Samuel Straioto
Goiânia - Um total de 246 obras públicas federais está paralisado em 122 municípios de Goiás, conforme levantamento da Confederação Nacional dos Municípios (CNM). As construções, financiadas com recursos da União e sob responsabilidade das prefeituras, abrangem áreas como educação, saúde, habitação e infraestrutura urbana.
O levantamento teve como objetivo mapear a situação de obras sob responsabilidade das gestões municipais que se encontram paralisadas, inacabadas ou formalmente suspensas. Os dados foram coletados a partir de três bases oficiais: o Painel de Obras do Transferegov, do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI); o portal do Programa Minha Casa, Minha Vida, do Ministério das Cidades; e o Sistema de Monitoramento de Obras (Sismob), que reúne as construções da área da saúde.
Segundo a CNM, Goiás responde por cerca de 4% do total nacional de obras federais paralisadas, que somam 4.849 empreendimentos em 2.202 municípios brasileiros. No Estado, o maior número de obras inacabadas está na área da educação, com 66 unidades suspensas em 50 cidades. Em seguida, aparecem os setores de infraestrutura urbana e saneamento, com 64 projetos parados em 27 municípios, habitação, com 42 empreendimentos em 35 cidades, e saúde, com 44 obras suspensas em 30 localidades.
Essas construções, iniciadas por meio de convênios firmados entre os municípios e o governo federal, abrangem escolas, creches, unidades básicas de saúde, sistemas de esgoto, pavimentações, conjuntos habitacionais e outros equipamentos públicos. Todas dependem de transferências da União para serem concluídas. O levantamento aponta que grande parte dos empreendimentos enfrenta problemas como atraso de repasses, dificuldades técnicas na execução e interrupções contratuais por parte das empresas contratadas.
A CNM estimou que o valor médio de cada obra paralisada no país é de R$ 10,5 milhões. Embora esse número represente uma média nacional, ele serve como referência para medir o impacto financeiro da estagnação. Aplicando esse parâmetro ao total de projetos inacabados em Goiás, o montante estimado de recursos investidos sem retorno chega a R$ 2,5 bilhões. Na área da habitação, por exemplo, os 42 empreendimentos goianos parados somam R$ 73 milhões empenhados, dos quais R$ 66,7 milhões ainda não foram repassados às prefeituras.
De acordo com o engenheiro Alessandro Rios, especialista em obras públicas, o principal entrave é a fragmentação dos repasses. “Essas obras costumam ser financiadas em etapas. Quando o pagamento de uma parcela atrasa, o cronograma trava e o município não consegue manter o andamento com recursos próprios”, explica. Segundo ele, o problema é agravado quando o contrato entra em processo de distrato e a estrutura já iniciada fica exposta à deterioração.
Na avaliação do consultor em políticas públicas Eduardo Martins, que já atuou no Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a situação reflete falhas nos mecanismos de planejamento e controle. “Não há uma política de continuidade. As prefeituras assinam os convênios, iniciam a obra, mas os repasses não acompanham a realidade de execução. Faltam previsibilidade e garantias institucionais de entrega”, afirma.
O cenário se repete em todo o país. Segundo o relatório, os recursos totais envolvidos nas obras paralisadas ultrapassam R$ 51 bilhões. Desses, cerca de R$ 20,9 bilhões ainda não foram efetivamente transferidos às gestões locais. Com correção monetária, esse volume pode chegar a R$ 42 bilhões a serem pagos pelo governo federal para permitir a continuidade dos projetos.
Nas áreas de educação e saúde, os impactos são diretamente sentidos pela população. Em muitos municípios goianos, escolas e postos de saúde permanecem com estruturas erguidas pela metade, sem condições de uso e sem previsão de conclusão. Em alguns casos, as obras foram iniciadas há mais de uma década.
A CNM também alerta para o risco de que muitas dessas obras sejam oficialmente canceladas, o que pode obrigar os municípios a devolverem parte dos recursos recebidos. No caso das 911 obras de educação paradas no Brasil, por exemplo, os gestores locais teriam que restituir aproximadamente R$ 426 milhões ao governo federal, caso não haja regularização.
Diante desse cenário, especialistas apontam a necessidade de uma política nacional de retomada estruturada, com definição de critérios técnicos, prazos e garantias de repasse. O Ministério das Cidades lançou recentemente o Pacto Nacional pela Retomada de Obras da Educação Básica, mas sua abrangência ainda não contempla todos os projetos parados.
Enquanto isso, prefeitos e secretários municipais continuam enfrentando as consequências da estagnação: estruturas inacabadas, perda de recursos, bloqueio para novos convênios e desgaste político com a comunidade local. A retomada depende, em grande medida, de uma articulação entre União, estados e municípios — e, sobretudo, de um compromisso orçamentário que dê viabilidade ao que já foi iniciado.
Tabela – Municípios goianos com obras federais paradas, por área
Área |
Quantidade de Municípios |
Educação |
50 |
Saúde |
30 |
Habitação |
35 |
Infraestrutura e outras |
27 |
Total consolidado |
122 |