A imagem do conceituado fotógrafo de moda Fernando Louza, exposta no saguão do Shopping Flamboyant, foi realizada em Salvador, Bahia (2010) e retrata uma modelo negra, nua, sentada de frente a um piano. A luz do ambiente remonta às pinturas renascentistas, onde o tom da madeira do instrumento musical compõe sua luminosidade com a pele da personagem. A fragilidade da nudez e o símbolo de status, que o piano representa, revelam um contraste estético decisivo na cena retratada.
Ao longo da história da humanidade, o luxo foi interpretado de diferentes maneiras, acompanhando como o poder se justifica em cada época. O 'antropólogo do luxo', Michel Acoforado, ganhou notoriedade por sua conclusão subversiva: "o brasileiro é obcecado por ricos", um recado direto à neurose coletiva da crença na mobilidade social. Acoforado revela curiosidades que não escapam nem aos legítimos ricos de “sangue azul”, que habitam códigos de etiqueta e privilégios inacessíveis aos réis mortais. Sua observação sobre o entusiasmo, ou deslumbre, perante os verdadeiros herdeiros da prosperidade econômica foi escancarada quando ele admitiu a ilusão central: todos nós sentimos, em algum nível, que um dia poderemos chegar lá. Só que não.
Essa sensação tosca e persistente também se evidencia na minissérie em voga na TV aberta, protagonizada por graciosas mulheres. A ostentação é justificada pela moralidade, tradição, trabalho e família, elementos que permitem uma aproximação afetiva do público. Assim, o conflito social real, o impacto social e as desigualdades históricas no acesso à terra é neutralizado por uma graciosidade fútil, porém eficiente, que gera engajamento e audiência.
O termo 'Graciosidade' aparece também em um dos hexagramas do Livro das Mutações, o I Ching, que adverte:
(...) "a forma graciosa é suficiente para alegrar e acalorar assuntos de menor monta. Porém, questões importantes não podem ser decididas dessa maneira. Exigem maior seriedade".
Voltamos, enfim, a moral do conto dinamarquês "O Rei está nu", neste caso "O Luxo está nu". A modelo, o piano e a madeira escura clamam o tom da terra. O marrom que domina a cena chama atenção para uma atualização do sentido do termo, em questão. Quem sabe, neste atual momento, o luxo seja sustentabilidade, consciência ecológica, um retorno ao que é vivo. Portanto, contudo, entretanto, todavia: o Cerrado ainda é muito mais poderoso e o legítimo protagonista dessa história.