Fernando Dantas
Especial para o jornal A Redação
Goiânia - A palavra inovação, no dicionário, significa aquilo que é novo, que apareceu recentemente, ação ou efeito de inovar. Na prática, esse conceito não é nenhuma novidade no comércio, pois lojistas, empreendedores e profissionais já têm mudado, nos últimos anos, a forma de oferecer produtos ou serviços e de trabalhar com o cliente, se mantendo informados e atentos às novas necessidades do consumidor.
De acordo com estudo realizado, em 2018, com varejistas pela Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) e Laboratório de Inovação do Varejo (ProVa), quem atua no setor comercial reconhece a necessidade e a importância de inovar, pois sabe que ao promover novas experiências terá mais chances de reter ou conquistar a clientela. Isso traz reflexos no aumento da competitividade do negócio, na redução de custos e na garantia de sobrevivência no mercado.
Porém, a pesquisa revelou, ainda, que promover essas inovações não é uma tarefa tão fácil para os lojistas. Entre os desafios apontados pelo estudo estão velocidade como as mudanças ocorrem, ansiedade gerada e aspectos financeiros e estruturais. Além disso, necessidade de mudança de cultura na empresa, falta de mão de obra qualificada, pouco acesso a financiamentos e desinformação sobre tecnologias também preocupam os participantes da pesquisa.
O especialista em Marketing e professor de Pós-Graduação, Jayme Diogo, avalia que, apesar dos desafios, inovar é hoje um caminho sem volta, primordial para encantar o consumidor. “Nos dias atuais, os clientes que encontramos por aí sabem, na maioria das vezes, muito mais do que o próprio vendedor, pois eles têm nas mãos o poder da informação, pesquisa e fala. Podem a qualquer instante questionar, tirar dúvidas e até chegar aos pontos de vendas querendo apenas brigar pelo preço. Inovar em 2019 é pensar diferente, é pensar em soluções ágeis para o cliente, pois este também não tem tempo a perder”, afirma.
A instrutora parceira da Escola de Negócios da Câmara de Dirigentes Lojistas de Goiânia (CDL Goiânia), Leila Dutra, concorda que há uma rapidez nas mudanças no varejo e que isso implica na adesão às novas tecnologias, integrando mundo digital e físico. Ela reforça que o processo de venda nunca mais será o mesmo, já que os clientes mudaram os hábitos, precisam de atendimento ágil e de vários pontos de interação com as empresas. “A inovação é fundamental para facilitar processos, especialmente para o cliente, gerando nele maior satisfação por conta da conveniência e da experiência que podem ser criadas, dois itens importantíssimos para a decisão de compra e para a fidelização”, garante.
É com essa visão de oferecer mais conveniência e novas experiências ao cliente que os sócios Hugo Alexandre e Júlio César Bezerra investiram no Badio, um bar de vinhos com cozinha gourmet em Goiânia. Eles deixaram uma franquia de uma marca que representavam na capital goiana e criaram o próprio conceito, inaugurando o “Wine Bar” em abril deste ano.
Segundo Hugo Alexandre, um dos diferenciais do negócio é o rodízio de vinhos. “Quis trazer algo descolado para o mercado de bares em Goiânia, mas com o foco em vinhos. Não é uma tarefa fácil. Depois de algumas pesquisas, descobri, em São Paulo, o primeiro rodízio de vinhos no mundo. Fiquei muito empolgado e decidi trazer a ideia para o Centro-Oeste e adaptar o conceito da nossa forma, com a nossa cara. O rodízio por si só é inovador. Porém, a forma como atendemos e servimos os nossos clientes faz a diferença no nosso bar. Eu e o Júlio fazemos questão de atender todas as mesas, de forma a estar perto do nosso cliente, acompanhar de fato o que ele está sentindo e experimentando na nossa casa”, destaca.

