrias se faz um caminho, inclusive, de felicidade.

Recentemente, folheando revistas avulsas por aí, engasguei com duas coisas que li. A primeira foi uma dessas páginas de consulta para “sucesso profissional”. A leitora escrevia que teve depressão e, por isso, foi demitida depois de dez anos no mesmo emprego. Depois tentava vaga em outra empresa e estava com medo de ser questionada sobre a razão da demissão. “Devo dizer que tive depressão?”. “Não, omita essa informação”. Foi essa a sugestão do consultor tão renomado, mas de tão renomado, prefiro não nomear.

Minha cara, o que ele quis te dizer é que é proibido ser infeliz! Mesmo que isso seja fase em sua vida. Ninguém quer gente infeliz! Nem em um trabalho, nem em outro. Nem em casa, nas festinhas de família ou no bar. Não ser feliz é quase uma doença! E pior, pode “pegar”! A ordem, concluo, é esconder o natural. Que temos problemas, que pais morrem, filhos adoecem, casamentos têm fins, traições acontecem. A ordem é superar tudo tomando uma pílula de pirlim pim pim. 

Então entra a outra página de revista que li. Uma psicóloga contava que a maioria absoluta dos pacientes que recebia com depressão ou qualquer outro problema até de ordem mais simples não queria saber de tratamento. Não quer falar dos problemas, não quer enfrentar os defeitos, as dificuldades e, principalmente, os erros. Querem remédios! Isso mesmo. Uma pílula que traga toda a felicidade de volta, sem qualquer enfrentamento.

Assistindo a essa ode à felicidade, lembrei-me uma vez de uma professora (excelente, por sinal) que dizia que odiava aquela felicidade de comerciais de margarina. Que lhe tirava o humor aquela alegria toda da família ao passar uma pasta no pão do café da manhã. Eu me lembrei dela porque, na verdade, recordei dos resmungos de colegas que, depois dessa declaração da professora, lhe chamaram de mal humorada. 

Pois bem, fiquei pensando e continuo a pensar. Mal humorado é um cara muito diferente daquele que admite infelicidades e tristezas. Gente que apetece reclamar da vida, de coisa grande e de coisa pequena (sem parar), que está sempre pronta para mostrar os lados negativos das coisas, lançar olhares blasés e custa a soltar sorrisos espontâneos é muito diferente daquele que admite que não é a bailarina e que, vez em quando, não quer que a felicidade caia como chuva. Esse tipo de gente, simplesmente, não se importa com convivência.

O problema é que ser infeliz tornou-se quase imoral. A minha preocupação, antes, é com uma massa de gente que tem negado o fato de que a vida tem infortúnios. (Sobre isso, já escrevi inclusive aqui). Envergonha-se dos problemas como se fossem desvios de conduta. Escondem a infelicidade e os problemas numa bolsa Miu Miu, num carro zero, numa foto de um risoto ou de uma cerveja na beira da piscina postados nos Instagram. Sim, quase me afogo em tanta felicidade nas redes sociais.

A busca pela felicidade, portanto, pressupõe combater todo sentimento que há de negativo em nosso interior. Angústias, tensões, desilusões, decepções e, por que não dizer, ciúmes e inveja. Todos esses sentimentos devem ser negados, combatidos, vencidos para que, enfim, a felicidade vença. Que tomemos remédios para combatê-los! Sejam eles pílulas recomendadas pelo médico, sejam nossos pequenos prazeres cotidianos. E, sobretudo, que saibamos omitir. Para a família, para os amigos, numa entrevista de trabalho e, até mesmo, para o psicólogo. “Apenas um remédio, por favor”, como quem pede uma dose de conhaque ao garçom. 

O caminho, questiono, não seria ouvir o que esses sentimentos têm a dizer? Não seria tentar compreender quais problemas eles indicam? Admitir as fraquezas, os problemas e as tristezas não seria o primeiro passo para que elas, quem sabe, pudessem ser resolvidas? Bom, é no mínimo desagradável estar de frente com aquilo que não te traz prazer. Mas desumano acreditar que isso não te pertence. Sobre-humano crer que remédios vão curar.  

Isso tudo implica em um simples sentimento: respeito por tudo que você sente e acontece em sua vida. Respeitar perdas, desilusões, mudanças e rasteiras. Sem pressa para ser feliz. Porque felicidade não vem numa pílula e viver é muito mais complicado que estampar sorrisos no Instagram.  

Comentários

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  • 08.03.2013 17:15 jordana frauzino lima

    Amei seu texto! A vida como ela é!

  • 07.03.2013 12:42 Jales Naves

    Excelente texto, Nádia. Parabéns! A psicoterapia e psicanálise ainda são muito subvalorizadas e definitivamente trariam indiscutíveis benefícios àquelas pessoas que as procurassem. Não apenas para desaguar seus dissabores cotidianos, mas como também rever a forma de encará-los. Sobre a depressão, ponto delicado esse que a Regina Célia abordou. De fato, a generalização é um problema (uma vez que há diversos estágios e manifestações da doença) e sempre se requer muito cuidado ao tratar de assuntos como esse. Só gostaria de tecer uma crítica. Ao ler a chamada "A Pílula da Felicidade", logo imaginei que seria um daqueles textos que abominam o uso de medicamentos e acabam jogando a responsabilidade do desenvolvimento da depressão em cima dos depressivos (o que também é um grande equívoco), caracterizando-os como pessoas fracas e sem força de vontade, já que "não tem" resiliência para resolver seus próprios problemas e ficam "tristinhos". Depois que li o texto, sanou-se a dúvida, e concordo com seus pontos sobre gente super feliz no Instagram. Novamente, excelente texto!

