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Direito à infância

'Quando o estômago grita ou bate a vontade de fumar, fica difícil'

Jovens relatam o dia a dia nas ruas | 31.10.11 - 17:54

Cleomar Almeida
Fotos Fábio Lima

Eles saltam aos nossos olhos como se fossem vultos. Crianças e adolescentes em situação de risco tomam conta de ruas de Goiânia, apesar de não haver um consenso entre os números da Secretaria Municipal da Assistência Social (Semas) e do censo nacional. No trânsito, ao parar o veículo diante do sinal vermelho, o motorista recebe o pedido, quase em tom de súplica: “Me dá uma moeda?”. A cena se repete nas feiras livres, nos terminais de ônibus e até em frente a igrejas.

Enquanto os fiéis chegavam para a missa, na Catedral Metropolitana de Goiânia, no Centro, um grupo se aprontava para tentar garantir uns trocados. “Quero dinheiro para comer. Até agora, não engoli nada”, conta Danilo (todos os nomes são fictícios), de 11 anos, enquanto tentava esconder um cachimbo para fumar crack. “A droga é do mal, parece uma praga. Já fui internado em casas de recuperação, mas não adiantou nada”, afirmou ele, que estava acompanhado de três adolescentes.

O garoto relata que saiu de casa aos 8 anos. Ele integrava um grupo que, em vez de ir para a escola, passava a tarde na rua. “Não tinha nada de interessante nas aulas e a gente pulava o muro”, disse, lembrando que seus pais trabalhavam e, por isso, não tinham tempo para acompanhá-lo. O menino decidiu abandonar o lar, definitivamente, após  atritos na família. “Meu pai e minha mãe brigavam demais e, por causa de problemas deles, me xingavam sem motivo”.

A Praça do Trabalhador, no Centro, bem em frente à Câmara Municipal de Goiânia e onde se reúnem os representantes do povo eleitos pelo voto, é outro ponto comum de concentração de adolescentes que deixaram suas casas para morar na rua. No local, estava Luana, de 15 anos. “É bom morar na rua porque tem liberdade, mas a gente aprende muita coisa, inclusive apanhar dos homens [policiais]”, disse ela. “No início foi difícil, sentia medo até de dormir. Depois, me acostumei”, relatou a garota, que contou ter saído de casa por se envolver com as drogas. “Comecei com cigarro e passei para maconha. Hoje, só uso crack e cocaína. Já tentei parar, mas não dou conta”.

O grande fluxo de veículos na Marginal Botafogo, à altura do Jardim Goiás, chama atenção de  outro grupo que pede dinheiro próximo aos semáforos. Antes mesmo de os carros pararem, a rua é tomada por adolescentes que estendem as mãos, torcendo para que os motoristas dispensem alguma moeda de dentro de seus carros. “A gente leva muito ‘não’, mas sempre tem algum que tira alguma moeda”, conta Diego, de 14 anos. Ele afirmou que, quando sente fome, pede restos de comida nos restaurantes da cidade. “Não vou mentir, não, tio! Eu já roubei também. Quando o estômago grita ou bate a vontade de fumar, fica difícil controlar”, disse.

Sem atividades
Diego contou que recebeu atendimento de uma equipe da Secretaria Municipal de Assistência Social (Semas) há cerca de seis meses, mas criticou o tratamento recebido no Complexo 24 horas. “Lá parece um internato e não tem nada de interessante para fazer. Eu só comia e dormia, meu dia ficava sem graça. Por isso, voltei para a rua”, afirmou.

Todos os entrevistados pela reportagem do jornal A Redação disseram que nasceram em Goiânia mas que, diariamente, conhecem adolescentes que chegam de outras cidades à capital. Eles afirmaram que, geralmente, andam em grupo para um tentar proteger o outro e recebem ajuda de entidades religiosas. “Ao contrário do que a maioria pensa, a gente tem fome, tem vontade de crescer e sair desta situação, mas isso não é fácil”, desabafou Patrícia, de 17 anos, sendo os últimos quatro vividos na rua.

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Comentários

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  • 02.11.2011 06:05 Nádia Junqueira

    Cleomar, fiz questão de esperar ter um tempo mais folgado para ler todas suas matérias do especial "direito à infância". Parabéns a você e ao Fábio pelo trabalho e pelo talento. Sociedade agradece. Abraço!

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