Sócio da Badio Wine Bar, Hugo Alexandre apostou em um diferencial para conquistar clientes (Foto: divulgação)
Relacionamento com o cliente
Pode parecer clichê, mas a frase ‘o cliente tem sempre razão’ ainda é usada nos negócios comerciais. É o que defende a instrutora da CDL Goiânia, Leila Dutra. De acordo com ela, sem cliente, não há empresa e nem comércio. “É preciso criar relacionamentos duradouros com os clientes e se por algum motivo algum deles esteja insatisfeito, a empresa pode e deve ter um papel de protagonista, buscando para si a responsabilidade diante do consumidor e assim construir um bom relacionamento, independente de como o cliente age”, argumenta.
Na tentativa de criar esse relacionamento entre empresa e cliente, os empresários do comércio varejista devem adotar ações estratégicas que envolvam planejamento, gestão, marketing e outros processos que contribuam para fidelizar o consumidor. Foi com o objetivo de fortalecer o contato com o cliente e ajudar os varejistas físicos a venderem mais, gastando menos e mantendo suas marcas fortes no mercado, independente das transformações digitais dos e-commerces e de aplicativos de entrega, que surgiu, em janeiro de 2018, o StayApp.
Trata-se de uma startup goiana que entrega um software para pequenos e médios varejistas implementarem um programa de pós-venda e relacionamento, por meio de um programa de funcionalidades como Fidelidade e Indicação, funcionário do mês e até disparo automático de SMS para clientes que não voltam mais na loja. O idealizador é o CEO do StayApp, Anderson Pádua, formado em Design e com mais de dez anos de empreendedorismo. Ele possui mais três sócios: Rodrigo Oliveira, com experiência em Marketing e Vendas; Marcos Costa, chefe de Operações e responsável pela gestão administrativa e de Recursos Humanos; e Bruno Soares, coordenador do time de Desenvolvimento do produto. Além disso, atualmente a empresa é formada por profissionais das áreas de Desenvolvimento, Vendas, Marketing e Implementação de Sistemas.

Equipe do StayApp é formada por profissionais de diferentes áreas (Foto: divulgação)
Segundo Anderson Pádua, o modelo de negócio do StayApp é SaaS (Software As A Service), ou seja, além do sistema oferecido, eles são também uma espécie de assessoria de pós-vendas. “Usamos um método que chamamos de pós-vendas 4.0 para desenhar todo o programa de relacionamento com os clientes. Após a estratégia definida, o software permite que o consumidor final entre para o programa de fidelidade digital dando apenas seu número de telefone, evitando perdas geradas pelo modelo tradicional de papel.
A partir daí, toda visita do cliente à loja é contabilizada no programa de fidelidade. Com isso, a plataforma consegue interpretar o comportamento de compra, re-compra e não-compra do consumidor e faz todo o resto, enviando mensagens automáticas de acordo com as réguas que estabelecemos, como, por exemplo, um ‘Oi sumido!’ para o cliente que fica mais de 15 dias sem retornar à loja”, explica. O CEO da startup enfatiza, ainda, que a estratégia é totalmente focada em marketing digital. “Nosso diretor de vendas e marketing, Rodrigo Oliveira, construiu uma estrutura usando conteúdo digital e mídia paga para atração e usando estratégia de Inside Sales, assim o time de vendas contata os interessados que entram no nosso teste gratuito para oferecer o sistema”, orienta.
A startup foi criada também pensando no pequeno e médio varejista. “O comércio está cada vez mais competitivo e soluções que deveriam facilitar, hoje prejudicam o empreendedor. Veja os aplicativos de delivery que chegam a ficar com 30% do faturamento de algumas empresas, ou o e-commerce que prejudica as vendas nas lojas. O varejo físico não vai desaparecer, mas vai mudar, vai precisar ficar esperto. Nossa ferramenta ajuda o empreendedor a vender um pouco mais. Mas daqui a 10 anos, ela vai ser a diferença entre estar vivo ou não”, defende Anderson.
