Carolina Pessoni
Goiânia - Fundado em 1846, na cidade de Goiás, pelo presidente da província, Barão de Ramalho, o Lyceu de Goiânia é um dos primeiros colégios secundários do Brasil. Com a mudança da capital, a unidade foi transferida para a nova cidade, em 1937, por Pedro Ludovico Teixeira, pois seria muito oneroso manter dois colégios.
Tombado como patrimônio histórico pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) em 2003, o prédio da escola em Goiânia foi concebido pelo próprio arquiteto Attilio Correa Lima, também responsável pelo plano urbanístico da capital, e posteriormente modificado pelo escritório dos irmãos Coimbra Bueno. O estilo é uma mesclagem entre o colonial e o art déco, com fachada reta, pórtico na entrada principal, pilares e os marcantes portões de ferro.
(Foto: Divulgação)
O atual diretor do Lyceu, Ricardo Marques Pinto, conta que a unidade foi o primeiro colégio estadual da capital e oferecia o que hoje é conhecido como Ensino Médio. "Só a elite estudava ali. Tinha uma formação bem completa, ensinava línguas, tudo isso para concorrer e trazer a Universidade Federal para Goiânia", explica Ricardo.
Mesmo com a democratização da educação e o surgimento de outras escolas na cidade, o Lyceu ainda é uma referência. "Nos tornamos hoje um colégio público mais equânime na sociedade", diz.
Com quase dois séculos de existência, sendo mais de 80 anos em Goiânia, O Lyceu formou grandes nomes da sociedade goiana, como o ex-prefeito Iris Rezende, ex-ministro Henrique Meirelles, o ex-governador Alcides Rodrigues, os ex-prefeitos Pedro Wilson e Nion Albernaz, o escritor Bariani Ortêncio, o poeta José de Aquino e o artista plástico Amaury Menezes. Quando ainda funcionava na antiga capital, outras personalidades da história de Goiás também passaram por lá, como o idealizador de Goiânia Pedro Ludovico e seu filho Mauro Borges, ambos ex-governadores do Estado, e escritores como José J. Veiga e Bernardo Élis.
Um dos célebres alunos, o ex-prefeito Iris Rezende cursou o chamado Científico, com início em 1954. "Sou testemunha do papel transformador do Lyceu de Goiânia, com sua concepção de ensino avançada e democrática, exercendo larga influência no processo de transformação da sociedade", relembra em tom saudoso.
"Sou testemunha do papel transformador do Lyceu de Goiânia", diz Iris Rezende (Foto: Divulgação)
Já nessa época, os ensinamentos não ficavam restritos às salas de aula, se expandiam pelos pátios e pelas inúmeras manifestações artísticas, esportivas e ideológicas. "Todas as questões que movimentavam o debate filosófico mundial estavam presentes em nosso meio. Temas como capitalismo e socialismo eram discutidos à exaustão num momento de grandes indagações e descobertas", conta Iris.
O ex-prefeito relata que teve aulas de matemática ministradas por Nion Albernaz. Os dois, posteriormente, fizeram parte da Câmara Municipal de Goiânia e se tornaram, igualmente, prefeitos da capital. No colégio, Iris também foi presidente do Grêmio Estudantil Felix de Bulhões.
"Os alunos tinham formação ampla, com base em valores humanistas que iriam forjar gerações muito conscientes do papel histórico, constituindo-se em lideranças com capacidade de modificar os rumos da história. Em seu interior, permanecem vivos os sonhos de gerações inteiras que fizeram dos ensinamentos fonte para as grandes transformações sociais e consolidações dos ideais democráticos. Hoje, o Lyceu de Goiânia continua a respirar a liberdade que é o fundamento maior de sua existência", afirma o ex-prefeito.
O Lyceu em 2021
A escola, que já teve cerca de 5 mil alunos matriculados em três turnos, atualmente tem 468 estudantes e funciona como um Centro de Ensino em Período Integral (Cepi). "Houve a necessidade de se tornar um Cepi porque estamos localizados no centro comercial da cidade, em um prédio histórico que acabou sendo degradado. Isso causou, em parte da população, uma descredibilidade do que o Lyceu sempre foi e, com a mudança para o novo modelo, tivemos a oportunidade de fazer essa remodelação e transformá-lo num colégio de escolhas", esclarece o atual diretor.
Ricardo acrescenta ainda que o colégio apresenta bons resultados científicos, notas altas no Enem e em provas externas, dentro daquilo que se espera de um colégio público, mas de muita qualidade. "Entre os mais de 1.100 colégios que oferecem ensino médio em Goiânia, tanto da rede pública quanto da particular, nos temos a 54ª melhor nota do Enem, sendo a quarta melhor nota entre os públicos", diz orgulhoso.
Ricardo Marques Pinto é diretor do Lyceu de Goiânia desde 2007 (Foto: Letícia Coqueiro)
O diretor explica também que o Lyceu continua com sua veia pedagógica de sua fundação. Para Ricardo, o modelo em tempo integral busca a educação do estudante em sua totalidade. "Abrangemos todas as suas inteligências, competências e áreas cognitivas, e isso não se trabalha no currículo comum, mas nas disciplinas livres", pontua.
As disciplinas do currículo comum são divididas em Salas Temáticas, organizadas de acordo com as características de cada disciplina. Já entre as livres estão: Estudo Orientado (1 e 2), que tem o propósito de orientar o aluno na rotina de estudos; Projeto de Vida, que tem como objetivo auxiliar o estudante a se conhecer e traçar metas; Protagonismo Juvenil, em que os alunos se organizam em clubes e com metodologia para o estudante ser autor de sua própria história; Eletivas, em que os professores apresentam projetos para abordar os temas da sala de aula de maneira diferenciada; e Preparatório Pós-Médio, que, como o nome diz, prepara os alunos para as avaliações de acesso ao ensino superior.
A estudante Luana Cunha Morais, de 17 anos, cursa o 3º anos do Ensino Médio e estuda no Lyceu desde 2019. Ela conta que a opção pela escola se deu ao procurar um ensino público de qualidade e que se encaixasse em seu objetivo de ser aprovada em uma universidade federal.
"O Lyceu tem muitos diferenciais. A forma como o aluno é tratado, o conteúdo dinâmico e vivo, a formação dos professores e, sem dúvidas, o modelo de ensino integral, com tanto acesso à cultura e nos formando como uma sociedade que luta e tem conhecimento", comenta Luana.
Luana Cunha Morais cursa o 3º ano do Ensino Médio no Colégio Lyceu (Foto: Letícia Coqueiro)
Entre as disciplinas preferidas da aluna estão as de base diversificada. "Gosto muito das aulas de laboratório e Protagonismo Juvenil, em que os próprios alunos se tornam professores naquilo que eles mais sabem fazer e, com isso, a gente aprende bastante de uma forma incrível."
Luana destaca ainda sua admiração pela estrutura física do Lyceu. "É incrível! É um prédio antigo que tem história na Ditadura e um lugar muito aconchegante de se estudar. Meu lugar favorito é a biblioteca, que é um lugar de estudo muito bacana, com mesas coletivas e muitos livros."
Ricardo, que é diretor da escola desde 2017, também carrega a vaidade de atuar no Lyceu. "Eu me orgulho muito. Aqui tem um glamour diferente, algo singular, é um patrimônio, um prazer trabalhar aqui."
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