Foto: Letícia Coqueiro/A Redação
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Carolina Pessoni
Goiânia - O Setor Sul, um dos bairros mais antigos de Goiânia, faz parte da história da capital desde o seu princípio. O bairro foi pensado originalmente por Attilio Correa Lima, presente em seu plano para a nova capital que iria nascer.
No entanto, Attilio havia pensado em um desenho diferente do que temos hoje. O urbanista havia previsto um traçado com predominância de linhas retas que se cruzavam, aplicadas sobre a topografia predominantemente plana.
Historiadores contam que em 1935, o arquiteto deixou as obras de Goiânia. Então, o engenheiro e urbanista Armando de Godoy assumiu o seu lugar no planejamento da cidade. A execução do projeto ficou a cargo da empresa dos irmãos Abelardo e Jerônimo Coimbra Bueno.
(Foto: Reprodução)
A arquiteta e urbanista Márcia Ferrante é moradora do bairro e conta que Godoy alterou o projeto inicial do bairro, sob influência do conceito de cidades-jardim, propondo um desenho orgânico, com vias sinuosas entremeadas por amplas áreas verdes. "Godoy desenhou para o novo bairro unidades de vizinhança interligadas por jardins e praças e articuladas por um traçado sinuoso que caracterizam a identidade peculiar do bairro e reforçam a importância da paisagem do Setor Sul na cidade."
Márcia explica que as ruas foram planejadas de modo a obedecer a uma hierarquia, que buscava separar as vias de pedestres das vias de automóveis. "No traçado do bairro temos então as vias arteriais, as vias coletoras, as vias locais e os cul-de-sac - vias de circulação de pedestres localizadas nas áreas verdes inseridas no interior das quadras, além das vielas de acesso a essas áreas e às praças."
A arquiteta destaca que o projeto se preocupou com a qualidade de vida dos moradores em cada detalhe. "Houve uma clara intenção de favorecer o bom convívio das pessoas e a relação delas com as áreas verdes", ressalta.
(Foto: Letícia Coqueiro/A Redação)
O presidente da Associação Pró Setor Sul (Aprosul), Edmilson Moura, destaca que o projeto do bairro trouxe o que havia de mais moderno em conceito urbanístico na época. "O plano era voltado à integração do ser humano com a natureza, por meio de casas que deveriam ter suas frentes voltadas para as áreas verdes no interior das quadras, planejadas como espaços de convivência e lazer da população, ao abrigo da poluição ambiental e sonora", diz.
O projeto, entretanto, não foi adequadamente implantado. Devido ao crescimento acelerado da nova capital, sua ocupação teve início antes do tempo previsto e ainda sem a implantação completa da infraestrutura necessária.
"Por desconhecimento da população, falta de orientação e ausência de fiscalização por parte do poder público, observou-se a inversão da proposta urbanística pensada por Armando de Godoy, com a grande maioria das casas sendo construídas com as frentes voltadas para as ruas e os fundos voltados para as áreas verdes. Podemos entender que os novos moradores, sem a devida orientação e entendimento do plano, construíram suas casas de frente para a rua como estavam acostumados a viver e como eram as cidades que conheciam", explica Márcia Ferrante.
(Foto: Letícia Coqueiro/A Redação)
Essa inversão, fez com que a população “virasse as costas” para as áreas verdes que, por terem ficado de certa forma isoladas, permaneceram pouco frequentadas. "No início dos anos 70, o Banco Nacional da Habitação (BNH) financiou o Projeto Cura (Comunidade Urbana de Recuperação Acelerada), que procurou resgatar a proposta original e requalificar os espaços públicos do bairro, especialmente suas áreas verdes. Mas o projeto não foi concluído e foi abandonado pelo poder público", lamenta o presidente da Aprosul.
O bairro se caracteriza pela quantidade de áreas verdes, pela sua escala urbana de edificações baixas e traçado de vias sinuosas e acolhedoras. "Seu traçado, ainda que implantado incorretamente, favorece a convivência. Podemos encontrar ainda no bairro uma relação de vizinhança desconhecida em muitas regiões da cidade onde o adensamento sem planejamento adequado amontoou as pessoas e as fez distantes ao mesmo tempo", afirma Márcia.
(Foto: Letícia Coqueiro/A Redação)
Para Edmilson Moura, o Setor Sul tem extrema importância para Goiânia, pois além de sua história, as áreas verdes são elemento preponderante na regulação do microclima da capital, impedindo a elevação da temperatura. "Além disso, seu solo permeável se mostra fundamental para a drenagem das águas pluviais, contribuindo para evitar alagamentos na região central da cidade."
Márcia Ferrante lembra que além de sua importância ambiental e urbanística, o bairro é um registro vivo da época da criação de Goiânia "Faz parte da memória e identidade do povo desse lugar, patrimônio de todos os goianienses."
A arquiteta lembra ainda que o traçado do Setor Sul tem o ser humano como centro de suas preocupações, e não o capital. "Deveria ser tratado como um grande parque central para usufruto de toda a cidade, o poder público poderia, juntamente com a população, pensar caminhos de torná-lo de fato um espaço de convivência e preservação com criação de ciclovias interligando praças, pistas de caminhada, playgrounds e jardins bem cuidados. Seria um presente para toda a cidade esse tesouro bem cuidado", encerra.