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José Abrão
José Abrão

José Abrão é jornalista e mestre em Performances Culturais pela Faculdade de Ciências Sociais da UFG / atendimento@aredacao.com.br

meia palavra

Prenda-me se for capaz

| 23.06.21 - 07:38 Na última semana eu li obsessivamente Catch & Kill, livro de Ronan Farrow que reconta em detalhes sórdidos a sua jornada como repórter para desmascarar e eventualmente publicar os casos de abuso sexual praticados pelo mega produtor Harvey Weinstein. As publicações levaram a repercussões legais e criminais e a um efeito cascata que levou ao caso Jeffrey Epstein e, depois, ao caso Matt Lauer.
 
O livro abarca tudo isso: desde o pitch inicial até a demissão de Lauer da NBC, passando pela revelação de um enorme aparato de segurança, vigilância e espionagem ilegal usada pelos figurões investigados para caçar e silenciar reportagens, veículos de imprensa e jornalistas.
 
Além de frenética, a leitura é chocante, especialmente quando chega pela metade: nesta parte, a NBC, onde Farrow trabalhava, começa efetivamente a tentar silenciar a história e a fazer uma campanha de difamação contra o seu próprio repórter. Farrow, filho de Woody Allen, é uma das pessoas mais vocais, junto à sua irmã Dylan e sua mãe, Mia Farrow, sobre os supostos abusos sexuais do cineasta, uma história que volta para assombrá-lo com frequência durante as páginas.
 
É assustador ver a NBC fazer de tudo para desqualificar e destruir a própria equipe jornalística para proteger executivos poderosos. Eventualmente, as reportagens, que não são reproduzidas no livro, foram publicadas pela New Yorker e as que vieram depois também, inclusive sobre Epstein e Lauer.
 
Ao final do livro, a motivação da NBC fica um pouco mais clara, já que ao implodir o próprio departamento de jornalismo não sacrificou apenas a própria credibilidade, mas ficou manchada por acobertar o âncora Matt Lauer, predator sexual em série e rosto da empresa, por décadas.
 
Embora estes nomes, pessoas e lugares não tenham repercutido tanto no Brasil, há muito a se aprender, especialmente neste momento peculiar em que a imprensa no geral está sob ataque franco e amplo por forças opositoras e em que muitos veículos escolhem, deliberadamente, se omitir e se silenciar para evitar chamar a atenção de entes poderosos.
 
Fica em questionamento o “quarto poder”: que a imprensa é forte não há dúvida, mas o seu trabalho de isenção, verdade e justiça parece mais em jogo do que nunca. No livro, Farrow salienta que ao longo de pelo menos 30 anos, diversas reportagens tentaram desmascarar os mesmos três homens - Lauer, Weinstein, Epstein - e elas, assim como todos os envolvidos, foram obliteradas.
 
A sensação é de que o caso de reportagens bem-sucedidas que o livro reconta, lançado no Brasil sem alarde com o questionável título “Operação Abafa”, é quase um unicórnio num meio em que ele devia ser a regra, isto é, o jornalismo.

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