A Redação
Goiânia - O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) projeta que, até 2050, mais de 30% da população brasileira terá 60 anos ou mais. No ano passado, 38% dos pacientes internados no Hospital Municipal de Aparecida de Goiânia - Iris Rezende Machado (HMAP), unidade da Secretaria Municipal de Saúde construída e mantida pela prefeitura e gerida pelo Einstein, tinham esse perfil — uma proporção que deve aumentar nos próximos anos, acompanhando as projeções do IBGE para o Brasil.
Entre os principais diagnósticos registrados no hospital estão insuficiência cardíaca, hérnia inguinal, convalescença após cirurgia, infarto e pneumonia. Apesar da maioria dos pacientes idosos do HMAP estar na faixa entre 61 e 70 anos, a unidade recebeu em 2024 dez pacientes com mais de 100 anos, sendo nove homens e uma mulher. "Muitos desses idosos convivem com doenças crônicas avançadas e limitantes, como demências, insuficiência cardíaca, doenças pulmonares e renais, que não têm necessariamente cura, mas demandam controle rigoroso dos sintomas, prevenção de complicações e foco na qualidade de vida”, afirma Bárbara Norberto, geriatra do HMAP.
“O tratamento do paciente idoso exige uma abordagem integral e individualizada. Com o envelhecimento, há uma série de alterações fisiológicas que impactam diretamente a condução clínica”, explica. Uma delas é a imunossenescência, que é o declínio progressivo da função do sistema imunológico, tornando os idosos mais suscetíveis a infecções e maior risco de descompensações.
Além disso, há maior prevalência de comorbidades, uso de múltiplos medicamentos e menor reserva funcional dos órgãos. Fatores como cognição, mobilidade reduzida, suporte social e presença de síndromes geriátricas também precisam ser considerados. “O foco, portanto, vai além da doença pontual: visa preservar a funcionalidade, prevenir incapacidades e promover qualidade de vida”, diz a médica.
A resposta do idoso ao tratamento, em geral, é mais lenta e complexa. Muitas condições comuns se apresentam de forma atípica em idosos como as infecções, que podem ocorrer sem febre. Outro exemplo é o infarto do miocárdio, que pode se manifestar com queda do estado geral, confusão mental ou fraqueza, em vez da dor torácica típica. Além disso, quadros como depressão, demência e delírio muitas vezes se confundem entre si, exigindo uma avaliação cuidadosa e específica da geriatria.
Planejamento
Diante desse cenário, o HMAP tem adotado estratégias específicas para o atendimento dessa faixa etária. Pacientes classificados com risco de queda recebem uma pulseira laranja, que permite rápida identificação pela equipe. Também são fornecidas meias antiderrapantes para uso durante toda a permanência hospitalar, especialmente ao sair da cama, e que podem ser levadas para a casa após a alta. A orientação se estende aos acompanhantes, que são instruídos a manter as grades das camas sempre elevadas e as rodas dos leitos travadas.
A pele do idoso exige atenção redobrada, especialmente para a prevenção e o tratamento de lesões por pressão, já que são mais comuns e de cicatrização mais difícil nessa faixa etária. Entre as práticas específicas para preservar a integridade da pele estão a substituição de esparadrapos e micropores por materiais que agridem menos a pele - como o hidrocolóide e os curativos à base de silicone. Também foi padronizado o uso de removedores de adesivo à base de silicone, que são livres de álcool - produto que resseca a pele - e evitam lesões por fricção durante as trocas de curativo e a fixação de dispositivos. Se o paciente já tem a lesão por pressão, são empregados curativos inteligentes que, além de proteger a ferida, interagem com ela para ajudar na limpeza, remoção de tecido morto e combate à infecção, muitas vezes dispensando o uso de antibióticos sistêmicos. Também podem ser usados recursos como a laserterapia, tratamento auxiliar que usa luz de baixa intensidade (vermelha ou infravermelha) para acelerar a cicatrização, reduzir dor e inflamação.
Outro ponto importante do protocolo é a higiene da pele. Em vez do tradicional sabonete em barra, é utilizado um sabonete líquido com pH levemente ácido (em torno de 5,5), mais próximo ao pH natural da pele, o que evita o ressecamento e reduz o risco de infecções. A hidratação imediata após a higiene ajuda a reforçar a barreira cutânea, protegendo contra agressões físicas, como a fricção, comuns em pacientes acamados.
Além dos cuidados com a pele, os pacientes idosos também demandam uma atenção especial da equipe de fonoaudiologia, especialmente por conta da disfagia — dificuldade para engolir —, que é muito comum nessa faixa etária. Essa condição pode aumentar o risco de complicações sérias, como engasgos que levam a infecções pulmonares (broncoaspiração), além de favorecer quadros de desnutrição e desidratação. Como muitos desses pacientes já chegam ao hospital com outras doenças associadas, infecções ou passaram por procedimentos como intubação, traqueostomia ou uso de sonda para alimentação, o trabalho da fonoaudiologia torna-se essencial. A equipe atua desde a identificação do problema até a reabilitação, com estratégias para ajudar o idoso a recuperar, dentro do possível, a capacidade de engolir com segurança e conforto.
