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Sobre o Colunista
José Abrão
José Abrão é jornalista e mestre em Performances Culturais pela Faculdade de Ciências Sociais da UFG / atendimento@aredacao.com.br
(Imagem: From Software)Eu costumo reservar esta coluna no geral para fazer resenhas rápidas sobre o que li ou assisti nos últimos dias, mas desta vez não será possível, porque um único pedaço de mídia tem ocupado todo o meu tempo livre e todo o meu pensamento cotidianamente. Este pedaço de mídia foi lançado em 2011: Dark Souls.
Pra quem não sabe, Dark Souls é um jogo digital lançado originalmente para PS3 e Xbox 360, mais tarde migrando para o PC e ganhando em 2018 uma versão remasterizada para PC, PS4 e Xbox One e hoje é um título reconhecido e influente do estúdio From Software, gerando duas sequências e uma infinidade de memes.
Esta não é a primeira vez que eu tento jogar Dark Souls. A primeira foi em 2012, no Xbox 360, já sabendo da sua infâmia devido ao grau de dificuldade. Não consegui passar da área inicial e vendi o jogo em frustração. Com o passar dos anos, a seita de fãs obcecados ao redor do título foi aumentando e eu me senti pressionado a tentar de novo, desta vez no PC, lá pelos idos de 2016. Passei do chefe da área tutorial apenas para ser massacrado por uma dupla de esqueletos na área inicial. Deixei quieto.
Agora, em 2022, decidi tentar pela terceira vez. O tempo não tornou o jogo nem um pouco menos frustrante e obtuso, porém, 30 horas depois, não apenas estou progredindo rapidamente como não consigo pensar em outra coisa. E os elementos de uma seita ou, no mínimo, de um esquema de pirâmide, estão pra todo lado: o progresso funciona basicamente na base de fofocas e informação compartilhada pela comunidade de fãs na última década pelo YouTube, Wikies e, é claro, pelo Reddit.
Se eu demorei para responder uma mensagem sua é porque provavelmente ela se perdeu nas seis abas abertas sobre como encontrar aquele item raro ou como passar de um chefe particularmente irritante. Há, também, um esquema de mentoria: você dificilmente vai aguentar esse jogo sem um jogador veterano para te dar dicas e ouvir os seus desabafos. O chat com ele no Telegram também é uma aba aberta de forma permanente. Outra são vídeos no YouTube explicando e explanando a rica mitologia do jogo que, in game, é entregue também de forma críptica e obtusa.
Mas então, o que mudou? É difícil dizer. Momentos antes de escrever este texto eu passei duas horas tentando passar da mesma parte morrendo repetidamente em loops de 3 minutos no exato mesmo lugar com os exatos mesmos inimigos frustrantes, à beira de jogar o controle pela janela ou enlouquecer. Antes disso, quando estava em um bom momento: limpei uma área inteira com três mini-chefes sem morrer nenhuma vez, apenas para entrar na área errada por acidente, onde um cogumelo me matou no soco. Pois é. Depois, tentando fugir do mesmo cogumelo, fui devorado por um gato gigante. Depois, quando achei que estava tudo bem, fui morto por uma gangue de árvores.
Isso resume o que são 10 minutos comuns em Dark Souls. E eu amei cada segundo disso. Então não, eu não sei explicar em que momento minha opinião mudou e a frustração virou empolgação. Uma teoria é de que realmente passei tanta raiva que alguma coisa quebrou na minha cabeça e agora eu gosto de sofrer.
Por outro lado, é como se as escamas tivessem caído dos meus olhos e eu agora enxergasse uma nova realidade num nível quase existencial ou metafísico: quando você supera um dos muito desafios inacreditavelmente arbitrários e injustos do jogo, você se sente muito bem. Mas não apenas isso, há um sentimento profundo de “se eu dei conta disso, eu dou conta de qualquer coisa”. Você é inundado por uma positividade e otimismo que é carregado para o seu dia a dia e para suas tarefas mundanas.
Concluindo, nos últimos dias, quando não estou frustrado jogando Dark Souls, eu estou de excelente humor e disposto, estranhamente, por ter passado horas morrendo repetidas vezes em Dark Souls. O ponto é que eu poderia passar mais uma hora enchendo páginas sobre como Dark Souls é genial e uma obra-prima digital, mas eu só descobri isso praticamente 12 anos depois do seu lançamento e depois de tentar, tentar, tentar e tentar.