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Jales Naves

Alegria de reviver os anos 1960, homenagens e memória do Colégio Pedro Gomes

| 30.09.19 - 07:47
 
 
         – “Jales, meu filho, posso ir embora?”.
 
         A reunião festiva que os ex-alunos do Colégio Estadual ‘Professor Pedro Gomes’ realizaram na noite de sexta-feira, dia 27, no Serendipity bar, no Setor Bueno, estava animada. O cantor Sirlon embalava o ambiente com sua voz contagiante e tornava o clima mais aconchegante e alegre, e o casal Alzira e José Neto, ele o ‘Rei do Rock de Goiás’, deslizava com muita desenvoltura pela pista improvisada, logo depois acompanhado por outros casais. Ninguém queria ir embora.
 
O peso da idade, no entanto, falou mais alto.
 
         Maria Luíza Naves, 98 anos, comunicativa e simpática, rodeada pelos presentes, que queriam cumprimentá-la, relembrar os bons tempos no bairro de Campinas, onde, mãe de quatro alunos do colégio, sempre acolhia a todos. Seja para as tarefas escolares em grupo, seja nas reuniões sociais que os filhos realizavam periodicamente, quando a casa ficava cheia, a música animava os jovens e a convivência era harmônica e feliz.
 

Maria Luíza Naves com a medalha do 'Somos Pedro Gomes'
 
         Dona Nenzinha, como é tratada carinhosamente por todos, estava sendo homenageada justamente por ser Mãe de Alunos do colégio e ter ficado na memória de todos pelo acolhimento que lhes dispensava, pois ninguém esquece quando recebe atenção e carinho. Com esse ato, o grupo de ex-alunos, denominado ‘Somos Pedro Gomes’, atingia seu objetivo, de agradecer às pessoas que lhes foram gratas e os cativaram. Ela, de sua parte, sorria, agradecia aquela deferência e conversava com todos que dela se aproximavam.
 
         Como não liberá-la, mesmo sendo a principal estrela da festa? Afinal, se nós, mais jovens, já sentimos esse peso, imagine quem está chegando na invejável marca dos 100, com saúde, disposição e muita animação. Ela não tem perdido as oportunidades de participar de reuniões como essa, quando é sempre homenageada, como ocorreu recentemente, na Pousada dos Pireneus, em Pirenópolis, no Encontro da Terceira Idade, ao ser escolhida como Rainha Mór do evento.
 
         Ela viveu a metade de sua vida no bairro goianiense de Campinas, onde criou os nove filhos, afilhados e parentes que foram morar em sua residência. Mulher atuante e solidária, sempre acompanhou o marido, José Rodrigues Naves Júnior, em suas atividades políticas e sociais, nas campanhas e no exercício de mandatos. Ainda muito jovem, foi duas vezes subPrefeita do povoado de São Geraldo, a que deu o nome de Goianira.
 
“Casou-se muito jovem, dedicou-se a criar os filhos, com muito carinho e zelo, e a exercer funções diversas, na família e na sociedade. Decidida, resolvia todas as dificuldades que apareciam”, como ressaltou o ex-aluno e farmacêutico Radif Domingos, que fez a saudação. “Não teve oportunidade de estudar, mas conduziu os filhos para os estudos e para conquistar uma profissão”. De seus nove filhos, quatro – Elvira Luíza, Sevan, Jales e Fátima Rosa – tiveram o privilégio de cursar o ‘Pedro Gomes’. Dos nove filhos, cinco – Raulindo, Maria Aparecida, Sevan, Jales e Regina Cândida – participaram da homenagem. Ela tem 26 netos, 28 bisnetos e em torno de 400 afilhados.
 
 
 
         A homenagem a pioneiros do bairro de Campinas e a pessoas gratas aos integrantes do Grupo ‘Somos Pedro Gomes’, formado por ex-alunos do colégio, é uma forma que encontraram para valorizar esses cidadãos e chamar atenção para sua luta: preservar o nome do colégio e resgatar a educação de qualidade que ministrou, tornando-o, nos anos 1960 e 1970, a maior e melhor escola pública do país, como frisou a ex-diretora, Maria Conceição da Paixão (dona Zizi), ao ser homenageada em 2018.
 
         A repercussão da festa evidencia que esse objetivo tem sido atingido e que as homenagens são justas.
 
