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Indústria do futuro: Goiás no radar para produzir carros elétricos no Brasil

Mercado ganha espaço no País | 17.07.21 - 08:00 Indústria do futuro: Goiás no radar para produzir carros elétricos no Brasil (Foto: reprodução/portal.connectedsmartcities.com.br)José Abrão
 
GoiâniaO Brasil tem cerca de 55 milhões de veículos entre carros, caminhões, ônibus, motos e outros modelos em circulação. Sobre os elétricos, aqueles que apresentam propulsão via motor elétrico, segundo dados da NeoCharge, site que acompanha o mercado de eletrificados e híbridos no Brasil, existem 2.743 em circulação atualmente. Os do tipo híbrido, que são os que têm um motor de combustão interna, normalmente a gasolina, e um motor elétrico que permite manter o motor de combustão funcionando a baixas rotações, somam 39.799, além de 11.798 veículos híbridos plug-in. Juntos, segundo o mesmo site, os elétricos e híbridos no país são pouco mais de 54 mil veículos.
 
É pouco, mas o número já apresenta mudanças no mercado. Em 2020, enquanto a venda de veículos a combustão sofreu uma queda de 26,6%, foi o melhor ano para veículos híbridos e elétricos no Brasil: 19.745 novos emplacamentos, segundo a Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE).
 
Em Goiás, Estado com grande potencial para se firmar como base para linhas de montagem desse tipo de produção, existem 1.530 veículos híbridos ou elétricos em circulação, sendo 855 só na capital. No Brasil, o maior número de carros eletrificados ou híbridos está concentrado em São Paulo: são quase 10 mil na capital paulista e mais de 18 mil em todo o Estado.
 
O crescimento do carro elétrico no Brasil é motivado principalmente pelo fator econômico, mas o fator ecológico também conta. Com a gasolina na casa dos R$ 6 o litro, etanol também somando sucessivos reajustes e o aumento de preços tanto do carro zero quanto da manutenção, investir em um carro elétrico que roda por menos de R$ 1 por litro e com baixíssimo custo de manutenção parece uma ideia cada vez melhor.
 
A grande barreira é o valor de entrada: os modelos elétricos e híbridos ainda não chegaram, no geral, nos preços de carros populares. Além de restritos a categorias e marcas intermediárias ou de luxo, esses veículos ainda não são fabricados no Brasil, o que, com o câmbio atual, praticamente dobra o valor de todos os carros quando chegam ao mercado nacional. Atualmente o carro elétrico mais barato vendido no Brasil é o Jac iEV 20, comercializado pela “bagatela” de R$ 159.900. O mais caro é o Porsche Taycan, vendido a R$ 979 mil.
 
Apesar do alto investimento, muitas pessoas não apenas têm comprado essa ideia, literalmente, como vestido a camisa dos veículos elétricos. É o caso dos membros da Associação Brasileira dos Proprietários de Veículos Elétricos Inovadores (Abravei). O presidente do grupo, o arquiteto Rogério Markievicz, comprou seu primeiro carro elétrico ainda em 2016.
 
“Fundamos a Associação em 2018 porque tínhamos grupos de WhatsApp com gente do Brasil inteiro que tinha interesse em carro elétrico. Essas pessoas sempre buscavam muita informação. As concessionárias e vendedores vendiam os carros sem saber o que estavam vendendo e o comprador não sabia o que estava comprando”, relata Rogério.
 
A Abravei tem como objetivo apoiar e informar quem tem carro elétrico, assim como se relacionar com o poder público para emplacar políticas de mobilidade sustentável elétrica. Uma das iniciativas da Associação em Goiás gerou a primeira eletrovia do Centro-Oeste, ligando Brasília e Goiânia, com dois eletropostos gratuitos no caminho. 
 
“Essa ligação é muito importante e há muito tempo era prometida e nunca saía do papel. Fizemos todo o contato com o pessoal de uma famosa rede de restaurantes, com unidades instaladas entre Goiânia e Brasília. O restaurante bancou toda a instalação e banca também todos os carregamentos, que são gratuitos para o dono do carro”, conta Rogério.
 
Na esfera pública, o grupo teve uma vitória no Distrito Federal com a primeira lei urbanística para carros elétricos. O código de obras passou a obrigar vagas com ponto de recarga para veículos elétricos em todas as novas construções. Desde então, a cidade de São Paulo aprovou uma lei muito parecida. “Espero que isso inspire outras cidades brasileiras porque é um grande incentivo para as pessoas comprarem veículos elétricos”, diz Rogério.
 
