Jales Naves
Especial para AR
Goiânia - “Somos mais que um corpo. Somos seres bio-psico-espirituais. Quando surge algum desequilíbrio em alguma dessas partes podemos nos fragilizar e adoecer. Assim, o tratamento das doenças deve integrar tanto os recursos da medicina convencional (medicamentos, mudança de estilo de vida e adotar hábitos saudáveis) quanto os recursos complementares, como nos atentar de como estamos nos portando em nossa vida. Ou seja, nosso comportamento, nossos pensamentos, nossa fé, nossas relações, nossos valores, objetivos e perspectivas de vida”. A afirmação é da médica fisiatra Ana Cristina Ferreira Garcia Amorim, professora de Medicina Física da Universidade Federal de Goiás (UFG) e doutora em Medicina Biofotônica pela Uninove-SP, ao falar no ciclo de palestras, sobre “Por que adoecemos?”, na tarde deste sábado (27/9), promovido pela Academia Espírita de Letras do Estado de Goiás, em sua sede, em Goiânia.
Cada vez mais – explicou – a ciência se aproxima de conceitos que antes se repeliam. “Hoje já sabemos que Ciência, Fé e Espiritualidade caminham cada vez mais juntas e de forma alguma se confrontam”, afirmou. “Fé é aceitar de forma incondicional uma hipótese que a pessoa passa a considerar como sendo uma verdade, pela absoluta confiança que se deposita nessa ideia, sem ficar questionando ou pedindo provas”, acrescentou.
Ou seja, é ‘confiança’, ‘credibilidade’, é ter uma atitude contrária à dúvida. “Termos essa atitude neste contexto que estamos falando é de extrema importância: aquela pessoa que porventura está doente, ou se sentindo prestes a adoecer, confiar, crer que ela conseguirá passar bem por tudo isso, que o tratamento necessário será benéfico, e que ela confiará e seguirá com disciplina e disposição o tratamento proposto por seu médico, é algo que pode ser o ponto decisivo para o sucesso ou falha desse tratamento”.
Fé e espiritualidade
“Quando falamos em fé e espiritualidade não estamos falando em religiosidade. Ela pode e deve estar inclusive envolvida sim, mas não é somente isso”, disse Ana Cristina.
Fé e tratamento de uma doença
A ciência mostra que ela atua de várias formas, tanto psicológicas quanto biológicas, sociais e até comportamentais, com explicações científicas, fisiológicas, que surge como algo antes considerado místico, no campo de milagres, para então se inserir no campo científico, mais exato e racional.
Nos aspectos psicológicos a fé atua diminuindo a ansiedade e a depressão, pois “ter fé dá esperança e confiança, diminuindo medos diante do diagnóstico e do futuro”, ressaltou, para acrescentar: aumenta a resiliência emocional, pois aqueles que tem crenças espirituais tendem a lidar melhor com situações de dor, limitações e incertezas. “Dá mais sentido à vida, pois acreditar em um propósito maior ajuda o paciente a enfrentar o processo de adoecimento sem perder a motivação”.
Em relação aos aspectos biológicos, a fé diminui a produção de cortisol (hormônio do estresse), o que impacta positivamente o sistema imunológico. É capaz de modificar respostas fisiológicas, como reduzir frequência cardíaca e pressão arterial, promovendo efeito cardiovascular, quando se pratica, por exemplo, oração, medicação, cantar com alegria.
“Impacta também no sistema imune: estudos mostram que a espiritualidade está associada a melhor resposta imunológica em pacientes com doenças crônicas”, esclareceu, para acrescentar: a fé ativa o córtex pré-frontal e o sistema límbico, áreas envolvidas na expectativa de melhora.
"Isso pode liberar dopamina e endorfina, aumentando a sensação de bem-estar e até potencializando a resposta fisiológica aos medicamentos. Além disso, precisamos citar a redução dos efeitos adversos percebidos: pacientes que confiam no tratamento e entregam sua saúde a um propósito maior relatam menos intensidade de efeitos colaterais. Isso pode estar ligado à modulação da dor e desconforto pelo sistema nervoso central”, completa.
Aspectos sociais
Quanto aos aspectos sociais, como anotou a professora Ana Cristina, ter uma rede de apoio, por exemplo participar de comunidades religiosas, oferece maior suporte emocional, material e social, reduzindo o isolamento do paciente. Além de sentir-se parte de um grupo aumenta a sensação de acolhimento e reduz a solidão, que é fator de risco para o adoecimento. Estudos mostram que com a fé as pessoas encontram um sentido na vida, o que as ajuda a viver melhor, com mais esperança e com uma atitude mais positiva.
Sobre os aspectos comportamentais, ela destaca: aquele que tem fé tem maior adesão ao tratamento e muitas vezes se mostra mais disciplinado na tomada de medicamentos e no seguimento das orientações médicas. “Além disso, adota e valoriza um estilo de vida mais saudável: como evita e reduz o uso de álcool, cigarro, drogas, excesso de comida, pratica regularmente exercícios físicos, o que contribui diretamente para a manutenção da saúde e melhores resultados durante um tratamento”. “Se sentem mais motivados para o autocuidado: a fé divina pode gerar perseverança para continuar lutando, mesmo em tratamentos longos e desgastantes”, explicou.
Ao situar a perspectiva espiritual, a professora Ana Cristina aponta que a fé favorece a confiança em que a dor ou a doença têm um sentido maior. “Abre espaço para terapias complementares (como oração, passes, meditação), que não substituem o tratamento médico, mas podem ser aliadas no processo de cura e equilíbrio. Atua na esperança ativa, ajudando o paciente a transformar sofrimento em aprendizado”.
Ana esclarece que todos esses efeitos da fé e espiritualidade na saúde e na doença vem sendo demonstrados em numerosas pesquisas científicas, que aumentaram significativamente nesses últimos anos. Ela cita, como exemplo, que na maior base de dados de pesquisa de artigos científicos, que é o Pubmed, se procurar por estudos sobre espiritualidade e saúde publicados nos últimos cinco anos aparecem 7.600 documentos científicos, e se afunilar a procura por artigos de revisão (que fazem um apanhado de vários títulos sobre o tema para analisar os resultados), existem 114 artigos.
Equilíbrio emocional
Ana Cristina reafirmou ainda que a fé não substitui o tratamento médico, mas pode potencializar seus efeitos, ajudando o paciente a enfrentar a doença com mais equilíbrio emocional, menos estresse, mais adesão ao tratamento. “Pode influenciar na quantidade de medicamentos usados – como vemos em nossa prática diária –, está relacionado a maior qualidade de vida e representa um reforço positivo para o sistema imunológico”.
Quando se trata da prevenção de grande parte das doenças, “não há dúvidas de que cuidar do corpo é fundamental – o que inclui manter uma alimentação saudável, praticar exercícios físicos e ter uma boa qualidade de sono”. “A fé também pode servir como uma ferramenta complementar na prevenção, por meio de atividades, por exemplo, como oração e meditação”, completou.