Em Goiânia, o StayApp está com quase 200 clientes e em território nacional, já ultrapassa a marca de 400. Todo tipo de loja física é público-alvo da empresa, especialmente restaurantes, bares, lojas de roupa, clínicas de beleza e estética e barbearias. A startup recebeu investimentos de, aproximadamente, R$ 600 mil, divididos em duas rodadas maiores e uma pequena no início, todos no modelo investidor-anjo. De acordo com Anderson Pádua, o valuation (estimativa de quanto vale a empresa) do StayApp está em R$ 12 milhões.
Apesar de quase dois anos de atuação no mercado, o CEO da marca explica que o início não foi nada fácil e eles precisaram superar desafios, assim como qualquer empreendedor que quer inovar. “A implementação era complicada no começo, pois tratava de uma solução inovadora e mudanças doem, ainda mais num nicho de mercado que é marcado por ‘mesmice’. Hoje nossos desafios de escala consistem em angariar talentos para nos ajudar a continuar crescendo. Inclusive estamos contratando”, acrescenta. A expectativa é aumentar a equipe em mais cinco profissionais até o final de 2019. Já entre as metas futuras, informa Anderson, está chegar a mais de dois mil clientes ativos em 2020 e iniciar 2021 com operação na América do Sul, começando pelo Chile. “Nosso lema é: vamos derreter o varejo e moldá-lo ao nosso jeito”.
Acesso ao crédito
O estudo da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) e do Laboratório de Inovação do Varejo (ProVa) identificou que buscar melhor gestão financeira, melhorar processos, aumentar a produtividade e aproveitar as oportunidades digitais e tecnológicas são desafios para os lojistas na hora de inovar. Mas o que para alguns representa desafio, para outros significa oportunidade de mercado. Foi assim para a fintech (empresas do setor de tecnologia que trabalham com inovação) goiana EasyCrédito, que é um marketplace (mercado livre do crédito) que conecta pessoas que precisam de crédito com empresas que oferecem empréstimos, financiamentos e cartões.
“Nossa plataforma cria uma experiência de contratação de crédito on-line com foco no consumidor, aumentando as chances dele conseguir ter o seu crédito aprovado. Hoje, são mais de dois milhões de propostas de crédito a pessoas físicas analisadas pela nossa plataforma e 56 produtos oferecidos por mais de 30 fintechs, bancos, cooperativas, fundos e financeiras”, destaca o CEO da EasyCrédito, Marcos Ramos.

Fintech EasyCrédito já participou de programas de inovação do Google, Bradesco e Itaú (Foto: divulgação)
Economista, especialista em Crédito e Serviços Financeiros, Marcos Ramos, é um dos idealizadores da fintech, junto a outros três sócios: Egio Arruda Júnior, diretor de Tecnologia, analista de Sistemas e especialista em Mobile e Big Data; Rodrigo Siqueira, diretor de Segurança da Informação, físico e especialista em carteiras de crédito para o varejo; e Bárbara Silva, diretora administrativa, economista, especialista em análise de crédito e cooperativismo. “A experiência dos sócios no mercado financeiro aliada à oportunidade de oferecer crédito a uma fatia da população negligenciada pelo mercado bancário tradicional foi o que motivou a criação da fintech”, ressalta Marcos Ramos.
A empresa começou em Goiânia, porém, já atua no mercado nacional. O CEO da fintech informa que a capital goiana serviu como incubadora do modelo de negócios que hoje atende todos os estados do Brasil. “A EasyCrédito é reconhecida como uma das empresas que mais inovam no segmento de fintechs, tendo participado de programas de inovação do Google, Bradesco e Itaú. Nossa diferenciação está no modelo de negócios e na tecnologia, que tem a capacidade de permitir melhores condições de negócios para as empresas que oferecem seus produtos de crédito. Assim, com a nossa tecnologia conseguimos reduzir custos, aumentar a taxa de aprovação e reduzir a inadimplência”, afirma. Marcos Ramos cita ainda que a intenção é dobrar o tamanho da empresa no próximo ano. “Para isso, estamos recrutando novos talentos e pretendemos buscar uma licença do Banco Central para nos tornarmos uma instituição financeira em breve”, revela.