  • 07.03.2013 10:07 Ana Cristina Martins Reis

    Texto perfeito... aliás, perfeito é pouco pra classificá-lo... traduziu o meu momento pessoal em que precisei me recolher do mundo e as pessoas não entenderam o porque... como é bom saber que outras pessoas compartilham da mesma ideia de que felicidade demais o tempo todo é sinal de que alguma coisa está errada...

  • 07.03.2013 09:53 Jerônimo Venâncio

    Ser feliz ou triste, mas ser, de verdade!! Adorei Nádia!Beijos

  • 06.03.2013 17:05 Barbara Cristina Mendes

    Nádia estava com saudades dos seus textos! Não suma mais hein! Entendi perfeitamente seu ponto de vista que diz que as pessoas devem enfrentar as coisas difíceis e infelizes que acontecem na vida de todos nós.

  • 06.03.2013 15:02 Jéssica Neves

    Texto incrível.

  • 06.03.2013 11:46 Nádia Junqueira

    Milton César, certamente das melhores coisas em se ter uma coluna é a oportunidade que temos em "lançar" assuntos e termos de volta compartilhamentos de experiências e conhecimentos que valem à pena. Obrigada por partilhar! Muito interessante e uma verdadeira aula! Abraço pra você também! Regina Célia, também agradeço seu ponto de vista. Citei a depressão apenas porque foi a psicóloga - cujo depoimento li - se referia a ela. Sei dos desafios e dificuldades da doença e, claro, como uma doença, acredito na importância da medicação acompanhada de terapia. Mas, como pôde ver, não me referia à depressão no texto. Como escrevi, minha preocupação é com uma massa de gente, pessoas que não têm depressão, mas que, como humanas, são acometidas por infelicidade e não sabem lidar com isso. Não me refiro a doenças psíquicas, me refiro a um viver em que tristeza e infelicidade são coisas naturais, mas tratadas de formas anormais. Abraço!