 
 
         Um dos primeiros professores do Colégio Estadual ‘Professor Pedro Gomes”, quando se chamava Ginásio Estadual de Campinas, nomeado em 1951, aos 21 anos de idade, Nion Albernaz ainda não tinha esse título em seu currículo, e agora passa a ostentá-lo, para nosso orgulho e da cidade de Goiânia, que ele tanto cuidou e nos ensinou a amar. “Na verdade, Goiânia teve o privilégio de ser administrada por quem a conhecia muito bem, gostava da cidade e sabia o que fazer para torná-la ainda melhor, como fez em suas três gestões. Todos nós que aqui vivemos temos uma dívida de gratidão pelo trabalho, pelo amor e pela dedicação de Nion Albernaz por Goiânia e por todos nós, seus moradores”, disse Jales, na saudação.
 
Ele nasceu na antiga Capital, Vila Boa, e ocupou seu espaço na nova Capital, que transformou em “Cidade das Flores”, da cidadania, das ruas limpas e bem arborizados, que valorizou seus cidadãos, acolheu bem a todos, moradores e visitantes, e prestou bons serviços. Um Prefeito que exerceu seus mandatos com entusiasmo, determinação e desprendimento. Promoveu a urbanização da cidade, ofereceu um ensino de qualidade, iniciou a construção da nova sede da Prefeitura e a informatizou, asfaltou ruas, introduziu melhorias no trânsito, construiu e criou novas vias para facilitar o deslocamento das pessoas e a movimentação comercial, iluminou avenidas e praças, realizou ousados e criativos programas sociais, de resgate da cidadania de pessoas socialmente excluídas e de portadores de necessidades especiais, deu atenção especial à mulher, à juventude e ao idoso. Neste mês de setembro está sendo lembrada a passagem de dois anos de falecimento do professor Nion Albernaz.
 
         A medalha foi entregue à viúva, professora Geralda Albernaz, que foi responsável pela criação, implantação e execução de programas sociais avançados e ousados, como o “Trabalhando com as Mãos” e o “Amigos do Meio Ambiente”; e ao neto, deputado estadual Tiago Albernaz, que fez um acréscimo: Nion foi nomeado um ano antes do que está agora sendo divulgado, em 1950.
 
 
 
         Loira, alta, olhos azuis e muito simpática, Maria Délphica Sanches de Siqueira, nome pomposo, ou dona Mariazinha, como todos carinhosamente a conhecem, nasceu no Rio de Janeiro, mas é mais campineira do que qualquer outro nascido nessa cidade que humildemente aceitou ser vila para abrigar a nova Capital. É o nosso território desde que nos entendemos por gente e somos defensores desse espaço.
 
Dona Mariazinha sempre foi ousada, em suas atitudes e em seu jeito de ser. A primeira ousadia foi quando, ainda jovem e disputada, deixou um grande centro urbano, com todos os atrativos do mundo, como sol, praia e mar, belos cinemas e teatros, restaurantes etc., para acompanhar, já apaixonada, o goiano que tinha retornado da guerra na Itália, José Siqueira, na viagem sem retorno para o interior do Brasil. Goiás era pouco conhecido, o progresso e as modernidades ainda não tinham chegado. Uma “terra de índios”, como maldosamente falavam naqueles tempos.
 
Casou-se com Goiano e logo começaram a chegar os filhos: Goianinho, Luciano, Nosor e Tadeu, todos colegas no ‘Pedro Gomes’, que se destacaram em suas áreas e motivaram esta homenagem a ela. Com o falecimento de Goiano ela cuidou de se organizar. Trabalhou em escolas e depois atuou na Legião Brasileira de Assistência, onde realizou importante trabalho social. Logo depois uniu-se ao cunhado Ipanema de Siqueira, com quem teve mais dois filhos, Luiz Fernando e Ricardo. Todos os seis filhos se casaram e lhes deram quatorze netos e dezessete bisnetos.
 
Quando o filho Luiz Fernando leu a mensagem que escrevi sobre ela, as lágrimas escorreram pelo seu rosto e ela, sempre comedida e não se emociona, chorou. O filho, que mora em sua casa, tinha ido dormir quando a cuidadora, em seguida, foi chamá-lo; ela, que disse que não iria à homenagem, tinha tomado nova decisão, em função da emoção que lhe causaram as palavras que ouvira.
 
– “Vou à festa!”, comunicou, resolvida.
 
Vaidosa, diabética e com mobilidade reduzida, agora que chega aos 93 anos, dona Mariazinha estava pronta para ir ao encontro de seus admiradores quando, vendo que o tempo tinha mudado, poderia vir um friozinho incômodo e teria que andar um bom pedaço, refez seus planos, pois teria dificuldades no caminhar.
 
