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Força produtiva

Qualificação em IA fortalece a indústria e revela novos líderes em Goiás

Conhecimento vira diferencial no mercado | 02.08.25 - 15:10 Qualificação em IA fortalece a indústria e revela novos líderes em Goiás Qualificação em IA tem garantido cada vez mais espaço aos profissionais no setor industrial em Goiás e no Brasil (Foto: reprodução)
Adriana Marinelli

Goiânia -
 Em meio a um cenário global de avanços tecnológicos acelerados, o Brasil desponta entre os protagonistas na adoção da Inteligência Artificial (IA), especialmente dentro das indústrias. A transformação digital que já remodelava processos produtivos ganhou novo fôlego com a popularização da IA, e os brasileiros, além de acompanharem essa tendência, parecem liderá-la. Dados do Instituto Ipsos, em parceria com o Google, revelam que 54% da população do país já fez uso dessa tecnologia, índice que supera a média global de 48%. No chão de fábrica e nos centros de decisão corporativa, a adesão se mostra ainda mais acelerada. Um levantamento da consultoria McKinsey indica que, em 2024, 72% das empresas em todo o mundo, incluindo as do setor industrial, já incorporaram soluções de IA em suas rotinas, um salto significativo em relação aos 55% registrados no ano anterior.
 
Em Goiás, os reflexos dessa transformação podem ser medidos mesmo em meio a um cenário nacional cercado por instabilidades macroeconômicas e juros elevados que, muitas vezes, inibem investimentos. A indústria local cresceu 1,6% no primeiro trimestre de 2025, conforme aponta o boletim da Conjuntura Econômica do Instituto Mauro Borges (IMB). O destaque ficou por conta da construção civil, que avançou 5,3% no período. Por trás desses números, há um movimento liderado por profissionais altamente qualificados que apostam na inovação, especialmente na IA, para acelerar decisões, reduzir desperdícios e elevar a produtividade.

 
Quem traduz bem essa nova realidade da indústria goiana é o engenheiro civil Romeu Neiva, de 37 anos. Fundador da Coordly e diretor da DIM Inteligência em Projetos, duas startups goianas voltadas à indústria da construção civil, Romeu vem sendo um dos expoentes das chamadas Indústria 4.0 e Indústria 5.0 no Estado. Seu trabalho, hoje focado em soluções com IA, teve início em 2017, a partir de recursos obtidos no Edital de Inovação Senai Sesi, iniciativa que fomenta o desenvolvimento de projetos tecnológicos voltados para a competitividade da indústria brasileira.
 
Desde então, ele e sua equipe têm explorado o potencial da IA para modernizar um setor que, como o próprio engenheiro destaca, sempre foi resistente à inovação. Ou, ao menos, costumava ser. A principal aposta é a combinação entre Inteligência Artificial e a metodologia BIM (Building Information Modeling), que digitaliza e integra todas as informações de um projeto. “Antes de iniciar uma obra, por exemplo, você precisa centralizar as informações e fazer com que todos os profissionais envolvidos estejam consultando os mesmos dados. A plataforma com a IA promove essa centralização, tornando o processo mais eficiente. Facilitamos uma metodologia que já é muito usada no setor, o BIM”, explica Romeu.
 
O profissional destaca que a IA funciona como um “cérebro digital” capaz de aprender com os dados de projetos anteriores, sugerindo decisões mais inteligentes e rápidas. Essa tecnologia permite, entre outras coisas, prever falhas, indicar erros de compatibilidade entre os projetos de diferentes áreas, como arquitetura e engenharia, e evitar prejuízos com retrabalho. “Com a metodologia BIM aliada à inteligência artificial, conseguimos detectar, ainda na fase de projeto, que uma viga de concreto iria passar exatamente onde o arquiteto colocou uma janela. Ou que uma tubulação está prevista para cruzar uma viga”, exemplifica.
 
