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Eliane de Carvalho .
Eliane de Carvalho .

Eliane de Carvalho é jornalista e mestre em Rel. Intern. Foi repórter na CBN e em programas de TV da Globo, Band e Cultura; comandou programa de entrevistas na TV Câmara SP; apresentadora de telejornal na TV Alesp e correspondente do SBT, na Espanha. / jornalistas@aredacao.com.br

Inquietudes

Goiânia é ninho

| 24.10.25 - 16:06 Goiânia é ninho Praça do Cruzeiro (Foto: Prefeitura de Goiânia)

Quando eu nasci, em Goiânia, a cidade tinha apenas 35 anos de idade e lá se foram outros 35, desde que eu me mudei para São Paulo, em busca de novas oportunidades de estudo e trabalho. Morei 22 anos aqui e venho a cada 2 meses por causa do trabalho e para estar perto da família. Posso dizer que tenho uma relação umbilical com Goiânia e as idas e vindas me permitiram um olhar aguçado sobre as mudanças que a capital apresentou ao longo do tempo. 
 
Cresci sobre um skate nas ruas e vielas do setor Sul, um dos bairros mais antigos da cidade, planejado com o conceito de cidade-jardim, com casas intercaladas por parques internos e uma conexão muito agradável entre as residências e as áreas verdes. A concepção era perfeita para uma boa qualidade de vida e era de fato, mas também me lembro dos meus pais me alertarem para evitar brincar nos parques, quando o sol já se ia. Talvez, um conceito muito avançado para um país com tantas desigualdades sociais. Isso, que os índices de criminalidade, nos anos 70, nos parecem insignificantes quando comparados com os de hoje. 
 
Às vezes, volto ao setor Sul, por uma dose de nostalgia, mas também por curiosidade. O retrato de hoje é tão diferente. As casas com jardins na frente e muretas, já não são mais visíveis, porque se cercaram por muros e portões altos. O que era cuidado com tanto capricho se tornou decadente. Muros descascados, calçadas mal cuidadas, ruas esburacadas, parques abandonados pelo poder público e residências transformadas em comércio. Tão diferente do bairro projetado e das minhas lembranças da infância. 
 
Quando eu já era uma adolescente, meus pais, minhas três irmãs e eu nos mudamos para um edifício, no setor Oeste. A esta altura, meus pais, ambos economistas, já experimentavam um certo crescimento profissional, o que nos permitiu ir para um bairro considerado mais nobre. O marketing eficiente das construtoras vendiam o conceito de que morar em edifícios era a melhor escolha, pela segurança e serviços oferecidos. Começava o processo de verticalização do setor Oeste, nos anos 80. O bairro de sobrados elegantes, com jardins extensos, grandes recuos entre as residências, ruas e calçadas largas e arborizadas, com trânsito apenas local, começava a se deteriorar. 
 
Goiânia vive um processo intenso de verticalização, há décadas, escancarado em bairros como o Oeste, Bueno, Marista e que avança para o Jardim América, o bairro mais populoso do município. A cidade plana, com horizonte à vista, passou a ter um outro cenário, nestes bairros. Hoje, o que se vê são prédios e mais prédios e, com muita sorte, se avista um pôr do sol de alguma brecha. Vizinhos perderam a privacidade e a incidência solar. Poucos pedestres e muitos, muitos carros. É preciso evitar os horários de pico, por causa dos congestionamentos longos e demorados, o que também se traduz em poluição do ar e sonora. O trânsito; as redes de água, esgoto e elétrica, além do sistema de drenagem, não foram redimensionamos para dar conta do aumento substancial de moradores e trabalhadores e, volta e meia, entram em colapso. 
 
Até aqui, pode até parecer uma visão pessimista. Não sou contra o crescimento da cidade, mas defendo que seja planejado e, sobretudo, sustentável. O que não aconteceu até o momento, infelizmente. Mas temos uma ferramenta importantíssima, chamada Plano Diretor, que define como uma cidade deve se desenvolver, a cada dez anos. Esta revisão periódica acontece, na Câmara Municipal, e passa por audiências públicas, quando a população pode e deve participar e expressar como quer que a cidade cresça. Esta participação é fundamental, porque políticos funcionam sobre pressão e não faltam lobbies imobiliários, que visam apenas lucros, na maioria das vezes, sem se preocupar com o crescimento desordenado e suas consequências para os moradores. Acredito na força da mobilização social e, portanto, sou otimista. 
 
Este jornal publicou nesta sexta-feira, dia 24 de outubro e aniversário da cidade, uma reportagem excelente do jornalista Samuel Straioto, com o título: “Goiânia: da terra de muitas águas à urgência de preservação hídrica”, disponível no site do jornal A Redação. Recomendo a leitura fortemente, porque aprofunda muito do que escrevo aqui. 
 
Gostaria de te levar para um passeio pela arquitetura Art Déco, no centro de Goiânia, que merece uma menção especial, no ano em que se comemora o centenário deste estilo arquitetônico, no mundo. O Art Déco surgiu nos anos 20, na Europa, pouco antes da fundação de Goiânia, em 1933, e teve uma grande influência no planejamento urbano da cidade, que nascia como a nova capital do Estado e aspirava um estilo mais moderno, em contraponto à arquitetura colonial da antiga capital, a cidade de Goiás. Como descreve bem o especialista na área e amigo querido, Wolney Unes,”Goiânia é a única cidade com acervo Art Déco protegido, no Brasil. Este é um marco”. 
São 21 edifícios e um traçado tombados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, o IPHAN. Isso significa, que não podem ser modificados e, muito menos, demolidos, mas preservados. Além deles, há inúmeros predinhos comerciais, no centro, que datam do começo da cidade, e tem o mesmo estilo, que se caracteriza pelas linhas retas, ornamentos geométricos e concreto aparente. Mas estes, só se notam com muito esforço, porque estão escondidos por painéis comerciais de gosto duvidoso. A criação de uma política pública, seguida de ações de recuperação e retorno da visibilidade das fachadas originais, além de uma campanha de esclarecimento da população, seria muito bem-vinda para a valorização do coração da cidade. 
 
Até aqui, me ative às áreas nobres de Goiânia, mas é importante lembrar do inchaço dos bairros periféricos, de forma desordenada, como o bairro São Domingos, na região noroeste da cidade, que é tão grande, que pode ser descrito como um complexo de muitos bairros, onde a infra-estrutura e os serviços públicos são inexistentes ou precários para o sofrimento dos moradores, que não podem pagar por moradias em outros locais. Chamo ainda a atenção para a alta taxa de homicídios do Jardim Novo Mundo, na região leste, apontado como um dos bairros mais violentos da cidade. 
 
Com 92 anos de existência, completados hoje, Goiânia é uma capital jovem e apesar de grande, com um milhão e meio de habitantes e muitos desafios, pode ter uma correção de rota para se tornar uma cidade sustentável. 
 
Já foi conhecida como a cidade das flores, mas prevalecem os títulos de capital do cerrado, do Art Déco e da música sertaneja. É famosa pelo arroz com pequi e, principalmente, pelo povo acolhedor. 
 
Para mim, Goiânia é ninho. É onde nasci, cresci, me formei e para onde sempre volto para ver a família, amigos e me reabastecer. Há quase um ano, tenho a alegria de escrever para este jornal goiano, semanalmente.
 
 Parabéns, Goiânia!
 

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