– “Não vou mais. Mande meus abraços a cada um”, disse, ela que sempre acolheu a todos em sua casa, valorizando a presença de cada visirante, e não foi. Os seis filhos, todos, compareceram.
 

Ex-alunos comemorando o reencontro e as homenagens
         
A reunião agradou a todos, as conversas eram longas, muitas as histórias e a iniciativa chegou a incomodar alguns, como o pessoal da Secretaria da Educação do Estado, que não permitiu a entrada de repórteres da TV Sagres para entrevistar o coordenador do grupo, e mesmo a direção do colégio, preocupada em desfazer nossas argumentações.
 
Simpático e extrovertido, o escritor Luiz Augusto Paranhos Sampaio, que lecionou por 10 anos no ‘Pedro Gomes’ e cita o colégio sempre que possível, fez uma observação importante:
 
– “Quem dera outros alunos, de outros colégios, tivessem a iniciativa e a determinação de vocês!”, afirmou, recordando que também lecionou noutros colégios e até dirigiu escolas. Ainda ativo no ato de escrever, é respeitado integrante da Academia Goiana de Letras (AGL) e reafirmou ao jornalista Jales Naves um recado que já tinha dito antes:
 
– “Prepare-se! Quero levá-lo para Academia!”, disse.
 
 
 
“Rei do Rock” em Goiás, e por onde passa, e dançarino de primeira, não parando um minuto quando os músicos começam a tocar, o jornalista José Neto estava eufórico. Chamou-me ao lado para uma confidência:
 
– Fui eu que causei a maior confusão na história do ‘Pedro Gomes’. Era secretário do Grêmio Literário ‘Professora Lígia Maria Coelho Rebelo’ quando recebemos uma informação que nos abalou e logo nos apressamos a dar repercussão à grave novidade: era 1966, vivíamos os ‘anos dourados’, com a ditadura militar ameaçando a tudo e a todos, com prisões e mortes, a violência chegando até nós, momento em que chegou uma notícia que não teríamos como checar, mas que deveríamos repassar – o líder estudantil goiano Tarzan de Castro teria sido morto no Rio de Janeiro”, afirmou.
 
De imediato elaborou um manifesto repudiando aquele ato. O documento foi impresso e mimeografado para distribuição aos alunos e professores. Em seguida, saiu conclamando a todos para deixarem as salas de aula para participarem de um ato de protesto, quando a então diretora, professora Maria Conceição da Paixão (dona Zizi), não permitiu, já criando um tumulto com essa decisão, o que inflamou ainda mais os ânimos.
 
Os alunos decidiram confrontar a direção e sair pelas ruas do bairro quando, ao chegarem ao portão, deram de frente com um batalhão de militares que tinha sido chamado. Começou um bate-boca, cada um tentando se explicar e muitos buscando fugir, esconder-se e, em meio a esse alvoroço, aconteceu um imprevisto, um disparo, atingindo uma pessoa.
 
Foi um “Deus nos acuda”. A confusão se formou, e até o coitado do rapaz da pequena lanchonete no interior do colégio, que tinha um revólver 22, foi preso, como suspeito. Mas logo se descobriu a arma, mais potente, um 38, e que fora um policial militar quem atirou, atingindo outro policial.
 
Ao final, com a interferência da diretoria e de professores os ânimos se acalmaram, os estudantes foram liberados, mas uma parte foi presa e respondeu a Inquérito Policial Militar (IPM).
 
José Neto conseguiu sair sem ser preso.
 
Já trabalhava na TV Anhanguera quando o diretor Jaime Câmara, tomando conhecimento desse episódio, chamou-o em sua sala e mandou ele sair da cidade até a situação se acalmar. Ele foi para São Paulo, ficou uns 40 dias por lá, e quando voltou para Goiânia já existia outro problema para resolver: era vice-presidente do Sindicato dos Radialistas e o presidente Paulo Vilar estava preso, obrigando-o a assumir a presidência da entidade nesse momento tenso e difícil de sua vida profissional.
 
 
 



*Jales Naves é jornalista e escritor, estudou no Colégio Estadual ‘Professor Pedro Gomes’.


Comentários

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  • 30.09.2019 09:16 Aristoteles de Castro Barros

    Obrigado Jales Naves, por resumir uma "Historia de Vida" do CEPPG ( antigo Ginasio Estadual de Campinas )

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