No DF, a Associação agora trabalha pela aprovação da isenção de IPVA para estes veículos, mesmo que temporária, também como forma de incentivo à aquisição. Em Goiás, ainda não há nenhum projeto ou iniciativa governamental nesse sentido e os poucos eletropostos espalhados pelo Estado são de iniciativa privada, embora sejam todos gratuitos para a utilização dos motoristas.



Rogério antes de partir para o Uruguai (Foto: acervo pessoal)
 
Rogério comenta que o cenário tem se transformado de forma acelerada. “Em 2016, havia uma marca disponível no mercado. Era um único modelo. Hoje temos 14 marcas e um leque de opções de veículos”, salienta. Entre elas está a Tesla, de Elon Musk, com alguns dos carros mais luxuosos e inteligentes do mercado.

O advogado Aldrovando de Castro Jr é proprietário do primeiro Tesla de Goiânia. “Eu sempre fui muito preocupado com mobilidade e meio ambiente. Estive na Europa em 2013 e fiquei impressionado com a quantidade de carros elétricos nas ruas e com o número de pontos de carregamento disponíveis. Em 2016, eu vi um carro híbrido em uma concessionária e comprei. Amei o carro”, conta.
 
Segundo o advogado, quem experimenta um elétrico nunca mais quer saber de um veículo a combustão. “Não estraga nada, não dá defeito, não faz barulho, não tem manutenção, não gasta dinheiro com combustível, não sai fumaça. Além disso, tem o dobro da potência dos carros que tive”, enumera as vantagens. “Eu até comprei um compressor de ar pra colocar na minha garagem porque fico com vergonha de ir ao posto e não gastar nada”, completa.
 
“Quem dirige um elétrico não quer voltar para um carro a combustão. Não tem óleo, não tem filtro, não tem vela. Tem que calibrar pneu, trocar filtro de ar, balancear e alinhar. O problema do carro elétrico hoje é o preço. Ele é um veículo caro. O segundo problema é a falta de políticas públicas para o carro elétrico”, comenta. O advogado defende que o governo instale carregadores, "nem que fosse para cobrar através da concessionária de energia". A ausência destas políticas desmotiva, na opinião do advogado, o interesse dos consumidores de investir no elétrico.
 
“Estranho é um país com tanto potencial verde como o nosso não investir em veículos elétricos, nem em energia solar, não investir em energia eólica como deveria", opina. Na visão do advogado  Aldrovando, o país precisa incentivar a propagação e o uso de energias renováveis, e isso passa pelos veículos elétricos com zero emissão de poluentes.
 
Mitos
Além do alto custo, algumas críticas direcionadas aos veículos elétricos recaem principalmente sobre autonomia e pontos de carregamento. Rogério e Aldrovando garantem que são mitos disseminados por detratores. “No meio urbano, quem tem carro elétrico não gasta tempo algum recarregando seu carro. Você faz a carga durante a noite no seu domicílio. Eu carrego meu carro até hoje em casa em uma tomada comum”, conta Rogério.
 
O presidente da Abravei também gosta de fazer viagens longas para desbancar a crença de que o carro elétrico fica "pela beira da estrada". “Esse ano já fui de Brasília a São Paulo duas vezes. Em cada ponto de recarga rápida você para por 40 minutos, tempo de fazer um lanche, ir ao banheiro. São paradas um pouco mais longas que em um carro a combustão, mas que você faz sem gastar um tostão e sem poluir”, conta. “Cheguei a fazer o caminho Brasília-Montevidéu. Acabando a pandemia eu quero refazer esse caminho e ir até Buenos Aires”, planeja.
 
Aldrovando concorda. “Hoje meu carro gastaria uns R$ 45 numa carga completa que roda 423 km. Mas tenho energia fotovoltaica, então eu praticamente não pago energia. O tanque cheio de um carro desse porte seria mais de R$ 300”. 
 
Goiânia conta com mais de 10 pontos de carregamento gratuito em shoppings, hotéis e estandes de construtoras. Em alguns estados, como no Paraná, já existem eletropostos pagos, mas mesmo estes são muito mais baratos se comparados a um abastecimento comum de carro a combustão.



O Tesla de Aldrovando: luxo, potência e tecnologia sem poluir o meio ambiente
 
 
Preparando para o futuro
 Se o futuro é elétrico, a indústria goiana já está no caminho. A Faculdade Senai Roberto Mange, em Anápolis, qualifica mão-de-obra especializada para a montadora Chery Caoa na cidade e planeja começar a formar turmas de mecânicos profissionais capacitados em veículos eletrificados ainda este ano.
 
