Sabe-se que, desde a década de 1950, o estudo sobre Inteligência Artificial (IA) vem ganhando espaço na sociedade. Tamanha a sua notoriedade, ainda que tímida, que o filme “O Exterminador do Futuro”, foi sucesso de bilheteria, nos idos de 1980. Na atualidade, já se tem ciência do quão benéfica é a referida tecnologia, dado os avanços que garante, em especial na área do Direito brasileiro, em que diversos profissionais têm se valido dela como um “colega de trabalho”.
A ferramenta, na realidade, é chamada “Inteligência Artificial Limitada”, a qual, para esclarecer, possui a capacidade de desempenhar tarefas específicas designadas a elas – os denominados “comandos” –, bem como: formular peças processuais; identificar dados específicos em um processo; formular argumentos sobre determinado caso; e, até mesmo, criar jurisprudências.
A referida frase – “criar jurisprudências” –, neste caso, foi utilizada de forma intencional. Isso porque, como se sabe, a jurisprudência não é simplesmente criada a livre arbítrio. Para que ela exista, é necessário um conjunto de decisões de um determinado Tribunal a respeito de uma matéria em específico.
Porém, o que se tem notado, no Brasil afora, é a apresentação de peças processuais, completamente confeccionadas pela “IA”, na qual ela colaciona jurisprudências fabricadas por ela própria, mas perfeitamente adequadas ao caso que lhe foi apresentado pelo advogado.
Há, na verdade, uma utilização indevida da ferramenta – que, inclusive, se mostra preocupante. Em 15 de abril deste ano, o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná não conheceu de um recurso, justamente, em razão da constatação de que, no documento, havia cerca de 43 (quarenta e três) precedentes jurídicos inexistentes – exatamente: 43 decisões “falsas”. O Relator, Des. Gamaliel Seme Scaff, expôs, durante o seu voto, a indignação com a falta de profissionalismo do advogado, ao assim se pronunciar: “O Poder Judiciário não está brincando de julgar recursos”.
Cientes de que o ocorrido ultrapassa todo e qualquer limite, o questionamento que nos resta é: até que ponto os advogados podem confiar naquilo que lhe está sendo entregue pela IA? A dúvida se direciona, especificamente, ao senso crítico e à ética que são inerentes ao exercício da profissão. A inteligência artificial, assim como inúmeras outras tecnologias, que antes faziam parte apenas do “futuro”, hoje se tornaram parte – em grande volume – da realidade, e exatamente por esse motivo é que deve ser utilizada na categoria “auxiliar” e não como “substituta mental”.
Conclui-se, de tudo o que foi aqui exposto, que, diante dos recentes acontecimentos, é dever do profissional agir com precaução e, sobretudo, com consciência. Cabe a ele o compromisso de conhecer, estruturar e revisar cada peça processual confeccionada com o auxílio da IA – não apenas para evitar induzir o juízo ao erro, mas também para preservar o respeito à profissão, ao Poder Judiciário e, principalmente, aos seus clientes.
*Julia Moreira Alves é acadêmica do curso Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás e Estagiária no escritório Ferreira e Chaves Advogados atuando em demandas de Direito Civil, Processo Civil, Consumidor e Trabalhista.