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Na última sexta-feira, participei uma live com duas mulheres que têm filhos que precisam de tratamentos, terapias, alimentação especial, medicamentos de alto custoe correm ou correram anos por diagnóstico para seus filhos. Elas relataram suas dificuldades, problemas, deram sugestões do que gostariam de ver implementado no sistema de saúde. Mas algo chamou muito minha atenção: a dor, o cansaço, o esgotamento que elas e tantas outras pessoas em situações parecidas passam. Aí vem a pergunta: “quem cuida do cuidador?"
Em nossa sociedade, o cuidado é uma atribuição eminentemente feminina. É uma naturalização que não se resume ao cuidado materno, mas também aos cuidados como pais e mães, tias, avós, qualquer membro da família que esteja precisando. Chega a mais de 70% o percentual de filhas que cuidam dos pais quando idosos ou doentes.
É uma prática muito típica da sociedade patriarcal, que atribui a homens e mulheres papeis distintos que vão se consolidando à medida em que crescem. A aparente inofensiva prática de dar boneca para a menina e incentivá-la a brincar de casinha e destinar aos meninos brincadeiras de profissões, carros, super-heróis, já começa por aí. E durante a vida toda isso acompanha as mulheres, que são levadas a acreditar que são piores que os homens em matemática, que estão fadadas a determinadas profissões, que os serviços domésticos são mais responsabilidade suas que dos homens da casa, que caso se casem, precisam cuidar do marido, que os filhos também são mais responsabilidades suas e assim vai, uma infinidade de obrigações que não tem um direito como contrapartida.
E quando a pessoa cuidada requer atenção especial, essas mulheres passam por estresse e sofrimento profundos. Eu já passei pela situação de cuidadora, principalmente quando minha mãe teve câncer. Lembro de encontrar minha filha, na ocasião com 3 anos, na porta do hospital e dela aos prantos me pedir pra dormir em casa porque estava com saudades (fazíamos cama compartilhada) e eu tentando explicar que naquele momento a vovó precisava mais de mim, mas com o coração em pedaços porque sabia que ela também precisava de mim e tinha que optar porque não conseguiria atender as duas. Mas nada se compara ao que passam mães como Poliana e Nalva e tantas outras que vivem situações parecidas.
Num momento de desabafo elas relataram o estresse, o esgotamento, o adoecimento físico e mental, geralmente acompanhados por uma total falta de empatia.
E diante desses depoimentos tão fortes, o questionamento “quem cuida do cuidador” ficou ecoando na minha cabeça por dias, e resolvi pesquisar se há políticas públicas voltadas para os cuidadores familiares com laços afetivos e a refletir o que, na Câmara dos Vereadores, poderemos fazer por elas.
Vi que existem leis e projetos voltados para o profissional cuidador. Não me refiro à regulamentação da profissão, mas aos profissionais de enfermagem e outros que exercem uma atividade que também é de cuidado. Com relação ao que estava procurando, encontrei o Projeto de Lei do Cuidador com Laços Afetivos, que foi discutido na Assembleia Legislativa de Pernambuco, mas foi arquivado em decorrência de um parecer que entendeu por sua inconstitucionalidade. O projeto previa formação, assistência psicológica, fisioterapêutica, odontológica e de terapias alternativas, prioridade no atendimento em estabelecimentos públicos e privados, dentre outros.
Mas a fala daquelas mulheres, que traziam com elas a experiência de tantas outras, as minhas próprias experiências, me fez perceber que não podemos deixar de fora de nossas pautas uma lei que institua políticas de assistência para as cuidadoras e os cuidadores com laços afetivos que possa fortalecer essas pessoas e tornar suas rotinas menos pesadas. Para cuidar do outro, é preciso ter saúde física, mental e emocional.
Essa é uma das maravilhas de uma mandata compartilhada, pois a construção de nossas pautas nunca acaba e está em total consonância com os anseios e as necessidades das pessoas.
*Alessandra Minadakis é procuradora federal, mãe, feminista, ecossocialista. É mestra em Direitos Humanos pela UFG. É professora, palestrante e desenvolve trabalhos junto à mulheres e crianças, em especial mães, com suas particularidades e carências.