Com o envelhecimento, é comum que ocorram perda de apetite, alterações no paladar e dificuldades de mastigação ou deglutição — fatores que tornam os idosos mais suscetíveis à desnutrição e à desidratação. No HMAP, cada paciente é acompanhado por uma equipe de nutricionistas que avalia individualmente suas condições clínicas e elabora planos alimentares personalizados. O objetivo é garantir aporte nutricional adequado, favorecer a recuperação e evitar complicações decorrentes da má nutrição.
Para o diretor do hospital, Pedro Vieira, o conjunto dessas ações reflete a diretriz de tratar o idoso não apenas como alguém que adoeceu, mas como uma pessoa com história, vulnerabilidades específicas e potencial de recuperação. “Não se trata apenas de atender mais idosos, mas de atender melhor e da forma mais humanizada e eficaz possível. O envelhecimento da população nos desafia a pensar em protocolos específicos, equipes capacitadas e infraestrutura adequada. Cada detalhe conta para garantir uma internação segura e uma recuperação funcional”, conclui.
Envelhecimento e saúde
O envelhecimento saudável é resultado de escolhas e cuidados ao longo da vida e envolve o equilíbrio entre saúde física, mental, emocional e social. Para a geriatra do HMAP, Bárbara Norberto, alimentação equilibrada, prática regular de atividade física, sono de qualidade, controle do estresse, não fumar e consumo moderado ou ausente de álcool são primordiais. Outro pilar essencial é a manutenção da funcionalidade, ou seja, a capacidade de realizar as atividades do dia a dia com autonomia.
“É importante estimular a mobilidade, a força muscular, a cognição e o convívio social. Envelhecer de forma saudável significa também manter um projeto de vida com propósito, o que contribui para o bem-estar e a longevidade com qualidade”, explica a especialista.
No que diz respeito aos exames laboratoriais, deve-se considerar a individualização conforme comorbidades, expectativa de vida e estado funcional. Os exames de rotina mais frequentemente indicados incluem hemograma, função renal, eletrólitos, função hepática, perfil lipídico, glicemia, vitamina B12, vitamina D, TSH, entre outros. Também é importante rastrear doenças silenciosas, como hipertensão, diabetes, osteoporose, declínio cognitivo e cânceres (mamografia, colonoscopia, PSA), sempre considerando os benefícios e riscos de cada rastreamento para aquele indivíduo. Outro ponto relevante é a avaliação da saúde bucal, visual e auditiva, frequentemente negligenciadas, mas com grande impacto na qualidade de vida.
Sobre o HMAP
O Hospital Municipal de Aparecida de Goiânia – Iris Rezende Machado (HMAP) foi inaugurado em dezembro de 2018 e é o maior hospital do Estado feito por uma prefeitura. Administrado pelo Einstein desde junho de 2022, foi construído numa área superior a 17 mil metros quadrados, onde atua com mais de 1.100 colaboradores para o atendimento de casos de alta complexidade, incluindo hemodinâmica e cirurgia bariátrica, além de várias especialidades cirúrgicas e diagnósticas. A estrutura contempla 10 salas de cirurgia e 235 leitos operacionais, sendo 10 de UTI pediátrica, 39 de UTI adulto, 31 de enfermaria pediátrica, e 155 leitos de clínica médica/cirúrgica.?
Trata-se da primeira operação de hospital público feita pelo Einstein fora da cidade de São Paulo. Nos primeiros seis meses de gestão, as filas de UTI da unidade foram reduzidas consideravelmente e a capacidade de atendimento dos leitos, dobrada. Já as longas filas de espera para cirurgias eletivas foram diminuídas em menos de um ano, feito alcançado graças a iniciativas como mutirões cirúrgicos, que priorizaram demandas urgentes. Nos primeiros seis meses de gestão Einstein, o tempo de permanência dos pacientes no hospital também foi reduzido de 9,5 para 5 dias. Em relação à mortalidade, em junho de 2022 a taxa era de 15,33% e, seis meses depois, de 3,6%.?
Entre janeiro de 2023 e julho de 2024, o HMAP realizou 90% de todos os procedimentos eletivos pelo SUS em Aparecida de Goiânia, levando a cidade ao título de município que mais realiza cirurgias não urgentes pelo SUS. Em 2025, prestes a completar três anos sob gestão Einstein, o hospital obteve a acreditação ONA nível 1, da Organização Nacional de Acreditação - um reconhecimento pela segurança e qualidade da assistência na unidade. No mesmo ano, a UTI do HMAP recebeu o Selo Top Performer 2025, concedido a hospitais que demonstram excelência no cuidado de pacientes em estado crítico.