Esses diagnósticos antecipados, segundo Romeu, são decisivos. Em um caso recente em Goiânia, a plataforma da Coordly evitou a execução equivocada de uma piscina, projetada com base em informações desatualizadas. “Quanto mais cedo a tecnologia entra no processo, maior a eficiência e menores os riscos”, avalia Romeu.

Parte de apresentação de um projeto real cedido por Romeu e que usa inteligência artificial para prever possíveis erros na construção civil (Foto: Coordly)
 
Hoje, o trabalho de Romeu e de outros especialistas em IA é considerado vital para que pequenas e médias empresas do setor industrial consigam competir em alto nível. Segundo ele, o uso das ferramentas chega a reduzir em até 35% o desperdício e o retrabalho em obras. “Isso ainda otimiza o tempo do profissional, sem substituí-lo", ressalta, ao destacar que a IA não veio para substituir pessoas, mas para turbinar decisões e dar previsibilidade ao que antes era instável.



Sobre os investimentos a serem feitos para conseguir acesso a sistemas com IA, o CEO garante que há no mercado opções para os mais variados perfis. A plataforma conduzida por Romeu, por exemplo, oferece desde um plano gratuito, ideal para pequenas e médias indústrias, até modelos personalizados em white label, que permitem que outras organizações incorporem a solução com sua própria identidade.
 
Agora, Romeu se prepara para uma nova etapa. É que ele e os sócios vão participar do Edital Smart Factory, promovido pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), que busca testar tecnologias da Indústria 4.0 diretamente em ambientes reais, especialmente em micro, pequenas e médias empresas.  
 
Com a Inteligência Artificial cada vez mais presente em todas as etapas da cadeia produtiva, do planejamento à execução, cresce também a necessidade por profissionais capazes de unir conhecimento técnico, visão estratégica e domínio das novas tecnologias. É nesse contexto que a busca por formação especializada ganha força. Em Goiás, a Faculdade de Tecnologia Senai  (Fatesg) tem desempenhado um papel central nesse movimento, ampliando a oferta de cursos voltados à IA para atender à crescente demanda do setor.
 
A instituição, que integra a estrutura da Federação das Indústrias do Estado de Goiás (Fieg), oferece hoje programas em diferentes níveis (graduação, pós-graduação e cursos de aperfeiçoamento) com foco no desenvolvimento de competências voltadas à aplicação prática da tecnologia. Só em 2024, mais de 300 alunos passaram pela graduação, 620 pela pós-graduação e cerca de 4,5 mil participaram de cursos de curta duração, com destaque para os conteúdos relacionados à IA.
 
“O momento é da inteligência artificial”, afirma Roberto Teruo Kobayashi, supervisor técnico da Fatesg. Segundo ele, a tecnologia já está sendo introduzida em praticamente todos os cursos da instituição, mas há formações específicas voltadas para quem deseja se aprofundar no tema, como o curso superior de Tecnologia em Inteligência Artificial. “Temos alunos que chegam já com interesse em inteligência artificial e outras tecnologias, mas temos aqueles alunos também que chegam com outro tipo de interesse e acabam despertando vontade de conhecer mais sobre essas novas tecnologias”, pontua.
 
A trajetória da formação voltada à IA na Fatesg mostra um crescimento constante. “A primeira turma com foco em IA, por exemplo, contava com 25 alunos. Finalizamos a terceira turma recentemente e já era maior, cerca de 45 alunos”, destaca Kobayashi. 
 
Nos cursos de aperfeiçoamento, boa parte do público já chega em busca de conhecimento para aplicar a IA em seus próprios contextos profissionais. Praticamente metade dos inscritos em 2024 buscou capacitação para aplicar a inteligência artificial no setor industrial ou em outras áreas produtivas. E esses cursos têm se mostrado uma excelente porta de entrada para quem deseja explorar novas possibilidades. “Os cursos de curta duração são bons para despertar interesse das pessoas em determinados assuntos, incluindo IA. Os profissionais começam a entender que a tecnologia pode fazer muito por ele e aí se interessam em aprofundar no assunto. Temos, por exemplo, MBA com foco em IA. Aí ensinamos como usar a tecnologia para a gestão de qualidade, comércio eletrônico e por aí vai”, acrescenta.

