Entre os mais influentes da web em Goiás pelo 14º ano seguido. Confira nossos prêmios.

Envie sua sugestão de pauta, foto e vídeo
62 9.9850 - 6351

Gismair Teixeira e Maria do Socorro Lima

Divaldo Franco, inteligência mediúnica e performance

| 26.05.25 - 18:55
 
No último dia 13 de maio faleceu em Salvador, Bahia, o renomado médium Divaldo Pereira Franco. Nascido em Feira de Santana, no mesmo estado, em 1927, viveu uma existência repleta de realizações na atividade para a qual sempre se mostrou apto desde a mais tenra idade, o exercício da fascinante e incompreendida potencialidade humana que a doutrina que ele professava denominou de mediunidade.
 
Na cinebiografia que presta homenagem à trajetória desse expoente do espiritismo no Brasil, “Divaldo - O Mensageiro da Paz”, cuja trajetória mundial de divulgação doutrinária por palestras e seminários mundo afora tivemos a oportunidade de abordar em nível acadêmico no artigo “Territórios, mobilidade e biografia no espiritismo franco-brasileiro”, aqui, tem o espectador a dramatização do percurso mediúnico de Divaldo Franco, que teve uma vida incomum por conta de seus dons psíquicos cuja orientação culminou numa profunda identidade com o pensamento social do cristianismo, valorizando uma espiritualidade dinâmica a projetar-se no campo da assistência social.
 
O foco na essência do pensamento cristão, que o espiritismo kardequiano enfatiza em suas obras inaugurais e subsequentes, aliado a uma excepcional energia mediúnica, levou o médium baiano a fundar uma obra social extraordinária na cidade de Salvador, que em décadas pôde ajudar em todos os níveis de necessidades humanas a milhares de pessoas, com destaque para os quase 700 filhos adotivos que o médium adotou em seus anos de juventude e que criou com todo o cuidado que a paternidade suscita. De maneira semelhante, sua mediunidade de efeitos intelectuais levanta questões instigantes.
 
No campo da psicologia cognitiva, o pesquisador norte-americano Howard Gardner estabeleceu o instigante estudo em torno da inteligência, que ele designou em suas pesquisas como sendo múltiplas. Gardner deixou em aberto a possibilidade de outras formas de inteligência além das sete que ele inicialmente mapeou. São elas: lógico-matemática, linguística, espacial, musical, corporal-cinestésica, interpessoal, naturalista e existencial. A espiritualidade humana se encontraria, em tese, mais precisamente no âmbito da inteligência existencial. Embora não a tenha elencado em sua lista, Howard Gardner considerou a sua possibilidade, optando por deixá-la para ser definida por outros pesquisadores.
 
Dentre os que tomaram a cargo a função de realizar pesquisas em torno da inteligência espiritual, destaca-se Robert Emmons, que buscou estabelecer critérios científicos para a sua abordagem do dom maior que coube à humanidade para guiar-se pelo mundo biológico. Assim, no contexto dessa inteligência espiritual, a mediunidade que caracteriza o espiritismo kardequiano pode ser pensada como uma categoria à parte, espécie do gênero, podendo ser classificada como inteligência mediúnica. Um olhar atento sobre a trajetória de indivíduos como Chico Xavier e Divaldo Pereira Franco permite vislumbrar a dimensão que a inteligência mediúnica pode adquirir.
 
Em seu já quase centenário livro de estreia, “Parnaso de Além-Túmulo”, Chico Xavier psicografou poesias de cerca de vinte poetas luso-brasileiros de renome, como Castro Alves, Antero de Quental, Alphonsus de Guimaraens e Augusto dos Anjos, dentre outros. No que configuraria uma instigante pesquisa de crítica genética em literatura, o médium mineiro discorre de forma bem-humorada sobre a sua recepção mediúnica de Augusto dos Anjos, mostrando a dificuldade do poeta para encontrar no seu cérebro as palavras rebuscadas de cientificidade característica de sua poética, conforme pode ser conferido no youtube. Através de variações mediúnicas dessa narrativa, Xavier psicografou quase 600 obras dos mais variados gêneros e estilos, cuja renda manteve um número respeitável de instituições assistenciais.
 
Divaldo Franco, por sua vez, teve como foco de sua atividade mediúnica a oralidade. Conferencista internacional, proferiu palestras de cunho espiritista em dezenas de países e em todos os continentes, sendo convidado a proferir palestra na Organização das Nações Unidas sobre o pensamento kardequiano. Apesar de seus dotes mediúnicos se destacarem na oralidade de suas conferências, Divaldo Franco também se destacou na produção escrita, psicografando quase 300 obras de gêneros, estilos e temáticas diversas, atribuídas a um número expressivo de autores espirituais. Se somados, os trabalhos de Chico Xavier e Divaldo Franco somam quase 900 obras, o que suscita diversas possibilidades de estudo e pesquisa em torno dessa extensa massa crítica em torno de uma teoria da inteligência mediúnica.
 
Se Chico Xavier se destacou inicialmente com a produção da poesia atribuída a autores luso-brasileiros, em Divaldo Franco se tem uma excepcional performance em torno da poesia oral, gênero performático que é destacado pelo medievalista e crítico literário, o suíço Paul Zumthor, em sua obra “Introdução À Poesia Oral”, que advoga a necessidade de a poesia ser performada sobretudo no âmbito da oralidade, configurando a sua escrita uma espécie de desvirtuamento da essência da originalidade poética.
 
Divaldo Pereira Franco encerrava suas magistrais conferências com uma poesia intitulada “Poema da Gratidão”, que ele atribuía à autoria espiritual de Amélia Rodrigues, cuja performance pode ser conferida aqui. Em cada momento performático, porém, o poema funcionava como um móbile, com pequenas alterações de palavras que davam novo significado, mas mantinham a estrutura original, como se fosse uma espécie de barco de Teseu da expressividade performática poética. Ou seja, sua expressão poética oral era uma instigante variação em nível de inteligência mediúnica da produção escrita de Chico Xavier, que tinha seus dotes mediúnicos invariavelmente exaltados pelo excepcional conferencista.
 
Assim, a força mediúnica de Divaldo Pereira Franco, em consonância com o pensamento kardequiano, impulsionou-o a erguer uma excepcional obra de assistência social, bem como a produzir um gigantesco edifício de produção literária cuja expressividade contribui de maneira significativa para a massa crítica daquilo que se pode designar no âmbito das inteligências múltiplas como sendo a inteligência mediúnica, uma variação fenomênica da inteligência espiritual.
 
Gismair Martins Teixeira é doutor em Letras com Pós-Doutorado em Ciências da Religião.
Maria do Socorro Pereira Lima é mestre em Performances, licenciada em Artes Visuais e professora.
 
 

Comentários

Clique aqui para comentar
Nome: E-mail: Mensagem:
  • 26.05.2025 20:24 Gilberto Martins Teixeira

    Magnífico resumo. Sensacional e espetaculoso... Parabéns

Envie sua sugestão de pauta, foto e vídeo
62 9.9850 - 6351