José Cácio Júnior
"Quem não usa pesquisa qualitativa está perdido". É a opinião do presidente do Instituto Vox Populi, João Francisco Meira, sobre a importância da realização das pesquisas qualitativas em um processo eleitoral.
Palestrante do Seminário de Pesquisa Qualitativa - Técnica, ética e usos em campanhas eleitorais, organizado pela Universidade Federal de Goiás (UFG), Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) e pelo Instittuo Verus, Meira explicou que uma pesquisa qualitativa serve para definir duas vertentes de uma campanha: a agenda dos debates e quem deve participar da disputa eleitoral.
Em entrevista ao jornal A Redação, Meira comenta as divergências sobre a divulgação das pesquisas eleitorais e sugere mudanças no formato do programa eleitoral gratuito veiculado em rádio e TV. Confira a entrevista.
A Redação: Qual a diferença entre a análise de jornalistas e pesquisadores sobre uma pesquisa eleitoral?
João Francisco Meira: Quando existe uma boa interação entre jornalistas e pesquisadores os resultados são interpretados corretamente. Às vezes acontece um distanciamento e isso pode atrapalhar. A pesquisa retrata um determinado momento da campanha. São números que significam atitudes, tendências. Por serem números, parecem uma linguagem matemática. Mas se trata de uma estatística. É um símbolo de uma tendência, de um comportamento mensurado naquele momento. Os limites desta interpretação estão ao alcançe do pesquisador, mas não estão ao alcançe do jornalista. O jornalista pode, eventualmente, fazer uma interpretação além ou aquém do que os dados permitem. Isso às vezes causa ruído. Mas o que atrapalha mesmo é quando jornalista e pesquisador não conversam. Havendo o diálogo esse tipo de questão é resolvido facilmente.
Quem repercute melhor uma pesquisa: o público, seja ele geral ou especializado; ou os formadores de opinião?
As pesquisas, quando bem publicadas pelos veículos, provém informações relevantes tanto para os formadores de opinião — eu estou tratando formadores de opinião como pessoas que se interessam por política e conversam sobre o assunto com outras pessoas — quanto ao público. As pesquisas oferecem informações valiosas, um reflexo de um conjunto do eleitorado perante aquele processo. Não precisa ser de eleição especificamente, pode ser de uma opção de um governo. Na minha opinião, o dever de divulgação correta de uma pesquisa é dos veículos de comunicação.
Quem é de fato o formador de opinião e quanto ele influencia na opinião pública?
Formador de opinião é um critério sociológico definido por dois elementos: interesse, que significa busca de informação adicional; e conversação, que nada mais é do que o ato de se comunicar com outras pessoas a respeito de determinado assunto. Como futebol, onde todo mundo tem um amigo que gosta e sabe mais sobre o que está acontecendo com o Goiás, Vila Nova, Atlético Goianiense, por exemplo. Tem um formador de opinião a respeito de vinho. Você gosta e não entede muito, mas tem um amigo seu mais interessado nesse assunto. E tem formador de opinião em política. As pessoas tem uma agenda de interesses diferenciada. Política é interessante para mim, para você, mas não é para todos. Essa é uma das maneiras, que chamamos de atalho cognitivo, pelas quais as pessoas que não têm tanto interesse por política, procuram mais informações, pois mais na frente terão que votar. Durante o processo eleitoral é que os formadores de opinião podem exercer o seu papel.
O sr. disse que é a favor de mudança no horário eleitoral, diminuir o tempo de propaganda na TV para ter mais tempo de debate entre os candidatos. Daria certo?
Eu acredito que o componente racional funciona melhor quando se tem uma situação de debates. Mas os debates são muito frios no Brasil porque as regras são muito chatas. Os debates são muito amarrados. Como se tem muito candidatos e a legislação diz que todos precisam participar, o debate fica muito ruim. Se tivesse um sistema em que candidatos menos relevantas debatem um determinado plano e candidatos mais relevantes discutissem em outro plano e que o debate fosse mais solto, isso funcionaria melhor. E ajuda o eleitor a conhecer os candidatos.
O sr. falou durante a palestra que os spots (jingles) dos candidatos são mais eficazes que o horário eleitoral gratuito. Por que isso chama mais a atenção do eleitor?
O anúncio curto, que a gente chama no jargão de spot, e os clipes de televisão são semelhantes à linguagem da propaganda comercial. Eles usam elementos de imagem, cor, movimento e emocionalidade mais característicos da linguagem típica dos intervalos comerciais com os quais o eleitor já está mais acostumado. Já o horário eleitoral gratuito tem uma gramática e estrutura que são excepcionalidade no fluxo da programação racional. Isso exige uma atitude racional do eleitor em relação àquilo. Ele tem que interromper o fluxo de atenção para assistir aquele blocão do horário eleitoral. E isso muda a atitude básica. Quando você está assistindo uma novela e passam anúncios nos intervalos, inclusive os políticos, te pega em um nível de atenção mais subliminar.
Funciona também por mexer com o inconsciente do eleitor?
Sim, pois são mecanismos que podem ser muito mais eficazes se forem usados corretamente. Não estou dizendo que todos funcionam. A propabilidade de que eles funcionem é muito mais alta que o horário eleitoral gratuito.
O Lula Lá é o spot de maior sucesso até hoje?
O clássico da propaganda eleitoral no Brasil continua a ser, na minha opinião, a eleição de 1989. Principalmente nas figuras do Fernando Collor e do Luiz Inácio Lula da Silva. Independentemente do que tenha acontecido depois da eleição, foi uma campanha memorável, pois estabeleceu os parâmetros da comunicação política moderna no Brasil. Eram duas visões de futuro, de como deveria ser o Brasil. E duas formas de lidar com os desafios, temores, preocupações e esperanças dos brasileiros. Essas duas campanhas, para quem assistiu, marcaram muito. Mas existem outras campanhas importantes pelo Brasil. Aquela ideia do coração criado pelo Duda Mendonça para a campanha do Paulo Maluf ao governo de São Paulo em 1990. O Duda criou o coração trabalhando a emoção. A campanha do Tancredo Neves, no período das Diretas Já, em 1985. Apesar de o eleitor não participar diretamente, a campanha mobilizou muito as pessoas. Têm muitos momentos em que a emoção regeu e pautou a opinião pública em temas que mexeu mais com o coração do que com o cérebro. A única campanha mais cerebral que tivemos foi a do Fernado Henrique Cardoso (PSDB) em 1998 para presidente da República, já que as pessoas votaram mais com o bolso do que com o coração por causa do Plano Real.