 
Para Kobayashi, investir na formação é uma resposta prática à transformação que a IA está provocando no mercado de trabalho. “Entender e apostar nesse conhecimento em IA é essencial. Primeiro tem aquele receio: ‘Ah, a IA vai tomar meu emprego’, mas, na verdade, vai ser como aconteceu nas outras revoluções industriais. Enquanto alguns enxergam pelo lado de que vai fechar postos porque automatizou processos, outros enxergam que as organizações vão precisar de pessoas que dominem esse mercado para trabalhar com isso. E é aí que entra a capacitação. É extremamente importante que os profissionais estejam familiarizados com a tecnologia”, enfatiza.
 
Quem já entendeu a nova lógica do mercado e buscou capacitação para atuar nesse cenário foi Marcelo Carneiro Moraes. Bacharel em Geografia pela PUC Goiás, ele atualmente cursa Tecnologia em Inteligência Artificial na Faculdade Senai Fatesg e já colhe os frutos da escolha. Marcelo é um dos responsáveis pela GHydro, startup que desenvolve soluções de IA para otimizar a gestão de irrigação na produção agrícola, uma das pontas mais estratégicas da cadeia industrial da Kraft Heinz, gigante do setor alimentício que mantém fábrica em Nerópolis (GO), uma das áreas agrícolas mais férteis do país.
 
Marcelo atua diretamente na etapa de produção de insumos da indústria. Com o apoio da IA, a GHydro desenvolve uma tecnologia capaz de transformar a maneira como os produtores de tomate, milho e pepino, fornecedores da Kraft Heinz, manejam a irrigação em suas lavouras. “A indústria buscava um projeto para auxiliá-los na economia da água ou para melhorar a gestão dessa água usada na produção dos insumos”, relata. 

Tecnologia com IA revoluciona irrigação de lavouras de tomate, milho e pepino (Foto: GHydro)
 
A inovação apresentada por Marcelo une hardware e software. Isso porque sensores de umidade do solo instalados nas plantações coletam dados em tempo real e os enviam a um servidor em nuvem, onde algoritmos de inteligência artificial realizam cálculos cruzando informações sobre umidade, clima e previsões meteorológicas. A partir disso, o produtor recebe, diretamente em seu celular, instruções precisas sobre quando ligar ou desligar o pivô central de irrigação. "Nossa solução otimiza o manejo da irrigação, garantindo uma umidade adequada à cultura e, ainda, gera economia de energia elétrica. Hoje, o mais comum é aproveitar a tarifa reduzida durante a noite e irrigar por 8 ou 9 horas nesse período, o que, muitas vezes, excede o necessário", explica Marcelo.
 
A proposta, além de aumentar a produtividade e reduzir custos, responde à preocupação ambiental da Kraft Heinz, que mantém um compromisso com boas práticas ESG, sigla em inglês que significa environmental, social and governance, e corresponde às práticas ambientais, sociais e de governança de uma organização. A IA desenvolvida pela GHydro evita desperdícios e ajuda a preservar recursos naturais, ao mesmo tempo em que amplia a assertividade no manejo da lavoura. “O produtor terá em seu bolso, através de seu celular, informações e respostas instantâneas onde estiver, não necessitando de se deslocar até a lavoura ou destinar um outro colaborador para fazer isso, podendo aproveitar melhor o tempo e sua mão de obra”, destaca.
 
Durante o processo de desenvolvimento, Marcelo e a equipe da GHydro identificaram situações reais que evidenciam a importância da tecnologia. Em uma das visitas de campo, o sistema detectou que um pivô, que deveria estar em funcionamento, estava desligado sem o conhecimento do produtor, uma falha que, segundo o profissional, poderia comprometer toda a produção por falta de irrigação no momento correto. Com a nova tecnologia, falhas como essa passam a ser detectadas automaticamente. “O nosso equipamento, configurado com IA, avisa se o pivô está funcionando, se parou, se não parou... Você vai economizar energia elétrica e água, porque ele só aciona nos momentos em que realmente é necessário”, detalha.