É o que conta Sérgio Mendes, instrutor da faculdade e que atua na área automotiva desde 1991. “A Faculdade Senai recentemente adquiriu um veículo híbrido novo justamente para iniciar o processo de formação. Vemos hoje que a questão do desenvolvimento de veículos híbridos e elétricos é inevitável. Temos uma questão ambiental e de matriz energética em jogo e as próprias montadoras estão se voltando cada vez mais para esta área. Isso é o futuro”, resume.
 
O Senai em Anápolis está se antecipando a essa realidade. Os instrutores estão passando por capacitação e treinamentos para, em outubro, já começarem a desenvolver o curso para a comunidade. Mendes destaca que a parte estrutural não é diferente de um veículo comum, mas que é necessária uma capacitação dedicada ao motor e aos sistemas elétricos.
 
“É uma manutenção diferente, complexa e com outros cuidados que precisam ser levados em consideração. O veículo trabalha com uma tensão muito mais alta que o carro a combustão. Nossa ideia é trabalhar toda a parte de bateria e motores de veículos elétricos e, principalmente, os cuidados necessários com um veículo desse. Não é simplesmente levantar o capô”, explica.
 
Todo esse trabalho é aberto e voltado para a comunidade, então toda a sociedade anapolina e goiana vai se beneficiar disso. “A capacitação de mão-de-obra é muito importante, assim como a educação profissional, não apenas na área automotiva. Estamos preocupados com isso e estamos antecipando as necessidades que estão nascendo no horizonte”, diz Sérgio. “Nosso pessoal está se preparando tecnicamente para algo que, em um curto espaço de tempo, será a norma. Já estamos agindo para que nossos alunos estejam preparados para poder atender toda demanda da sociedade”.
 
Frotas
Pesquisador da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e empreendedor na Barassa & Cruz Consulting (BCC), Edgar Barassa salienta que cada vez mais essa trajetória da eletrificação em nível global vai se consolidando. Em sua empresa, ele trabalha com modelos de negócio para tecnologias emergentes verdes.
 
“Tenho atuado muito nessa modelagem de como as empresas podem implementar de forma viável tanto do ponto de vista sustentável, como técnico e financeiro. Temos trabalhado com eletrificação de frotas corporativas; identificação de lugares para instalação de eletropostos”, enumera. “Tenho trabalhado nessa ponta de trazer formas de implementação porque o modelo de negócio tradicional, isto é, a venda de veículos elétricos, apresenta desafios”.
 
No âmbito tradicional, Edgar aponta que é necessário pensar em formas de viabilização. “Por exemplo, podemos pensar em um financiamento de longo prazo, já que o custo operacional e de manutenção de um veículo elétrico é mais baixo. Podemos nos apegar a alguns aspectos positivos destes veículos para justificar a implementação sustentável e viável técnica e financeiramente”.
 
Outra estratégia de viabilização proposta por Barassa diz respeito ao incentivo à aquisição de frotas ou para o aluguel de veículos verdes. Isso ajudaria, segundo ele, a amortecer o impacto do alto custo de acesso a este tipo de veículo.
 
Edgar também ajudou a desenvolver a Plataforma Nacional de Mobilidade Elétrica (PNME), que busca formas de instrumentalizar essa tecnologia através da implementação de políticas.
 
Em sua pesquisa atual de pós-doutorado na Unicamp, Edgar e outros cientistas investigam como as cidades podem alavancar a mobilidade elétrica dentro do seu território. “Estamos fazendo um mapeamento internacional das melhores práticas que, no final, vão gerar um treinamento para os gestores públicos no Brasil", acrescenta. 
 
Made in Brazil
Desde o final de 2017, crescem os rumores e planos de uma linha de montagem permanente de veículos elétricos nacionais, mas nenhum projeto ainda saiu efetivamente no papel. Os planos mais sólidos, porém, podem passar por Goiás. Em 2019, a Caoa Chery, que tem fábrica em Anápolis, começou a alimentar a possibilidade de fabricar estes carros por aqui.
 
Além dela, a Jac Motors estuda começar a fabricar, ainda em 2021, a sua linha de carros eletrificados em Aparecida de Goiânia. A Jac, inclusive, é a única marca que já vende uma linha completa desse tipo de veículo no Brasil, do modelo compacto ao caminhão leve. Todos, porém, ainda são importados, com preços que variam de R$ 160 mil a R$ 387 mil, praticamente inviáveis para a composição de uma frota. O cenário pode mudar, e em breve, com a possível produção nacional. 
 

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