Dentro da estratégia de expansão, a EasyCrédito está também lançando APIs (interfaces de programação de aplicações) que permitem que qualquer empresa possa oferecer, no seu canal de venda, a opção de o cliente solicitar análise de crédito junto às instituições financeiras e fintechs parceiras da plataforma. Com a utilização de APIs, a meta da fintech é agregar mais de 1 milhão de propostas de crédito na sua plataforma até o final deste ano e chegar a 10 milhões em 2020. As APIs desenvolvidas pela EasyCrédito possibilitam que empresas de qualquer setor que comercializem algum bem ou serviço possam integrar e compartilhar dados com a plataforma da fintech, beneficiando os clientes com um acesso mais conveniente às linhas de crédito.
Palavra dos especialistas
Uma série de fatores pode contribuir para que lojistas, empreendedores ou profissionais que atuam no comércio possam inovar e crescer em suas atividades. De acordo com o especialista em Marketing e professor de Pós-Graduação, Jayme Diogo, é preciso muito estudo e acompanhar grandes profissionais do mercado, pois essa é uma área que, segundo ele, muda muito por causa do comportamento do consumidor que é modificado a cada novo ciclo. “O profissional precisa ter disciplina para abrir mão de gostos pessoais, se planejar e saber que esse planejamento pode mudar a todo instante, pois ele não é imutável”, ressalta.
Para ele, parte dos profissionais fica paralisada devido à grande gama de informações e ferramentas disponíveis, ou até mesmo por conta da rotina do dia a dia. “Até inovam, porém inovam pouco. Hoje, redes sociais não são inovação, ter um site para celular não é inovação, um aplicativo para celular também não. Inovação é pensar processos novos, pensar soluções que irão resolver problemas de cliente de maneiras diferentes. Inovar é o principio básico na mente de qualquer empreendedor”, diz.
Jayme Diogo orienta também que para ter sucesso em um mercado cada vez mais competitivo é necessário fazer marketing, ou seja, divulgar, agregar valor, trazer o problema do cliente para o centro da estratégia e por meio de um bom relacionamento, resolver esse problema. “O cliente deve perceber o meu produto como principal solução para ele. O caminho do marketing nos últimos anos trouxe experiências para o consumidor e este ao mesmo tempo começou a ter relacionamentos mais importantes com a marca. Antes eu era mero expectador, hoje faço parte do universo da marca, ajudando a construir um produto melhor”, enfatiza.
Instrutora da Escola de Negócios da CDL Goiânia, Leila Dutra acredita que inovar é fazer melhor e diferente (Foto: divulgação)
Já a instrutora parceira da CDL Goiânia, Leila Dutra, concorda que o comércio precisa estudar mercado e o comportamento de clientes, além de planejar e fazer gestão. Ela cita como ações que trouxeram inovações, nos últimos anos, o advento do e-commerce, marketplaces e redes sociais como canais de vendas. “Os novos players de meios de pagamentos também ajudaram na adesão da inovação com as novas formas de pagamento. Além dessas ações, a inovação também passa pela formação de parceria com startups para apresentar novas soluções para melhoria da experiência do cliente fora e dentro da loja; big data aplicada ao varejo; otimização do supply chain e melhorias dentro da central de distribuição”.
Leila Dutra acrescenta que disponibilizar a compra no on-line com a retirada na loja pode ser uma grande sacada, porque nem todos ainda são adeptos disso. “É uma estratégia usada pela empresa Magazine Luiza. A utilização de chatbots e atendentes virtuais inteligentes para um atendimento mais rápido e assertivo também é uma ótima inovação que está relacionada à experiência do cliente. Estamos vivendo uma revolução no consumo, as pessoas não precisam mais sair de casa para comprar praticamente nada. Áreas comerciais que não buscam informação, não planejam e não fazem gestão, não conseguem entregar aos consumidores as novidades que eles avidamente estão em busca. É preciso inovar, ou seja, fazer melhor, fazer diferente, acompanhar as mudanças que ocorrem de forma cada vez mais rápida e de acordo com as expectativas e comportamentos dos clientes”, finaliza.