 
Além da economia de recursos e da precisão operacional, a solução oferece um painel digital completo com mapas, dados de solo, condições do clima e funcionamento dos pivôs, permitindo que o produtor monitore tudo remotamente, inclusive em propriedades com múltiplas áreas irrigadas. O objetivo da GHydro é, futuramente, integrar essa automação de forma completa, acionando o pivô automaticamente a partir da decisão calculada pela IA.
 
“Mesmo que o solo esteja acusando que precisa ligar o pivô, a IA pode cruzar os dados com a previsão do tempo e indicar que há probabilidade de chuva nas próximas horas. Com isso, ela pode decidir por esperar, evitando o acionamento desnecessário da irrigação. Isso é gestão inteligente de verdade”, resume Marcelo.
 
O projeto da GHydro, em parceria com a Kraft Heinz, é exemplo real de como o conhecimento adquirido nas salas de aula da Fatesg se traduz em soluções concretas, com aplicação direta na cadeia produtiva industrial. É também um retrato da nova geração de profissionais que alia ciência de dados, sensibilidade ambiental e visão estratégica para reinventar processos com o uso da IA. 
 
A formação de profissionais capacitados em Inteligência Artificial começa, muitas vezes, bem antes da entrada no mercado de trabalho. No caso das escolas do Serviço Social da Indústria (Sesi) em Goiás, por exemplo, essa formação tem início ainda na infância. Com 17 unidades em funcionamento no estado, sendo quatro em Goiânia, a rede atende 13 mil alunos, desde a educação infantil até a Educação de Jovens e Adultos. A IA, ali, já é uma realidade no dia a dia das salas de aula, presente nos conteúdos e no próprio planejamento pedagógico.
 
“Inicialmente, trabalhamos a conscientização e desmistificação do que é IA e de como ela pode ser utilizada, tanto para alunos quanto para a equipe gestora e professores”, explica Diego Freire, gerente de Educação Básica do Sesi. “Após isso, temos utilizado a IA no planejamento das aulas, na avaliação de processos educacionais, para ter insights que são importantes, para adaptação de materiais para alunos que possuem qualquer tipo de déficit de aprendizagem ou qualquer tipo de comodidade apresentada. Então, ela tem sido utilizada como uma parceira para agilizar os processos.”
 
Segundo Freire, a IA já está incorporada ao cotidiano pedagógico de forma transversal. “Utilizamos em todas as atividades curriculares, não é algo específico”, afirma, ao destacar que o uso da tecnologia vai além do suporte técnico. “Desde a elaboração de matérias de aula, com base em uma metodologia aplicada, de forma a entender que a IA é, de fato, esse parceiro no processo e que ela não substitui o professor. O professor se torna um curador desse conteúdo, um profissional que trabalha o senso crítico dos alunos sobre o material desenvolvido.”

Unidades do Sesi Goiás, que já são referência em robótica, também incorporaram a IA na rotina (Foto: Alex Malheiros)
 
Esse olhar crítico, inclusive, é um dos principais focos do trabalho pedagógico com IA nas escolas do Sesi. Embora os alunos demonstrem entusiasmo e curiosidade com a novidade, Freire aponta que a maior dificuldade enfrentada pelos educadores tem sido mostrar que a IA não é um atalho para respostas prontas, mas sim um recurso que exige responsabilidade, análise e reflexão.
 
Com base na metodologia do Sesi e nos materiais didáticos próprios, a IA tem sido uma aliada para desenvolver habilidades humanas cada vez mais valorizadas no mercado. “Tem sido um trabalho muito interessante a ser conduzido, onde nós entendemos que a IA veio para somar, que é um caminho que nós já estamos, não é futuro, é presente", finaliza.


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