  • 06.03.2013 11:01 Milton Cesar Ferlin Moura

    FELICIDADE Como buscamos a felicidade? Algumas perguntas são importantes para que as respostas guiem nossos comportamentos. Alguns pesquisadores tentaram encontrar uma "fórmula" elegante que represente a almejada felicidade. Após um estudo bem orientado e com um bom segmento, conseguiram encontrar 3 fatores essenciais para a felicidade. Quais são esses três fatores? Vamos à fórmula: Felicidade = Fator pre-estabelecido + condições de vida + atividades voluntárias. Ainda não é a última palavra na compreensão do que vem a ser a felicidade, mas, sem dúvida, um ponto de partida para muitas considerações. A felicidade, se considerarmos uma unidade (100%), pode ser fracionada nesses fatores acima expostos. Segundo esses pesquisadores, o fator preestabelecido assume uns 40% na responsabilidade pela "aquisição" da felicidade. As condições de vida tem uma importância de apenas 10% para "encontrarmos" a felicidade e já as atividades voluntárias representam 50% dentre os fatores que levam ao tão desejado estado de felicidade. Acreditamos que realmente nascemos para vivenciar a felicidade. Por que, então, conseguimos vivenciar apenas ligeiros flashs de um estado interior de paz, tranquilidade, estado de graça, plenitude, completude, realização e etc? O que está "errado" com o buscar a felicidade? Será que a buscamos da forma correta? A análise está longe de ser simples, porém já somos portadores de várias "pistas" que levam a uma conclusão inevitável: a felicidade é um "estado" interior. Por que então a buscamos no exterior? Analisando a "fórmula da felicidade" o primeiro fator exposto trata-se daquilo que já é pre-estabelecido desde o nascimento. O determinismo genético na formação dos padrões de disparos de neurônios que determinariam a capacidade de sermos felizes ou não. Eles atribuem uma importância de cerca de 40% a esse fator e não estão equivocados quanto a isso. Realmente trazemos uma determinada "carga genética" com as informações contidas dentro dessa "biblioteca" que traduzem uma experiência "milenar" da consciência em evolução. Estamos em constante e ininterrupta evolução. Porém, esse determinismo genético necessita ser revisto! Caso contrário o estado de felicidade já está naturalmente determinado e você nada pode fazer com relação a isso. Há controvérsias!! A todo instante estamos vivenciando situações difíceis diferentes. Pessoas que estão felizes interpretam tais situações como oportunidades e a infelizes como problemas. Sabemos hoje, através dos avanços da neurociência, que as crianças possuem os chamados neurônios espelhos que disparam quando observam adultos em ação. Vejam a importância do exemplo! Quando crianças estão cercadas de pessoas felizes há uma grande chance de essas mesmas crianças reforçarem os circuitos da felicidade em seu cérebro. Quando crianças estão cercadas por adultos infelizes há uma grande chance desses bebes reforçarem as redes neurais que traduzem a infelicidade. Se houvesse um determinismo genético com relação a isso nada poderia influenciar a formação de novos circuitos e novas redes de disparos de neurônios. As drogas influenciam e geram estados alterados da consciência. A terapia cognitiva é capaz de mudar crenças limitadoras e despertar estados de felicidade. A própria meditação modifica a região pré-frontal do cérebro e altera o humor por liberar neurotransmissores que fazem a mediação de estados compatíveis com a felicidade. Liberam a dopamina, ocitocina, serotonina e etc. O segundo fator levantado pelos pesquisadores são as condições de vida. Todos acreditam que saindo de uma condição ruim para uma boa condição a felicidade será encontrada. As pesquisas não corroboram essa observação. Pessoas que entraram em êxtase após ganharem na loteria, após um ano eles já se encontravam no mesmo patamar de felicidade que estavam antes de ganharem. Após cinco anos, referem um estado até pior que antes de ganharem na loteria. Eles não souberam lidar com uma situação estressante, mesmo sendo essa situação impregnada de impressões de felicidade. O contrário também é válido. Pessoas que foram vítimas de tragédias, mortes, acidentes que levaram a paraplegia, tinham todas as razões para serem infelizes. A capacidade de superação que todos nós possuímos para enfrentar e superar adversidades fazem com que em pouco tempo, essas pessoas alcancem um patamar de felicidade compatível ao que eram antes do evento trágico. Todos nós possuímos uma certa resiliência emocional capaz de adaptação a qualquer situação externa. Talvez seja esse o motivo que as condições de vida interfirem tão pouco com o estado de felicidade. O terceiro e mais expressivo fator da fórmula da felicidade, com um contribuição de 50%, são as ações voluntárias. Aquilo que escolhemos para fazer no dia a dia. As escolhas voluntárias que acreditamos nos direcionar para a aquisição de um estado de felicidade. A grande maioria absoluta das pessoas escolhem algo relacionado ao prazer pessoal. Ir ao cinema, uma boa refeição, viagens e etc. Essas escolhas trazem realmente algum benefício, porém é instantâneo e passageiro. Dura cerca de alguns dias e há um declínio posterior. Outras escolhas que envolvem uma certa criatividade são as escolhas que fazemos em benefício de outras pessoas. Segundo os pesquisadores, as ações que realizamos na tentativa de proporcionar o bem a outras pessoas traz um efeito mais duradouro. Buscamos a felicidade no exterior? Talvez ai esteja realmente a dificuldade em estar pleno e em paz por muito tempo. Tempo? Há uma identificação do SER com a mente. Ou estamos presos ao passado ou nos colocamos em um ponto futuro. Ansiedade, stress, qualquer tipo de medo, intolerância, é quando a consciência está fixa em um ponto futuro e não vivencia o presente. Arrependimento, culpa, estagnação é quando estamos presos no passado e também distante do momento atual presente. A felicidade está no SER e o SER está no sempre momento presente. O "tempo psicológico" impede o SER de se manter presente e encontrar a felicidade. Olhe esse momento agora! Você vê problemas? Não. Os problemas estão ou no passado ou no futuro, ou seja, no tempo psicológico e não no tempo pragmático vivenciado pelo relógio. Quando passamos a tentar viver o momento presente com mais "presença" temos uma maior oportunidade de dissolver o passado definitivamente e "cultivar" um futuro mais promissor. Apenas focando a atenção na plenitude do SER no momento atual e presente. Milton (médico cardiologista) Abraços fraternos

  • 06.03.2013 09:21 Regina Célia

    Bem se vê que a autora do texto nunca teve depressão e nem convive de maneira de próxima com quem a tenha. Para seu conhecimento, a depressão não é "uma fase", "um momento de infelicidade passageira", mas uma doença, mundialmente reconhecida e classificada como tal, altamente incapacitante e para a qual o uso do medicamentos é imprescindível para o êxito do tratamento. Depressivos que recusam a psicoterapia e preferem os medicamentos não fazem isso porque "não querem enfrentar suas dores, problemas, tristezas", mas porque estão tão sem autoestima e força, que só querem que aquela dor imensa acabe logo. É difícil e muito penoso. Sugiro que você leia mais sobre o assunto e se informe, antes de querer falar de um tema tão espinhoso como este. Para alguém que se diz graduada em Jornalismo e graduanda em Filosofia, fazer juízo de valor do comportamento de gente doente é imperdoável.

  • 06.03.2013 08:08 Helen Fernanda

    Vou ali no Google pesquisar o que é "bolsa Miu Miu". Nome engraçado. kkk

  • 05.03.2013 21:52 Muriel Gondim

    Parabéns pelo texto, Nádia! Adorei! Me fez lembrar de um professor que também criticava essa felicidade de comercial de margarina! hehe Um abraço!

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Nádia Junqueira é jornalista e mestre em Filosofia Política (UFG). / njunqueiraribeiro@gmail.com

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